ECO da campanha: Barracas, discussão “à taberneiro” e o comboio das cinco
Ao segundo dia de campanha, Montenegro vestiu o fato de primeiro-ministro e deixou o de dirigente partidário para Hugo Soares. José Luís Carneiro madrugou para apanhar o comboio.
Com o líder do PSD em viagem europeia no fato de primeiro-ministro, Hugo Soares andou pelo Algarve, acompanhado do vice-presidente Alexandre Poço, que em 2021 estava “a dar tudo por Oeiras” enquanto candidato.
O secretário-geral do PSD considerou que “hoje é um dia importante para o Algarve e para o país”, justificando-o com o facto de que “ontem, o Parlamento aprovou finalmente a lei de estrangeiros e no Algarve, que é uma região que teve e tem componente de imigração, de pessoas que nos procuram, e ajudam muito a economia algarvia, é um tema que interessa falar”. Os social-democratas repetem o mantra um dia depois, desta vez não em Sintra, mas no Algarve, outro local onde o Chega cantou vitória nas legislativas.
Com o líder partidário autor da frase do dia de arranque da campanha fora do país, nas suas funções de primeiro-ministro, o líder do PS, a bordo do comboio das cinco da manhã, veio defender os seus autarcas do ataque de Montenegro. Nessa questão do regresso das barracas a concelhos liderados por PS e PCP, José Luís Carneiro apontou o dedo a um instituto tutelado pelo Estado e comandado por um ex-autarca do PSD designado por Montenegro há um ano.
Barracada é o que se vive no Chega em Pombal, onde o candidato autárquico saiu de cena. O partido aponta má conduta ao seu também ex-deputado citado no livro relativo à “face oculta da extrema-direita em Portugal” onde o mesmo lamenta a linguagem de “taberneiro” no partido. A entrevista era de 2021, mas o livro foi agora publicado.
Tema quente
Um dia depois do repasto de bife com batatas fritas oferecido por Luís Montenegro aos candidatos do PSD no distrito de Lisboa, José Luís Carneiro pagou o bilhete de comboio aos seus candidatos servidos pela linha de Sintra. Aproveitando a hora madrugadora do primeiro comboio do dia, 5h22, teve oportunidade de abordar passageiros numa hora quando ainda não se iniciara o verdadeiro modo “sardinhas em lata”.
O tema forte eram os direitos laborais, ou não estivesse sentada a seu lado a sua antiga colega de Governo e ex-ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho, candidata ao lugar que Basílio Horta deixa livre dentro de semanas, após 12 anos de liderança socialista do segundo mais populoso município do país.
Mas, entre estações, Carneiro fez agulha para a habitação indigna: “Espero que hoje responda se tem consciência que, por exemplo, nos terrenos do IHRU em Almada, que são do Estado, estão a ser construídas habitações ilegais. São 800”. O líder socialista acrescentou que Inês de Medeiros, autarca de Almada desde 2017, “enviou comunicações formais para o Governo, nomeadamente para o ministro das Infraestruturas e, até hoje, não teve qualquer resposta”.
Já Paulo Raimundo, falando numa das duas capitais de distrito que a CDU ainda lidera, Évora, considera que o primeiro-ministro “é só tiros nos pés, é tiros nos pés quando fala na habitação, numa realidade de um país que só existe na vida dele ou na bolha em que ele vive, e é só tiros nos pés quando não olha para o país como uma nação”.
A figura
A 22 de setembro, o Chega anunciou a renúncia de Gabriel Mithá Ribeiro ao mandato de deputado na Assembleia da República, que exercia desde 2022. Agora, sabe-se que abandona a candidatura a presidente da Câmara de Pombal, terra da sua mulher.
Mithá Ribeiro deixou críticas à cultura interna do partido no livro “Por Dentro do Chega: A Face Oculta da Extrema-Direita em Portugal’”, lançado por Miguel Carvalho. Quando foi questionado sobre a demissão do deputado, André Ventura apontou “razões pessoais” e não esclareceu se o designado ideólogo do partido iria desistir da candidatura a Pombal: “Uma questão a perguntar” ao candidato, afirmou Ventura há pouco mais de uma semana.
Numa das entrevistas feitas por Miguel Carvalho ao longo de cinco anos, Mithá Ribeiro denuncia o que considera discurso “taberneiro” do partido e assegura que o partido funciona segundo a intuição e instinto de Ventura: “Há um campo de afirmação fácil, mas em temas muito arriscados, que originam discussões sobre o fascismo, o racismo, essa coisa toda. São temas férteis para nós, mas não podem ser discutidos à taberneiro ou rebentamos com o nosso caminho de afirmação”.

Os números
No grupo dos 186 concelhos com mais de 10 mil habitantes, Lisboa, Oeiras e Porto são os melhor classificados no ranking de competitividade municipal, segundo o Instituto Mais Liberdade. O índice compara atratividade e qualidade de serviços e infraestruturas, direcionados para análise de famílias, empresas e decisores públicos.
No interior estão os pior classificados, distribuídos da seguinte forma, entre a 180.ª e a 186.ª posições: Vieira do Minho, Celorico de Basto, Alijó, Vila Pouca de Aguiar, Ponte da Barca, Valpaços e Moura.

A frase
"Aqui em Loulé, o candidato do Chega à Câmara é de São Brás, o candidato a São Brás é de Loulé e há uma freguesia onde todos os candidatos com exceção do número dois são de outra freguesia”
A surpresa
Deitar cedo e cedo erguer… o ditado assegura que faz crescer. As perspetivas para José Luís Carneiro não será o aumento de câmaras, mas tentar não perder o lugar de maior partido autárquico. Passava pouco das cinco horas da manhã e o secretário-geral do PS já estava alinhado para o primeiro comboio da linha de Sintra.
Antes de Lisboa, entraram Ana Sofia Antunes (uma das estações está em território de Oeiras), Vítor Ferreira, autarca recandidato na Amadora, e, a recebê-los no Rossio, Alexandra Leitão, que tenta fazer agulha para a cadeira que Carlos Moedas conquistou há quatro anos. Carneiro passou por Algueirão-Mem Martins, tal como o presidente do PSD na terça-feira, mas não saiu da composição para pisar o solo da freguesia onde cresceu André Ventura, líder do partido que acalenta fortes esperanças de tirar Sintra e Amadora aos socialistas.
Prova dos 9
“É muito curioso observar que este novo movimento de ressurgimento de bairros de lata e de barracas aconteceu em municípios geridos pelo Partido Socialista e pelo Partido Comunista”. Luís Montenegro afirmou-o na terça-feira e o secretário-geral do partido, Hugo Soares, reiterou-o nesta quarta-feira no Algarve. O líder parlamentar do PSD citou especificamente Almada e Loures, já depois de José Luís Carneiro ter alegado que parte do problema está em terrenos do Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU), titulado pelo Estado.
Olhemos para o mapa: no mandato que agora termina, o PSD está presente em três dos 18 municípios da Área Metropolitana de Lisboa. Em agosto, o ECO/Local Online contactou as autarquias da grande Lisboa a propósito deste tema. Nas câmaras “laranja”, Cascais não tem barracas desde o ano 2000, assegura o vice-presidente e agora candidato Nuno Piteira Lopes.
Já na autarquia liderada por Carlos Moedas, refere-se que “se é identificada alguma construção ilegal no concelho de Lisboa, o município, com a colaboração da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, procede à respetiva demolição, encaminhando os agregados que eventualmente nela residam para respostas habitacionais, segundo os princípios legais”. A outra autarquia liderada pelo PSD é Mafra, onde o problema teve uma dimensão muito pontual no século passado.
Em março, Inês de Medeiros afirmou, numa entrevista ao ECO/Local Online, que “Penajóia há um ano e meio não existia” e que após um primeiro levantamento foram identificadas “cerca de 50 pessoas. Remetemos ao IHRU”, assegurou a autarca. O instituto, afirmou a autarca, “ficou não apenas de continuar esse levantamento, mas tentar travar aquela construção desenfreada e arranjar soluções. Apesar de tudo, aquilo são terrenos do IHRU, não são da câmara […} Como houve uma omissão total durante um ano e meio, tomou as proporções que tomou”.
Inês de Medeiros avançou ainda que “o senhor ministro [Miguel Pinto Luz] disse que já tinham feito o levantamento. Nós não o conhecemos”.
Penajóia é o grande foco de barracas em Almada, assegura a socialista. O IHRU é comandado, desde agosto de 2024, por António Benjamim Costa Pereira, eleito em 2021 pelo PSD para um terceiro e último mandato como presidente da Câmara de Esposende.
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