PIB do primeiro trimestre deve escapar ao impacto da guerra

Os efeitos económicos da invasão russa na Ucrânia deverão fazer sentir-se mais no segundo trimestre. Porém, os economistas admitem risco de economia não regressar ao nível pré-pandemia este ano.

A invasão russa da Ucrânia iniciada a 24 de fevereiro espoletou uma série de reações económicas que estão a ter impacto na Europa e Portugal não é exceção. Porém, os números que o Instituto Nacional de Estatística (INE) vai divulgar esta sexta-feira sobre o PIB do primeiro trimestre ainda não deverão ser muito afetados por esta nova realidade. No conjunto do ano, os economistas admitem uma travagem que pode vir a colocar em causa o regresso ao nível pré-pandemia.

Não antecipo efeitos da guerra sobre o PIB português durante o primeiro trimestre“, diz António da Ascensão Costa, economista do ISEG, assinalando que “será mais provável no segundo trimestre, sobretudo por via da produção industrial e das suas ligações com a economia europeia, nomeadamente a Alemanha”. João Borges de Assunção, da Católica, corrobora: “Penso que o mais provável é só se sentir os efeitos da invasão russa da Ucrânia nos dados da economia portuguesa a partir do segundo trimestre do ano“.

No caso do ISEG, a última previsão para o PIB do primeiro trimestre foi revelada antes do arranque da guerra e apontava para um crescimento económico a “rondar 10%”, em termos homólogos. No caso da Católica, cuja previsão é do início de abril, a convicção é que a economia cresça 0,2% em cadeia (face ao quarto trimestre de 2021) e 9,3% em termos homólogos. Recorde-se que, no primeiro trimestre de 2021, a economia contraiu 5,4%, em termos homólogos por causa do segundo confinamento e já tinha contraído também em 2020 (-2,6%).

A previsão Fórum para a Competitividade, que foi revelada também no início de abril, abarca estes valores, indo de 0% a 1,5% em cadeia, o que corresponderia a uma variação homóloga entre 9% e 10,5%.

A destoar destas previsões está a Área de Estudos Económicos do BCP com uma estimativa de contração do PIB de 0,2% em cadeia no primeiro trimestre, o que corresponderia a uma variação homóloga de 8,8%. “A inversão da trajetória de recuperação da economia portuguesa, após três trimestres consecutivos de crescimento, decorre dos efeitos adversos da guerra na Ucrânia”, justificam os economistas do banco.

Não é essa a opinião dos economistas do ISEG, com António da Ascensão Costa a defender que “a economia deverá crescer em cadeia, tanto por via do investimento como do consumo privado”. Já João Borges da Assunção, da Católica, reconhece que esse cenário de contração em cadeia “é possível embora não seja o mais provável”.

Na opinião dos economistas do BCP, “o forte aumento dos preços matérias-primas energéticas e alimentares, bem como o agravamento das disrupções nas cadeias de produção globais, deverão ter penalizado, particularmente, o consumo privado e as exportações de bens“.

Economia portuguesa em risco de não recuperar nível pré-pandemia em 2022

Mais importante do que o comportamento no primeiro trimestre é saber se a economia portuguesa conseguirá crescer o suficiente em 2022 para alcançar o nível pré-pandemia (2019). A convicção do Governo, reafirmada na proposta do Orçamento do Estado para 2022 (OE2022), é que tal será possível, com o PIB a terminar este ano 0,7% acima do nível pré-Covid, apesar do impacto da guerra. A previsão para o conjunto do ano do Executivo é de 4,9%, em linha com o Banco de Portugal (4,9%) e Conselho das Finanças Públicas (4,8%), mas acima da previsão do Fundo Monetário Internacional (4%).

“Em princípio, mesmo antecipando uma desaceleração do crescimento potencial a partir do segundo trimestre, devido às consequências económicas da guerra, ainda parece provável que o nível do PIB de 2019 possa ser recuperado este ano“, antecipa António da Ascensão Costa. Já Jorge Borges da Assunção tem mais dúvidas. “A recuperação do nível de atividade do ano de 2019 não me parece que seja um dado adquirido para 2022“, confessa.

Mas ambos partilham as mesmas dúvidas sobre os próximos trimestres, as quais são transversais às várias economias europeias: a duração e intensidade da guerra, o seu impacto na atividade económica real além do efeito inflacionista, os preços da energia e o rumo da política monetária, principalmente nos juros.

Contudo, tal como aconteceu em determinadas alturas durante a pandemia, não se pode afastar que possa haver surpresas positivas mesmo com os efeitos da guerra. O professor do ISEG aponta para o turismo que está a registar uma “procura bastante forte” com a Covid-19 a desaparecer das preocupações dos consumidores e empresas.

“Este é um caso em que a procura potencial esteve temporalmente contida pela pandemia, o que acabou por gerar poupanças, e estará agora a expressar-se de forma plena”, explica António da Ascensão Costa, notando que “esta dinâmica poderá manter-se por algum tempo se não for atingida por impactos inflacionistas excessivos devido às consequências da guerra“.

João Borges de Assunção dá o exemplo da recuperação do investimento que é “um dado que sinalizará a força da economia e a entrada das verbas do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) podem suportar um bom nível do investimento”. Foi exatamente essa componente que mais surpreendeu pela positiva durante a pandemia, tendo já recuperado o nível pré-Covid.

Os economistas do BCP também admitem ter expectativa de “robustez do investimento”, assim como de “recuperação do turismo”, o que deverá “ter contribuído para mitigar, ainda que parcialmente, os efeitos negativos da guerra sobre a procura agregada”.

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