Montijo: o primeiro passo para o ‘Portela+1’

  • Lusa e ECO
  • 15 Fevereiro 2017

O Governo e a ANA - Aeroportos de Portugal assinam hoje um memorando de entendimento para “estudar aprofundadamente” um aeroporto no Montijo complementar ao de Lisboa, dez anos depois.

O Governo e a ANA – Aeroportos de Portugal assinam hoje um memorando de entendimento para “estudar aprofundadamente” um aeroporto no Montijo complementar ao de Lisboa, dez anos depois de ter sido equacionada a hipótese “Portela + 1”, abandonada em 2008. As companhias aéreas pedem rapidez no aumento da capacidade do aeroporto de Lisboa, mas a TAP já alertou: “está fora de questão” transferir parte da sua operação para a outra margem.

A construção de um novo aeroporto na região de Lisboa ou a existência de uma infraestrutura complementar ao Aeroporto Humberto Delgado tem estado em discussão nos últimos anos, tendo sido realizados vários estudos e analisadas diversas localizações, sendo a construção da infraestrutura em Alcochete, concelho de Alenquer, a que esteve mais próxima de se tornar realidade. Hoje é assinado o acordo de entendimento “depois do aeroporto de Lisboa ter ultrapassado os 22 milhões de passageiros em 2016, um ano de recordes de tráfego em todos os aeroportos portugueses”, segundo divulgou na segunda-feira a ANA, gerida pela VINCI Airports.

“Perante os constrangimentos que a Portela já apresenta é necessária uma solução e cabe aos decisores políticos a escolha”, disse o presidente da RENA, Paulo Geisler, em declarações à Lusa. Para Paulo Geisler, esta decisão, no entanto, “terá que ser rápida e acompanhada de medidas transitórias imediatas que permitam manter o crescimento da atividade das companhias aéreas com qualidade de serviço, entre os quais o aumento de movimentos em faixas horárias mais restritas e a otimização destas”.

TAP também vê com bons olhos a solução de um aeroporto complementar no Montijo para aumentar a capacidade do Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa, mas diz “estar fora de questão” transferir parte da sua operação para a outra margem. Em declarações à Lusa, o porta-voz da empresa, André Soares, explicou que a TAP é a única companhia que opera no aeroporto Humberto Delgado no esquema de ‘hub’, isto é, como plataforma de transferência de passageiros.

“Ou seja, nós trazemos passageiros das américas e de África para a Europa, chegam a Lisboa e apanham outros voos para outros destinos na Europa, 60% do tráfego da TAP é para este tipo de passageiros”, disse. Por esta razão, para a TAP, “está fora de questão transferir parte de operação no Montijo e manter outra parte em Lisboa, porque isso não permitiria dar resposta as necessidades de tráfego da companhia”.

[Para a TAP], está fora de questão transferir parte de operação no Montijo e manter outra parte em Lisboa, porque isso não permitiria dar resposta as necessidades de tráfego da companhia.

André Soares

Porta-voz da TAP

Segundo o responsável, hoje em dia o crescimento da TAP torna-se “cada vez mais difícil” no aeroporto Humberto Delgado “por limitações várias e porque o aeroporto está muito perto do seu esgotamento”. “O aeroporto do Montijo, a confirmar-se essa possibilidade, responde” à necessidade “que existe de maior capacidade aeroportuária na região de Lisboa, uma vez que a atual infraestrutura já não tem a capacidade necessária para o atual movimento de passageiros”, referiu.

Low cost no Montijo não é discriminação

Para a RENA, que congrega vários associados, cada qual com a sua estratégia e modelo de negócio, as preocupações passam por assegurar que as infraestruturas estejam em condições de responder à procura e que o preço (as taxas) seja fixado “de forma adequada e objetiva”.

Questionado sobre se as companhias aéreas de baixo custo (low cost) se sentirão discriminadas se passarem a sua operação para a base aérea do Montijo, Paulo Geisler rejeitou essa possibilidade. “Não cremos que haja qualquer discriminação se houver opção. A decisão será sempre de cada companhia, tendo em conta o modelo de negócio (se se dedica a voos ponto a ponto ou se faz voos de ligação, se tem acordos de ‘code share’ ou não, etc.), o custo e a oferta que pretende dar aos clientes”, disse o responsável à Lusa.

É um facto que as taxas aeroportuários em Portugal, neste momento, são um obstáculo ao desenvolvimento do turismo e a RENA espera que o modelo seja revisto na sua globalidade.

