Economia emagrece, Estado engorda. Governo apresenta hoje o Orçamento Suplementar

Após anos de emagrecimento, o Estado voltará a "engordar" por causa da crise pandémica. Hoje o Governo apresenta o Orçamento Suplementar que concretiza o Programa de Estabilização Económica e Social.

O Governo deu a conhecer ao país o que quer fazer até ao final do ano para estancar a ferida económica provocada pela pandemia. Já se sabe o custo de algumas medidas, mas a fatura completa da crise este ano é apresentada esta terça-feira com a entrega do Orçamento Suplementar de 2020. Esta é uma emenda ao Orçamento do Estado para 2020 que está em vigor há apenas dois meses mas que o vírus tornou obsoleto.

O ministro das Finanças, Mário Centeno, já admitiu em entrevista à Antena 1 que o défice orçamental de 2020 vai estar entre 6% e 7% do PIB, o que equivale a uma derrapagem orçamental de cerca de 13 mil milhões de euros, mas o número final só será conhecido na emenda que será feita ao Orçamento do Estado para 2020 que previa um excedente orçamental de 0,2% do PIB. Que receita espera o Governo perder? Quanto vai aumentar a despesa no total do ano? E quanto endividamento será necessário?

Estas são questões que ainda estão por responder, mas já há algumas pistas: ao ECO, Pedro Siza Vieira disse que o Programa de Estabilização Económica e Social (PEES), que será concretizado pelo Orçamento Suplementar, custará 5 mil milhões de euros. “Não vai ser um orçamento despesista, vai ser um orçamento que tenta responder às necessidades à medida das necessidades do país nesta altura“, antecipou o ministro da Economia que, no início da pandemia, avisou que os gastos de hoje são os impostos de amanhã.

No Programa de Estabilidade, o Governo tinha ensaiado uma estimativa para os custos da resposta imediata do Estado à pandemia até ao final do ano: 0,9% por mês. Mais recentemente, o Conselho de Finanças Públicas, com base na informação do Programa de Estabilidade, chegou a uma aproximação anual mais elevada: prevê despesa pública entre os 1,5% e os 2,6% do PIB com a pandemia, consoante se concretiza o seu cenário base ou o severo. Agora com o PEES, o valor é ainda maior.

Cenário macroeconómico do Governo, segundo o PEES.

Certo é que com a economia a “emagrecer” 6,9% em 2020 — cuja queda seria ainda maior na ausência de um estímulo orçamental –, segundo as previsões do Governo, os estabilizadores automáticos vão funcionar com o aumento da despesa (com o subsídio de desemprego, por exemplo), ao que acresce as medidas específicas para lidar com esta crise pandémica, e a diminuição da receita. Esta combinação levará o Estado a “engordar”, isto é, a ter um peso maior na economia portuguesa, após praticamente uma década em que esse peso foi reduzido por causa da consolidação orçamental.

Um dos indicadores em que isso será visível é o consumo público, o qual reflete o custo dos bens e serviços distribuídos gratuitamente à população, incluindo, por exemplo, os salários dos funcionários públicos e a aquisição de bens e serviços para a saúde ou a educação (fica de fora as transferências sociais e o investimento). O Executivo prevê que esta componente do PIB cresça 3,1% em 2020, o que a concretizar-se será o maior aumento percentual desde 2001 (3,6%), ficando acima do registado na anterior crise em 2009 (2,5%), de acordo com a série histórica do Instituto Nacional de Estatística (INE).

Este indicador não corresponde ao peso do Estado na economia, mas sim quanto este gasta para prestar serviços públicos aos cidadãos. É na relação entre a despesa pública e o PIB que se pode ver uma aproximação do “engordar”, mas este rácio com base nas previsões do Governo só deverá ser conhecido hoje. Com base num défice de 7,1% e uma quebra do PIB de 8%, o Fundo Monetário Internacional (FMI) estimava em abril um salto do peso da despesa pública de 43,1% em 2019 para os 49,9% do PIB em 2020.

Assim, o Estado ganha peso não só porque aumenta a despesa pública mas também porque o PIB encolhe. Esta será “uma crise que se prevê severa, mas temporária”, nota o Governo no PEES. De facto, a quebra de 6,9% será “a maior contração que há registo nas últimas décadas”. Apesar de expressiva, a recuperação de 4,3% em 2021 só vai permitir recuperar metade da atividade económica perdida este ano, de acordo com as contas do ECO com base nas previsões do Governo e nos dados oficiais do INE.

Apoios sociais, investimentos rápidos e escola digital

A medida mais esperada do Orçamento Suplementar era o prolongamento do lay-off simplificado e os apoios que o irão substituir que, no total, vão custar 2,5 mil milhões de euros, segundo o primeiro-ministro.

Há mais duas despesas que sobressaem: os 523 milhões de euros dedicados a investimentos rápidos, nomeadamente 60 milhões de euros para remover amianto das escolas, e os 400 milhões de euros para a disseminar a escola digital à distância para todos, incluindo a aquisição de computadores e licenças de softwares.

Na área da saúde, que se viu em cheque nesta crise, haverá um reforço à volta de 100 milhões de euros dividida entre a recuperação da atividade assistencial do SNS e a valorização dos profissionais de saúde.

Apesar de já ser possível ter uma maior aproximação dos gastos públicos com o coronavírus, é de notar que nem todos os montantes referidos serão efetivamente despesa pública no imediato, como é o caso das garantias públicas para as linhas de crédito que são reforçadas em 6,8 mil milhões de euros, e nem tudo está claramente quantificado. Também é de assinalar que alguns destes montantes terão financiamento europeu já este ano, como o novo SURE da Comissão Europeia e a alocação de fundos comunitários.

A única exceção às medidas do Governo que encolhem a receita ou aumentam a despesa é o adicional à contribuição de solidariedade sobre o setor bancário que gerará uma receita de 33 milhões de euros, valor que será consignado ao Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social. Para já, não se conhecem outras medidas do Governo para aumentar a receita ou diminuir a despesa no Orçamento Suplementar.

Esta proposta de alteração ao OE2020 que será aprovada em Conselho de Ministros e apresentada esta terça-feira será discutida na generalidade a 17 de junho, às 15h, no Parlamento. Ainda não se conhece a data da votação final global uma vez que tal dependerá do andamento dos trabalhos nas comissões parlamentares. Para acelerar o processo, o Governo quer que haja apenas audições ao ministro das Finanças, Mário Centeno, e à ministra do Trabalho e da Segurança Social, Ana Mendes Godinho, mas a palavra final é dos deputados.

O Governo conta com a viabilização por parte do Bloco de Esquerda, “caso os avanços negociados se concretizem”, e com a vontade do PSD, segundo Rui Rio, de também viabilizar. António Costa tinha dito que o objetivo era ter aprovação por unanimidade e a ministra da Presidência, Mariana Vieira da Silva, admitiu ao Expresso que o suplementar “é sempre um orçamento mais propenso ao compromisso alargado do que um normal”.

Após ser viabilizado na Assembleia da República, como é expectável que aconteça, o orçamento suplementar terá de ser promulgado pelo Presidente da República e só depois poderá entrar em vigor quando for publicado em Diário da República.

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