Governação Pública e Parcerias Público-Privadas

  • João Canto e Castro
  • 3 Junho 2022

As PPP são um bom modelo. Mas não são imunes à irresponsabilidade política, à demagogia e ao populismo com que muitas foram “preparadas”, lançadas, contratualizadas e renegociadas.

As parcerias público-privadas (PPP) são uma solução adequada que permite às entidades de natureza pública beneficiar, fundamentalmente, da maior flexibilidade de gestão e da maior agilidade do setor privado e, ao mesmo tempo, mobilizar os meios financeiros necessários para poder suprir as necessidades coletivas, seja no âmbito do Estado em sentido estrito, seja em domínios cujo alcance é mais circunscrito.

Mas as PPP não são uma ciência exata, cujo resultado final está garantido à partida, por muito que as boas práticas tenham sido observadas e seguidas de forma escrupulosa e diligente. Só no conforto e recato dos gabinetes é que se podem e conseguem alimentar fantasias desse género.

Não vale a pena alimentar populismos – políticos e jurídicos – sobre este ponto. O foco é sempre, ou deve ser, a prossecução do interesse público, com recurso aos instrumentos disponíveis, o recurso àqueles instrumentos que se mostrarem mais adequados, exequíveis e económico-financeiramente comportáveis para o parceiro público e para o parceiro privado.

Sem reservas morais ou de outra natureza

A pedra de toque de qualquer parceria público-privada é o Risco. O princípio que todos conhecem é que o Risco deve ser alocado a quem, em concreto (não em abstrato), estiver em melhores condições de o gerir.

Assim, na preparação de uma PPP: (i)Identificar de forma exaustiva os riscos subjacentes à preparação, lançamento e execução da PPP; (ii) Caracterizar cada um dos Riscos identificados e proceder à sua alocação.

Os parceiros públicos devem (i) Estimar efeitos financeiros decorrentes da eventual concretização dos Riscos que lhe tiverem sido alocados; (ii) Estimar os efeitos financeiros decorrentes da eventual concretização dos Riscos que tiverem sido partilhados;

E estimar efeitos financeiros decorrentes da eventual concretização dos Riscos que tiverem sido alocados ao parceiro privado, na hipótese de ter de assumir a responsabilidade pela sua, dos riscos, verificação. Porquê? Através do contrato em que se traduz a PPP, prossegue-se um determinado interesse público, satisfaz-se uma determinada necessidade coletiva, presta-se um determinado serviço público. Logo, a prossecução desse interesse tem sempre de ser assegurada, tem de ser salvaguardada.

Feito este exercício preliminar, é que devem ser feitos os estudos económico-financeiros que assegurem e demonstrem a viabilidade económico financeira da PPP em concreto.

A PPP pode ser exequível com uma modelação diferente dos riscos existentes.

Viabilidade pode não querer dizer que a PPP seja autossustentável. Se for, melhor assim.

Mas se não for, isso não quer dizer que não se possa levar a cabo, seja com apoio direto do parceiro público, seja repercutindo o encargo financeiro estimado nos diretamente beneficiados, seja um misto destas duas coisas.

A boa PPP não é aquela que transfere para o parceiro privado todos os riscos. A boa PPP é aquela que aloca os riscos de uma tal forma que permita a convergência de interesses divergentes – não opostos – no sentido de tornar a PPP viável:

  1. Para o parceiro público, que vê prosseguido o interesse público em causa, através de um parceiro fiável e um contrato exequível para ambas as Partes
  2. Para o parceiro privado, que assegura a prossecução desse interesse, obtendo um financiamento externo comportável e um contrato exequível, com uma margem de lucro aceitável.

A PPP só é, a curto, médio e longo prazo, viável e exequível, se estes dois predicados puderem ser reconhecidos por todos os envolvidos.

Mas exige gestão dedicada, monitorização e fiscalização. Exige, numa palavra, profissionalização da atividade de gestão, acompanhamento e fiscalização, com formação de equipas que cubram todas as valências da PPP (técnicas, eco/financeiras, jurídicas).

E exige incentivos alinhados, definição de níveis de desempenho e mecanismos de resolução de litígios pré- judiciais/arbitrais.

Do lado da governação, exige ideias claras e apostas consequentes. E muita, muita Transparência. Temos exemplos recentes que nos devem atormentar a este respeito.

Primeiro exemplo. Ao nível das concessões municipais, cabe à Direção Geral das Autarquias Locais, publicar um relatório anual sobre aquelas concessões. O último relatório conhecido é de 2019 e reporta-se ao ano de 2018. Monitorização, Transparência?

Segundo exemplo: seja ao nível da coordenação, seja ao nível das suas equipas, o Governo não tem sido capaz (será falta de vontade?) de reter os quadros que constituem e integram a Unidade Técnica de Acompanhamento de Projetos. Convido o leitor a visitar o sítio dessa Unidade e constatar pelos seus olhos o périplo de quadros que entram e saem – com toda a legitimidade – da UTAP. Retenção de talento, nivelamento da posição do Estado nas PPP?

As PPP são um bom modelo. Mas não são imunes à irresponsabilidade política, à demagogia e ao populismo com que muitas foram “preparadas”, lançadas, contratualizadas e renegociadas.

Não podem nem devem ficar com o odioso daquelas patologias. Nem ser excluídas por isso.

  • João Canto e Castro
  • Advogado e militante do CDS/PP

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

Governação Pública e Parcerias Público-Privadas

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião