Lagarde exige que empréstimo à Ucrânia, com base em ativos russos, não afete estabilidade financeira

  • Lusa
  • 6 Outubro 2025

A presidente do BCE defendeu que o novo mecanismo de empréstimo à Ucrânia deve “ser legítimo” e alertou que "as tensões geopolíticas continuam a ser uma fonte significativa de incerteza".

A presidente do Banco Central Europeu (BCE), Christine Lagarde, exigiu esta segunda-feira que o novo empréstimo de reparação à Ucrânia, proposto pela Comissão Europeia e assente em ativos russos congelados na União Europeia (UE), não afete a estabilidade financeira. “Tendo em mente a solidez do euro, estaremos muito atentos para garantir que o que for proposto esteja em conformidade com o direito internacional e tenha em conta a estabilidade financeira” da zona euro, disse Christine Lagarde.

Na sua audição regular perante a comissão dos Assuntos Económicos e Monetários do Parlamento Europeu, realizada à margem da sessão plenária da instituição na cidade francesa de Estrasburgo, a presidente do BCE defendeu que o novo mecanismo também deve “ser legítimo”.

“Isso é algo que deve ser debatido pelos líderes da UE, mas seria legítimo que os princípios de utilização dos rendimentos ou do capital, respeitando o direito internacional, fossem adotados por todos aqueles que detêm esses ativos russos”, precisou, falando no caso da Euroclear, “que detém um grande volume” de tais bens imobilizados.

A Comissão Europeia vai apresentar nas próximas semanas uma proposta para empréstimo de reparação à Ucrânia assente nos ativos russos congelados na União Europeia, esperando aval dos líderes europeus para o mecanismo estar operacional na primavera de 2026.

Para continuar a apoiar a Ucrânia, o executivo comunitário vai propor um empréstimo de reparação, para o qual espera aval na UE, que será assente nos ativos russos congelados pelas sanções europeias à Rússia e terá um montante calculado com base nas necessidades financeiras ucranianas nos próximos dois anos.

Fontes comunitárias indicaram que a instituição espera apresentar a sua proposta legislativa formal antes da cimeira europeia de 23 e 24 de outubro, com o intuito de obter aval dos líderes da UE e que este mecanismo esteja operacional no segundo trimestre de 2026.

Tal como a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, já havia anunciado, o montante total de 140 mil milhões de euros seria mobilizado para a Ucrânia em tranches e mediante condicionantes, apoio com o qual o país poderia financiar a sua indústria de defesa e as suas despesas orçamentais.

Em causa está um empréstimo a favor da Ucrânia com base nos ativos financeiros congelados do Banco Central da Rússia que estão sob controlo da UE, cujo reembolso ficaria condicionado ao pagamento de reparações por parte da Rússia. Não está previsto que estes bens russos imobilizados sejam confiscados, continuando congelados, mas sim que a UE (e outras entidades eventualmente envolvidas) disponibilize as verbas e, quando e se a Rússia pagar as reparações, os fundos sejam usados para reembolsar os credores.

Para minimizar os riscos, caberia aos países da UE dar garantias semelhantes às do orçamento europeu, em função do rendimento nacional, mas cada governo decidiria individualmente se participa no mecanismo. Atualmente, existem cerca de 210 mil milhões de euros em bens congelados russos na UE, principalmente na Bélgica, onde está sediada a Euroclear, uma das maiores instituições de títulos financeiros do mundo.

Antes da guerra da Ucrânia, o Banco Central da Rússia (e outras instituições estatais russas) investiam parte das suas reservas internacionais em ativos depositados e geridos através de intermediários como a Euroclear, mas com as sanções da UE tais verbas ficaram imobilizadas, sendo este o maior volume congelado em qualquer instituição financeira do mundo. A proposta gera, porém, reservas jurídicas por se poder assemelhar a expropriação e financeiras sobre a estabilidade do euro.

Lagarde alerta para riscos de novas tensões comerciais

Lagarde alertou ainda que o risco de eventuais novas tensões comerciais entre os Estados Unidos e a União Europeia (UE) nas exportações, investimento e consumo na zona euro.

Os riscos para o crescimento económico tornaram-se mais equilibrados, uma vez que diminuiu a probabilidade de materialização de riscos negativos relacionados com tarifas, graças ao novo acordo comercial [entre UE e Estados Unidos]. No entanto, subsistem riscos de que novas tensões comerciais venham a afetar as exportações, o investimento e o consumo”, alertou Christine Lagarde.

A presidente do BCE indicou que, nos últimos meses, a área da moeda única enfrentou “um período de maior incerteza”, antes de a UE e os Estados Unidos chegarem, no verão, ao acordo comercial para tarifas norte-americanas de 15% a produtos europeus.

Apesar de tal consenso, “há sempre um grau de incerteza que é remanescente ou recorrente”, admitiu a responsável. “O fraco desempenho das exportações – devido às tarifas mais elevadas, a um euro mais forte e à intensificação da concorrência global – deverá conter o crescimento no restante do ano, mas o impacto destes ventos contrários deverá diminuir no próximo ano”, adiantou.

Acresce que, de acordo com Christine Lagarde, também “as tensões geopolíticas continuam a ser uma fonte significativa de incerteza”.

“Em contrapartida, maiores despesas em defesa e infraestruturas e reformas que aumentem a produtividade poderiam impulsionar o crescimento”, sugeriu.

Para Christine Lagarde, esta maior incerteza política é “uma oportunidade única para reforçar o papel global do euro”, o que traria “benefícios tangíveis” como a sua maior utilização nas faturas comerciais, a redução de custos de transação e a proteção dos preços europeus contra a volatilidade cambial. O BCE estima que a economia da zona euro cresça 1,2% em 2025, 1% em 2026 e 1,3% em 2027.

No que toca à inflação, tem-se mantido em torno dos 2%, a percentagem definida pelo banco central para estabilidade dos preços, mas segundo Christine Lagarde “o processo desinflacionário terminou”, o que será tido em conta nas próximas reuniões sobre política monetária. As projeções do BCE revelam que a inflação global se deverá situar em média nos 2,1% em 2025, em 1,7% em 2026 e em 1,9% em 2027.

(artigo atualizado às 20h13 com mais informação)

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