Paulo Geisler

Presidente da RENA

No entanto, acrescentou, “é um facto que as taxas aeroportuários em Portugal, neste momento, são um obstáculo ao desenvolvimento do turismo e a RENA espera que o modelo seja revisto na sua globalidade”. Em termos concretos, sublinhou, “o que preocupa é saber quais os custos da opção política e quem os vai suportar (e não podem ser os passageiros atuais a pagar encargos futuros)”.

Já o presidente da Associação dos Pilotos Portugueses de Linha Aérea (APPLA) avisou que a base aérea do Montijo não poderá ser alternativa ao aeroporto de Lisboa nos voos de longo curso caso avance a desativação de uma das duas pistas do Aeroporto Humberto Delgado. O presidente do Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil afirmou, por seu turno, que a partilha de espaço aéreo com militares é “sempre um constrangimento”, mas que há soluções.

 

Opção Montijo ainda depende do impacto ambiental

 

Apesar da assinatura do memorando de entendimento, o primeiro-ministro lembrou, a semana passada, que uma decisão definitiva sobre a localização do futuro aeroporto no Montijo está condicionada à conclusão de um relatório sobre o impacto da migração de aves naquela zona.

“Temos acordado com a ANA que é necessário aprofundar o estudo relativamente à solução que aparenta viabilidade, que é a do Montijo, mas é uma viabilidade que está condicionada ainda a dados que só poderemos ter no final do ano, designadamente sobre o impacto de ser uma zona de migração de pássaros”, afirmou António Costa, no debate quinzenal.

“O resultado sobre esse impacto, sobre a migração dos pássaros, só pode estar concluído no final do ano. Não permitirá decisões definitivas até essa altura, mas permite concentrar a nossa avaliação relativamente a uma das várias soluções possíveis e ir desenvolver o trabalho nesse sentido”, afirmou ainda António Costa, sublinhando que a “segurança aeronáutica” pode conflituar com esse percurso migratório de aves, que passa pelo Montijo.

Já na quinta-feira, o ministro do Planeamento e das Infraestruturas garantiu que “não há adiamento” da parte do Governo em relação ao projeto do novo aeroporto no Montijo, quando questionado sobre as declarações do primeiro-ministro.

“Não há adiamento de natureza nenhuma, vamos dar passos próximos para o desenvolvimento do projeto. O projeto tem várias etapas e uma é exatamente aquela que, espero eu, nos próximos dias ou nas próximas semanas será dada. Em breve terão conhecimento do que se trata”, disse Pedro Marques.

 

 

Retomar um projeto dez anos depois

Em 2007, quando era ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações Mário Lino e a construção do novo aeroporto de Lisboa estava prevista para a Ota (localização inicialmente confirmada em 1999 e na qual foram gastos em estudos mais de 40 milhões de euros, segundo revelou o Tribunal de Contas em 2011), a localização da infraestrutura tornou-se um tema político incontornável.

Em novembro desse ano, a Associação Comercial do Porto (ACP), na altura liderada por Rui Moreira, atual presidente da Câmara do Porto, entregou ao Governo socialista de José Sócrates um estudo, realizado pelo Centro de Estudos de Gestão e Economia Aplicada da Católica, que analisou a construção do aeroporto na Ota ou em Alcochete e a manutenção da Portela aliada à construção de uma nova infraestrutura aeroportuária em Alcochete ou no Montijo.

Os autores concluíram que a opção mais vantajosa era a solução designada “Portela + Montijo”.

Mas, em maio de 2008, o Conselho de Ministros aprovou uma resolução que confirmou a localização do novo aeroporto internacional de Lisboa na zona do Campo de Tiro de Alcochete, seguindo as conclusões do relatório ambiental final elaborado pelo Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), a pedido do executivo da altura.

O projeto representava um investimento de cerca de 4,9 mil milhões de euros (incluindo a construção e o valor a investir no período da concessão).

Os primeiros trabalhos chegaram a avançar, em agosto, com prospeção e sondagens no terreno, mas o novo aeroporto acabou por não avançar e a decisão foi revertida no Executivo de Pedro Passos Coelho, surgindo a hipótese de uma base militar funcionar como aeroporto complementar ao de Lisboa, designadamente o Montijo.

No Governo PSD/CDS-PP, quando era secretário de Estado dos Transportes Sérgio Monteiro, é então retomada a solução “Portela +1” e criado um grupo para avaliar a viabilidade de um aeroporto complementar, estando em cima da mesa as bases aéreas de Sintra, Alverca ou Montijo.

Mas as conclusões deste grupo de trabalho acabaram por nunca ser conhecidas até ao final da legislatura.

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