Casos na ACT sobre outsourcing após despedimentos são residuais
Travão ao outsourcing após despedimentos coletivos ou extinção do posto de trabalho foi uma das medidas mais polémicas da Agenda do Trabalho Digno e uma das que o Governo quer agora revogar.
A Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) recebeu menos de dez casos relativamente ao travão ao outsourcing após despedimentos. O balanço foi adiantado pela inspetora-geral, Maria Fernanda Campos, que sublinha que este assunto tem sido “residual”.
Esta foi, no entanto, uma das medidas mais polémicas da Agenda do Trabalho Digno — chegou até a ser enviada para o Tribunal Constitucional — e é uma daquelas que o Governo quer agora revogar, na reforma da lei laboral.

“A lei precisa de algum tempo para maturar, ser interiorizada, ser percebida pelos destinatários e para que estes se possam consciencializar dos seus direitos e deveres. Nesta matéria, os casos não chegam a uma dezena e estão em curso“, explicou a responsável, numa conferência promovida em Lisboa pela sociedade de advogados Gómez-Acebo & Pombo sobre a reforma da lei laboral que está a ser negociada, neste momento, em Concertação Social.
De acordo com a inspetora-geral, todos os casos que estão a correr foram espoletados por pedidos de intervenção, ou seja, a ACT em si “não sentiu um fenómeno que a levasse a planear uma ação para verificar se esta norma estava a ser cumprida ou não”.
Além disso, Maria Fernanda Campos salientou que esses pedidos “não aconteceram logo em 2023”, pelo que “ainda não há coimas ainda aplicadas”. “A lei será aplicada e as empresas, não concordando, podem recorrer”, acrescentou a mesma.
A proibição do recurso ao outsourcing para satisfazer “necessidades que eram asseguradas por trabalhador cujo contrato tenha cessado nos 12 meses anteriores por despedimento coletivo ou despedimento por extinção de posto de trabalho” está prevista no Código do Trabalho desde a primavera de 2023, tendo sido uma das medidas da chamada Agenda do Trabalho Digno.
Esta foi uma das matérias desse pacote mais contestadas pelos empregadores, e até o Tribunal Constitucional foi chamado a apreciar esta norma.
Em julho deste ano, os juízes do Palácio Ratton fizeram saber, contudo, que entendem que não está em causa qualquer violação da Constituição, ao contrário do que era defendido, por exemplo, no parecer jurídico pedido pelo Conselho Nacional das Confederações Patronais.
No acórdão datado de 2 de julho, o Tribunal Constitucional sublinha que o que se pretende vedar ao empregador “é o recurso ao despedimento-para-terceirizar”. “O recorte feito no preceito é a ocorrência de uma situação de despedimento coletivo ou por extinção do posto de trabalho seguida de um comportamento do empregador nos 12 meses seguintes, de recorrer à terceirização, o que se valora como sendo um forte indício de poder não ter havido uma necessidade real de despedir, mas antes, uma forma de reduzir custos associados à manutenção dos contratos de trabalho existentes”, é sustentado.
Ainda assim, o Governo incluiu no seu anteprojeto que visa reformar a legislação laboral a eliminação dessa norma. Ou seja, o Governo quer que volte a ser possível recorrer à terceirização de serviços para satisfazer necessidades que eram supridas por trabalhadores, entretanto, envolvidos em despedimentos coletivos ou por extinção do posto de trabalho.
Ainda não é certo, porém, se tal se concretizará. A negociação em sede de Concertação Social ainda corre e, depois, seguirá para o Parlamento, onde o Governo da AD terá também de dialogar com a oposição, uma vez que a sua maioria maior não chega para viabilizar as muitas mexidas que pretende fazer ao Código do Trabalho.
Rateio do horário flexível incluído na lei?

Outra das normas do Código do Trabalho que o Governo quer alterar é a relativa ao horário flexível para trabalhadores com responsabilidades familiares.
Hoje, ao abrigo desse regime, um trabalhador com um filho até 12 anos (ou, independentemente da idade, filho com deficiência ou doença crónica) tem direito a “escolher, dentro de certos limites, as horas de início e termo do período normal de trabalho diário“.
Com o anteprojeto que está a ser discutida na Concertação Social, o Governo pretende deixar claro no Código do Trabalho que o horário flexível é elaborado pelo empregador mediante proposta do trabalho e deve respeitar a necessidade de se “ajustar às formas especiais de organização de tempo de trabalho que decorram do período de funcionamento da empresa ou da natureza das funções do trabalhador, nomeadamente em caso de trabalho noturno ou prestado habitualmente aos fins de semana e feriados“.
"A CITE, sobretudo, desde setembro de 2023 tem colocado um parágrafo nos seus pareceres onde explica que, quando há colisão de direitos, tem de haver lugar ao rateio de horário. E isto é que o anteprojeto devia prever. Apesar de constar dos pareceres da CITE, não há nada na lei que encaminhe para esta solução.”
Na referida conferência, a presidente da Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE), Carla Tavares, defendeu que esse ajustamento já resulta da lei como está e alertou que, em alternativa, o Governo deveria aproveitar para deixar na lei o rateio de horários flexíveis, quando, por exemplo, há vários trabalhadores num serviço a beneficiar dele.
“A CITE, sobretudo, desde setembro de 2023 tem colocado um parágrafo nos seus pareceres onde explica que, quando há colisão de direitos, tem de haver lugar ao rateio de horário, ou seja, quando temos vários direitos em conflito — nomeadamente, quando no mesmo serviço há vários horários flexíveis — pode ter de haver uma rotatividade“, afirmou a responsável.
“Isto é que o anteprojeto devia prever. Apesar de constar dos pareceres da CITE, não há nada na lei que encaminhe para esta solução. Isso, sim, é que acho que devia ser feito. Mais do que aquilo que está a ser feito”, realçou Carla Tavares.
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