Empresários suspiram de alívio com salvação do Orçamento antes da queda do Governo
Empresários ouvidos pelo ECO concordam com as eleições antecipadas e satisfeitos por avançar já o Orçamento do Estado. Porém, estão preocupados com a imagem que Portugal está a passar para o exterior.
A decisão do presidente da República de dissolver o Parlamento na sequência do pedido de demissão de António Costa, mas permitir a viabilização do Orçamento do Estado para 2024 (OE2024), deixou satisfeitos os empresários e gestores portugueses. Para os decisores ouvidos pelo ECO, seria penalizador o país ficar a ser gerido em duodécimos. Apesar de aliviados com a decisão de Marcelo Rebelo de Sousa, assumem preocupação com a imagem que Portugal está a passar para o exterior.
Carlos Monteiro, CEO da farmacêutica Biojam, defende que a aprovação do Orçamento antes da queda do Governo acabou por ser uma “decisão acautelada” e considera-a mesmo “uma excelente medida antes das eleições” antecipadas, enquanto António Oliveira, presidente da empresa industrial OLI (Aveiro), sublinha que isso “permite clarificar e diminuir a incerteza até à posse de um novo Governo”.
“É muito importante ter um Orçamento para não estarmos a viver com duodécimos, algo que se previa que ia existir até setembro de 2024. Portanto, iríamos estar nove meses a viver [neste regime] e isso seria muito penalizador para as empresas e para a economia em geral”, corrobora o presidente do grupo bracarense Bernardo da Costa e da Associação Empresarial do Minho (AEMinho).
Já o patrão da Calvelex também se mostra alinhado com a ideia defendida por Ricardo Costa, defendendo que “seria péssimo o país ser governado em duodécimos” e que isso iria “criar uma instabilidade ainda maior”. Apesar de considerar que a proposta apresentada por Fernando Medina “não é boa”, compreende que “tinha de ser aprovada” antes da queda do Executivo socialista.
Também para Rafael Campos Pereira, vice-presidente executivo da Associação dos Industriais Metalúrgicos, Metalomecânicos e Afins de Portugal (AIMMAP), considera “prudente” que exista um Orçamento do Estado para 2024, apesar de o considerar “péssimo”. Contudo, o porta-voz da indústria mais exportadora da economia portuguesa espera que “exista a possibilidade de ser alterado” depois da ida às urnas e da eleição de um sucessor para António Costa.
“Foram criadas as condições para o OE2024 ser viabilizado. No entanto, com as eleições, será seguramente revisto para o segundo semestre, o que colocará novas incertezas quanto a opções para o futuro. Além do OE, existem questões muito importantes para a vida das pessoas e das empresas que podem ficar comprometidas sem um Governo em plenas funções. A execução do PRR e o arranque do Portugal 2030 poderão ser um exemplo disso”, avisa Luís Miguel Ribeiro, presidente da Associação Empresarial de Portugal (AEP).
Mas também há uma minoria de gestores, entre os consultados pelo ECO no final de uma semana agitada nas hostes políticas, com uma visão diferentes. É o caso de Afonso Barros, CEO da Irmarfer, para quem “um eventual retificativo não faz muito sentido e gera muita incerteza”. O gestor da empresa de Freamunde detida pela private equity Crest e pelos irmãos Ferreira discorda da opção de “forçar a aprovação de um OE que outro irá herdar — e que terá sempre a desculpa perfeita para dizer ‘não fui eu que o aprovei’ e que não se sentirá comprometido com [as contas] que irá tutelar”.
Afonso Barros contrapõe que se a preocupação era a aprovação do OE, Costa “devia ter sido substituído dentro do PS até novas eleições”. Na ótica do gestor, teria sido “mais benéfico suspender a aprovação do OE, levar já o país a eleições antecipadas e, com a constituição de um novo Governo,levar o OE para 2024”.
Depois da decisão de Marcelo Rebelo de Sousa na noite de quinta-feira, após a auscultação do Conselho de Estado, o presidente do PSD assegurou que apresentará um orçamento retificativo se vencer as próximas eleições legislativas e for empossado primeiro-ministro. No entanto, considerou que “mais vale ter um mau orçamento do que não ter orçamento nenhum”.
Apesar de concordar com as decisões tomadas pelo chefe de Estado, Américo Pinheiro, CEO da Castelbel, histórica fabricante de sabonetes da Maia, afirma que Portugal “está a apanhar os cacos da melhor forma possível”. “É importante ter estabilidade, passar a página e avançar”, acrescenta.
Estamos a apanhar os cacos da melhor forma possível. É importante ter estabilidade, passar a página e avançar.
A Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), presidida por João Vieira Lopes considera que a decisão do Presidente “vai de encontro ao melhor interesse para economia nacional e o país” e “assegura a aprovação das medidas previstas no acordo de rendimentos”, nomeadamente o aumento do salário mínimo para 820 euros, que foi aprovado poucas horas antes de Marcelo falar ao país e promulgado na sexta-feira.
João Bento, CEO dos CTT, reconhece que a crise política vai afetar a credibilidade do país, mas expressa alívio pelo facto de o Orçamento do Estado para avançar já. César Araújo, que lidera a associação dos industriais do vestuário e confeções (ANIVEC), concorda e sublinha que a crise política que estalou esta semana “é muito má para o país e para a imagem de Portugal internacionalmente”.
“O país não estava preparado para uma crise política e era tudo o que menos merecíamos neste momento”, lamenta o presidente da ANIVEC. A Associação Portuguesa dos Industriais de Calçado, Componentes, Artigos de Pele e seus Sucedâneos (APICCAPS) lamenta igualmente o sucedido e caracteriza-o como “um momento infeliz para a nossa democracia, num momento de forte instabilidade internacional motivada pela existência de duas guerras de consequências imprevisíveis”.
