Rendimento garantido ressuscita seguros de Vida
A venda de produtos de capitalização das seguradoras aumentou 23% no primeiro trimestre. Voltaram as taxas de rendimento garantidas, as companhias estão a arriscar e o público a aderir.
Os produtos de capitalização oferecidos pelas seguradoras voltam a dar vida aos negócios das companhias com um crescimento de 23,3% no primeiro trimestre deste ano em relação a igual período de 2023. O mercado está animado pela oferta de novos produtos, que começou em outubro do ano passado, após um longo período de baixas taxas de juro.
Verificando a oferta de produtos disponível nos sites das seguradoras com maiores crescimentos no primeiro trimestre deste ano pode confirmar-se o que se alterou.
A inovação começou com as seguradoras a oferecer produtos com rendimento garantido e assegurar o capital investido tornou-se um standard. Já este ano, a GamaLife arrisca garantir uma taxa anual de rendimento de 1,3% durante seis anos. A Real Vida assegura um rendimento de 3,5% este ano indexando futuros rendimentos a 70% do valor da Euribor com mínimo de 0,25% e um máximo de 5%. A Ocidental, do Grupo Ageas Portugal, tem um produto que dá 2,75% em 2024, acrescido de uma participação nos lucros dos investimentos realizados. O BPI Vida e Pensões oferece 2,2% por ano a quem se mantenha 5 anos e um dia com um dos seus produtos.
No entanto, este crescimento foi de apenas 6,1% nas vendas destes produtos pelos bancos, quem fez este destaque foram outros canais em que predominam agentes e corretores que cresceu 75% neste tipo de produto. De qualquer forma, estes produtos, tal como os PPR, são mais fáceis de vender por bancos, e continuam a ser estes a significar dois terços do valor vendido em produtos financeiros de seguradoras. Os seguros de Vida Risco, excluídos desta análise, estão essencialmente ligados ao crédito à habitação e ao consumo e só pagam indemnizações em casos de morte e invalidez das pessoas seguras. Não são produtos de investimento ou de poupança, estão apenas ligados a risco.
Na área da poupança, a inversão da tendência de venda de seguros financeiros está a decretar o fim de um longo período de quebra de interesse dos investidores. Em 31 de março os valores da carteira Vida de todas as seguradoras agregadas indicava um valor de 32,8 mil milhões de euros, menos 20% do que há 10 anos. Se ajustado pela inflação, com fonte INE, os 41,8 mil milhões de euros de 2014 seriam hoje 46,6 mil milhões de euros, mais 42% do que realmente se verifica.
Este indicador de valores da Carteira Vida, divulgado pela APS, “são o saldo das contas dos produtos financeiros em vigor (PPR, produtos de capitalização e operações de capitalização)”, explica o atuário Luis Portugal, CEO da Atuarial, acrescentando que “as pessoas contribuem com prémios e parte destes capitaliza e dá o valor acumulado apresentado”. Assim o valor da carteira Vida aumenta com as entradas de capital por parte dos segurados e com os rendimentos do período anterior e diminui com resgates e com os reembolsos de capital quando atingem a data de vencimento.
As entradas de capital foram atormentadas nos últimos dez anos. Entradas menores que saídas, pandemia Covid-19 e até a invasão da Ucrânia trouxe desvalorização geral das carteiras de investimento.
Fonte do mercado explica que “do lado da produção, verificou-se uma elevada redução em 2019 e 2020 e isto deveu-se sobretudo ao aumento da concorrência dos depósitos a prazo e dos certificados de aforro” e acrescenta outro motivo, o “das prioridades estratégicas dos bancos, os principais distribuidores dos seguros financeiros”. Neste ponto, outra fonte, ligada a uma grande seguradora Vida, refere que “a partir de 2022 e até setembro de 2023 estes produtos tiveram um grande declínio pelas condições de mercado, inclinação da ‘curva de rendimentos’ (que compara rentabilidade de aplicações em diferentes prazos de vencimento), certificados de aforro e a vontade do banco em ter o dinheiro em depósitos a prazo”.
As taxas de juros oferecidas pelos Certificados de Aforro emitidos pelo Tesouro, estiveram na moda durante alguns meses do ano passado oferecendo taxas superiores a 3%, ao mesmo tempo que os juros oferecidos pelos empréstimos dos bancos subiam e a remuneração dos depósitos a prazo e à ordem estagnava em valores baixos. Não havia interesse dos bancos em vender seguros ou, como dizia alguém no mercado, “as margens bancárias eram superiores às comissões de venda dos produtos seguradores”, o interesse era pouco.
Do lado dos sinistros, indemnizações e outros pagamentos, verificou-se um aumento sobretudo em 2020 e 2021. Parte destas saídas resultou de vencimentos de carteiras de taxas elevadas, baseados em divida soberana portuguesa, comercializados pela maior parte das seguradoras em 2011 e 2012 (8 anos antes) e que “aproveitaram a crise de dívida pública dessa altura”, afirma outra fonte. Os vencimentos ocorreram após 8 anos porque é o prazo standard deste tipo de seguros ou seja, o prazo para maximizar o benefício fiscal. No entanto, Nelson Machado, administrador do Grupo Ageas para o ramo Vida, comentou que “até 2021 não tivemos declínio e conseguimos substituir produtos tradicionais por produtos com exposição ao mercado”, ou seja, os unit link, são produtos ligados a fundos de investimento, em que o risco do investimento corre do lado do segurado e que obtiveram bons resultados na maioria dos casos.
Quando o risco está do lado das seguradoras, o cenário é diferente. “A imobilização de capital pelas companhias é muito significativa nos produtos tradicionais capitalização e PPR e quase nulos nos produtos unit link abertos e fechados”. Esta afirmação traduz que, também para as companhias, o interesse em lançar seguros de capitalização e PPR era muito relativo, os ganhos são reduzidos: “na enorme maioria dos casos não há comissão de subscrição, a de gestão é a fundamental e a de resgate só costuma acontecer nos primeiros anos”, confirma. Depois há os rendimentos de investimentos: “sim, nos produtos tradicionais de capitalização e PPR há parte do retorno que é dos clientes e outra parte da companhia”, explica acrescentando que “só a partir de 2022 os rendimentos o permitiram pagar, até aí, com as taxas de juro negativas, a rentabilidade era nula”, conclui.
Também de referir que os PPR, desde sobretudo da pandemia, passaram a ter muito maior liquidez com a inclusão na lei de outros motivos de levantamento e que aumentou naturalmente o volume de sinistros. De resto esta facilidade de resgatar os PPR já tinha degradado muito a qualidade do produto enquanto investimento. Nelson Machado já aponta para o futuro. Incentivos fiscais acrescidos “para a verdadeira poupança de longo prazo em que só haja liquidez na reforma”, exemplificando que podia ser este o caso do futuro PEPP, o PPR europeu, já que o atual PPR está completamente desvirtuado.
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