Depois da pandemia haverá uma “corrida” às férias? Patrões podem decidir

O Governo adiou a aprovação e afixação do mapa de férias devido à pandemia. Na falta de acordo, os empregadores podem decidir as férias, mas há condições.

A pandemia do novo coronavírus veio trocar as voltas a muitos portugueses, deixando dúvidas quanto às férias. O Governo já adiou a aprovação e afixação do mapa de férias até 10 dias após o fim do estado de emergência, para ajudar as empresas a lidar com a situação. Afinal, como poderá correr o processo, principalmente se muitos quiserem marcar férias ao mesmo tempo?

Com o fim do Estado de Emergência a 2 de maio, as empresas e os trabalhadores têm até 12 de maio para decidir e afixar o mapa de férias. Desta forma, têm quase mais um mês para fechar as férias relativamente ao prazo que estava estabelecido na lei, que era de 15 de abril.

O período anual de férias tem a duração mínima de 22 dias úteis, sendo que 10 dias têm de ser consecutivos. As férias são acordadas entre o trabalhador e o empregador. No entanto, na falta de acordo, o empregador pode marcar as férias, dita o Código de Trabalho, existindo algumas condições.

Se for o empregador a decidir, as férias não podem ter início em dia de descanso semanal do trabalhador e têm de ser ouvida “a comissão de trabalhadores ou, na sua falta, a comissão intersindical ou a comissão sindical representativa do trabalhador interessado”, de acordo com a lei.

No caso de ser uma pequena, média ou grande empresa, “o empregador só pode marcar o período de férias entre 1 de maio e 31 de outubro, a menos que o instrumento de regulamentação coletiva de trabalho ou o parecer dos representantes dos trabalhadores admita época diferente”.

Há especificidades para alguns setores, como é o caso do turismo. “Na falta de acordo, o empregador que exerça atividade ligada ao turismo está obrigado a marcar 25% do período de férias a que os trabalhadores têm direito, ou percentagem superior que resulte de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho, entre 1 de maio e 31 de outubro, que é gozado de forma consecutiva”, refere a lei.

E se todos os trabalhadores quiserem marcar na mesma altura? O Código determina que, na marcação das férias, “os períodos mais pretendidos devem ser rateados, sempre que possível, beneficiando alternadamente os trabalhadores em função dos períodos gozados nos dois anos anteriores”.

Nesta altura deve existir “total flexibilidade”

Rita Mourinha, responsável da Seresco Portugal, uma empresa de serviços e soluções de Recursos Humanos (RH), aponta que, “pela situação que estamos a viver, deve existir flexibilidade de ambas as partes”. Por um lado, a empresa deve “entender que provavelmente muitos colaboradores não irão querer gozar o seu período de férias nos meses ditos ‘mais normais'”, refere, ao ECO.

Por outro, por parte do trabalhador, este deve “entender que a empresa, devido ao decréscimo comercial e financeiro existente, poderá pedir-lhes para gozar as férias em períodos específicos, que sejam mais benéficos para a organização”.

Mariana Canto e Castro, diretora de RH da Randstad, sublinha também a importância da “total flexibilidade”, na marcação de férias, particularmente neste ano, em que “todos teremos também de a ter para adaptarmos a maior capacidade de resposta enquanto empresa”, ao ECO.

A responsável da Seresco Portugal indica que, apesar de se estar a assistir a alguma normalidade na marcação de férias, os RH das empresas “preocupam-se em assegurar que efetivamente os períodos de férias estão marcados e que posteriormente são cumpridos”.

De sinalizar que os patrões tinham já pedido para adiantar o período em que podem impor férias. A Confederação Empresarial de Portugal defendeu que o regime de marcação de férias precisava de ser ajustado às “necessidades específicas” pelas quais o país atravessa atualmente. Entretanto, já se entrou no período em que os empregadores podem impor férias aos trabalhadores, dependendo assim da decisão de cada empresa.

Quanto a altura em que as pessoas irão marcar férias, Rita Mourinha sinaliza que “existe alguma apreensão associada ao medo do que poderá ser o futuro a curto prazo; e à distância social, que terá de continuar a existir”. Desta forma, muitas pessoas poderão “ponderar a marcação de férias para períodos mais calmos”. Contudo, tendo em conta que a situação está em evolução, é cedo para prever tendências, ressalva.

Já a diretora de RH da Randstad aponta que já existem muitas marcações para o período de verão, mas que já se costuma verificar um “span muito alargado de férias, quase desde o final de maio até outubro”, o que permite cumprir as necessidades da empresa.

Remarcar férias? Pode depender da interpretação

Se as férias forem marcadas e a situação da pandemia afetar os planos, há possibilidade de remarcar? Ora, a lei diz que “o gozo das férias não se inicia ou suspende-se quando o trabalhador esteja temporariamente impedido por doença ou outro facto que não lhe seja imputável, desde que haja comunicação do mesmo ao empregador”.

Quanto à possibilidade de situações decorrentes da pandemia servirem de justificação para tal, “a questão é discutível e tem a ver com a finalidade das férias”, explica Luís Gonçalves da Silva, da Abreu Advogados, ao ECO. O consultor argumenta que a finalidade das férias, nomeadamente de recuperação física e psicológica, integração na vida familiar e participação social e cultural, “não se coaduna com a situação que vivemos”, de “fortíssimas restrições”.

No entanto, alerta que as opiniões dos juristas poderão divergir nesta situação. No caso das férias não gozadas do ano anterior, a lei dita que podem ser gozadas até 30 de abril. Luís Gonçalves da Silva defende que, se um trabalhador não desejar gozar as férias devido à pandemia, também se poderá considerar o mesmo argumento. Tudo dependerá também da evolução da situação.

Por outro lado, também pode ser o empregador a mexer nas férias. A lei refere que “o empregador pode alterar o período de férias já marcado ou interromper as já iniciadas por exigências imperiosas do funcionamento da empresa, tendo o trabalhador direito a indemnização pelos prejuízos sofridos por deixar de gozar as férias no período marcado”.

De sinalizar também que “o gozo do período de férias pode ser interpolado, por acordo entre empregador e trabalhador, desde que sejam gozados, no mínimo, 10 dias úteis consecutivos”, dita a lei.

Quanto às pessoas que estão atualmente em regime de lay-off simplificado, que permite a suspensão do contrato ou redução do período normal de trabalho, esta situação não afeta o vencimento e a duração das férias.

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