É muito mau para o país e para as empresas. E mesmo a nível de investimento externo vamos ser vistos como um país que está ligado às máquinas até março, o que é muito preocupante.
Marcelo Rebelo de Sousa optou por manter um primeiro-ministro demissionário em funções até 10 de março. Afonso Barros, CEO da Irmarfer, critica a opção e realça que “é muito mau para o país e para as empresas”. E a “nível de investimento externo, Portugal vai ser visto como um país que está ligado às máquinas até março, o que é muito preocupante”. Portugal vai ficar “durante estes meses todos com um Governo interino que nem é carne, nem é peixe”.
“António Costa não tem condições de continuar a exercer o cargo de primeiro-ministro e é mau para toda a gente. Já nem sequer está sequer no espírito e da responsabilidade de liderar o país e nem o país o vai ver como seu líder. Vamos ter um vazio de poder muito grande”, acrescenta.
Eleições antecipadas eram a solução
Marcelo Rebelo de Sousa optou pela dissolução da Assembleia da República e a marcação de eleições a 10 de março de 2024. O primeiro-ministro, no entanto, discordou do Presidente da República e disse que “o país não merecia ser chamado a eleições”, revelando ter proposto o nome do governador do Banco de Portugal, Mário Centeno, para o suceder em São Bento.
No entanto, todos os empresários ouvidos pelo ECO concordam com o cenário de eleições antecipadas e defendem que o “mais adequado” é mesmo devolver a palavra aos portugueses.
“O mais adequado é devolver a palavra ao povo português para clarificar a situação política”, defende o presidente da AEMinho, ao referir que “o país não precisava neste momento de uma crise política”. Uma opinião partilhada pelo presidente da ANIVEC e dono da Calvelex, que frisa que ” temos de ter políticos eleitos pelo povo” e outra solução “seria um remendo que não fazia qualquer sentido”.
Carlos Monteiro, CEO da farmacêutica Biojam, considera a data oportuna e também ser “o período necessário para ser feita uma discussão alargada das propostas de todos os partidos políticos que querem ter a possibilidade de governar Portugal”.
O país não precisava neste momento de uma crise política. Mas dado a demissão do primeiro-ministro, o mais adequado é devolver a palavra ao povo português para clarificar a situação política.
O vice-presidente executivo da associação dos industriais de metalurgia e metalomecânica, que integra também a direção da Confederação Empresarial de Portugal (CIP), considera que a posição de Marcelo sobre a data das eleições é “sensata”, até porque, justifica, “permite, independentemente dos prazos, que toda a gente esteja preparada para as eleições e permite que o OE seja aprovado entretanto”.
Pelo contrário, apesar de concordar com a decisão do Presidente da República de dissolver o Parlamento, a CIP considera excessivo o período de quatro meses até às eleições. Armindo Monteiro, presidente da CIP considera que “é claramente muito tempo para que um partido se organize”, referindo-se à justificação dada por Marcelo Rebelo de Sousa de que era necessário permitir ao PS que escolhesse um novo líder.
“Nas empresas, quatro meses é um longo prazo e gostaríamos que, também na política, houvesse uma capacidade de resolver os problemas num prazo mais curto. Achamos que os partidos devem estar constantemente em organização e ter soluções alternativas, porque também é isso que é exigido às empresas”, argumenta o líder da CIP.
Demissão de Costa era “obrigatória”
Finalmente, os empresários ouvidos pelo ECO não têm dúvidas de que o pedido de demissão de António Costa, depois de ter tido conhecimento que estava a ser investigado pelo Ministério Público, no âmbito de suspeições de corrupção ligadas aos negócios do lítio e hidrogénio verde, era imperativa. Não tinha outro caminho a seguir.
“Esta fragilidade das instituições democráticas e esta desconfiança permanente sobre a política é muito negativa para o país. Precisamos de instituições fortes e estes casos não ajudam nada a esse processo”, lamenta o presidente do grupo bracarense Bernardo da Costa.
Américo Pinheiro (Castelbel) concorda com a saída de cena do governante e atesta que “ser político exige um comportamento exemplar e que seja mais branco que o branco”. Sobretudo quando ocupa o cargo de primeiro-ministro, ao qual está associada “uma enorme responsabilidade e exigência” que “não se cruza com qualquer tipo de suspeita”.
Carlos Monteiro, CEO da farmacêutica Biojam, lembra que esta crise e as suspeitas que envolvem o até agora líder socialista podem afetar a “credibilidade” que o país terá nos mercados internacionais. Lamentando, por outro lado, que esta demissão aconteça numa altura em que se aproximam “os piores meses do SNS e as greves dos professores”.
António Costa com o líder do grupo Kyaia, Fortunato Frederico, confessa igualmente que foi “apanhado de surpresa” e que ficou “chocado com esta situação”. “Ninguém estava a contar com uma coisa destas. É mau porque o país precisa de serenidade”, refere o fundador do grupo de calçado que detém a marca Fly London e que antecipa que o país vai assistir nos próximos meses a um “temporal dos grandes”.
O único empresário ouvido pelo ECO que não concordou com o pedido de demissão de António Costa foi mesmo o presidente da ANIVEC e dono da Calvelex. César Araújo considera que o primeiro-ministro “não devia ter pedido a demissão” porque isso “só vem atrasar o desenvolvimento do país, mais uma vez”. “Metade da população portuguesa está a ser investigada e toda a gente é inocente até que se prove o contrário”, remata o empresário nortenho.
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