Pareceres atribuem prejuízos da recompra de obrigações à administração que sucedeu a Salgado

  • Lusa
  • 25 Julho 2021

Dois pareceres concluem que decisão de recompra das obrigações BES foi tomada pelo conselho de administração em funções no final de julho de 2014, já depois da saída da administração de Salgado.

Dois pareceres juntos pela defesa de Ricardo Salgado no processo do Eurofin atribuem à gestão que lhe sucedeu a responsabilidade pelos prejuízos gerados pela recompra das obrigações BES e que levaram à sua condenação pelo supervisor.

Os pareceres, consultados pela Lusa, constam do processo que está em julgamento no Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS), em Santarém, para o qual o ex-presidente do Banco Espírito Santo (BES) recorreu da coima de 4 milhões de euros que lhe foi aplicada em setembro de 2020 pelo Banco de Portugal (BdP).

Ricardo Salgado foi condenado pelo supervisor por atos dolosos de gestão ruinosa praticados em detrimento de clientes, investidores e demais credores, entre outras infrações relacionadas com a emissão e colocação de obrigações BES em clientes do banco, em que a Eurofin interveio como intermediária (market maker).

No âmbito do processo que corre no TCRS, juntamente com o processo BES Angola, a defesa de Salgado juntou dois pareceres, um, datado de maio último, dos professores de finanças empresariais Miguel Gonçalves e Vítor Massena Baptista e do market maker manager Pedro Amorim, e outro, de abril, da TPricing Consultores.

Ambos os pareceres concluem que foi a decisão de recompra das obrigações BES tomada pelo Conselho de Administração em funções no final de julho de 2014, já depois da saída da administração liderada por Ricardo Salgado (em 13 desse mês), que levou aos prejuízos e provisões imputados nas contas do primeiro semestre de 2014 (da ordem dos 1.127 milhões de euros) e que estão na base deste processo contraordenacional do BdP.

Para a TPricing, o facto de, nesse período, o BES se ter substituído ao Eurofin “levou a que as menos-valias decorrentes das recompras de obrigações, que de um ponto de vista técnico-financeiro seriam de imputar àquela entidade, fossem por si assumidas”.

Segundo a consultora, o “reembolso antecipado do capital a preços diversos do valor pelo qual o BES se financiou, não é consistente com um racional técnico-financeiro, pelo que, deste ponto de vista, essa recompra poderia ter sido evitada ou minorada”.

“Para tal, bastava ao BES continuar a adquirir aos intermediários as obrigações por estes recompradas a clientes aos preços praticados antes de julho de 2014 e não aos preços a que os intermediários recompraram essas obrigações junto dos clientes”, afirma.

O outro parecer refere o contexto em que foram emitidas as obrigações, lembrando que o período em causa, entre 2009 e 2014, abrangeu a intervenção da troika, com os juros a atingirem valores que dificultavam o acesso das empresas a financiamento a taxas atrativas no longo prazo.

Para os especialistas, perante a dificuldade dos bancos no acesso a financiamento nos mercados de dívida, o BES emitiu obrigações “para garantir a estabilidade financeira da instituição”, tendo o recurso a market makers permitido “os sucessos das emissões e da liquidez das recompras e revendas, permitindo assim o financiamento estável”.

O Eurofin realizava operações para colocação e recompra de obrigações BES junto dos clientes do banco para prazos mais curtos, facilitando assim a captação de financiamento. “No nosso entender, fica completamente de fora a tese de que o market maker obteve mais-valias financeiras fora da normalidade”, afirmam.

No processo Eurofin, que foi apenso ao do BESA, Salgado é ainda acusado de não ter respeitado as determinações do BdP que impunham a alimentação da conta escrow (conta caução ou de garantia) com recursos alheios ao Espírito Santo Finantial Group e a obrigação de eliminar a exposição não garantida da ESFG à Espírito Santo International (ESI)/Espírito Santo Resources (ESR).

Em causa está ainda a “desobediência ilegítima” à proibição do aumento de exposição direta e não coberta do BES à ESI, com as chamadas cartas de conforto passadas a dois investidores institucionais venezuelanos, no valor de 267,2 milhões de euros.

Salgado foi ainda condenado pelo supervisor por desobedecer à determinação que “impôs a proibição de comercialização, de forma direta ou indireta, de dívida de entidades do ramo não financeiro do Grupo Espírito Santo (GES) junto de clientes de retalho”, bem como de financiar ou refinanciar, direta ou indiretamente, as entidades financeiras do GES que não integravam o Grupo BES e ainda por violação das regras sobre conflitos de interesses.

No julgamento, iniciado no passado dia 2 de junho e com alegações marcadas para 25 e 26 de agosto, estão em causa os recursos apresentados por Ricardo Salgado, visado no processo BESA (coima de 1,8 milhões de euros) e no Eurofin (4 milhões de euros), Amílcar Morais Pires (coima de 1,2 milhões de euros do BESA e 3,5 milhões de euros do Eurofin), José Manuel Silva (1,250 milhões de euros do Eurofin), havendo, no processo do Eurofin, ainda coimas de 4 milhões de euros ao BES (suspensas na totalidade por cinco anos) e de 1 milhão de euros à Espírito Santo Finantial Group (ESFG).

No processo do BESA, recorrem ainda Rui Silveira (coima de 400.000 euros) e Gherardo Petracchini (150.000 euros).

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