O vento não está de feição

Há um processo judicial em curso por causa dos CMEC, António Mexia é arguido e agora a OPA sobre a EDP Renováveis falhou os objetivos.

António Mexia falhou a Oferta Pública de Aquisição (OPA) sobre a EDP Renováveis, comprou apenas 5% dos 22% disponí­veis e, assim, a companhia eólica vai continuar em bolsa, com um free-float da ordem dos 18%. É claro que os fundos que não venderam ficam agarrados a uma ação que vai perder (a)tração, e liquidez. E isso não é propriamente uma vitória… a não ser que antecipem novos movimentos de consolidação a curto/médio prazo.

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Os ventos não estão a correr de feição à EDP e a António Mexia em particular. Mas também aos principais acionistas da empresa, os chineses da China Three Gorges e os americanos da Capital Group. A discussão em torno das rendas excessivas, dos chamados CMEC, não é de hoje, remonta de forma mais assertiva a 2010 e agravou-se com o governo de Passos Coelho e do secretário de Estado Henrique Gomes que acabou por cair, e o próprio diz que foi por causa da EDP.

A verdade é que o ministro Ví­tor Gaspar impôs a sua vontade, o corte de ‘rendas’ foi limitado e o Estado vendeu mais uma parte do capital por 2,7 mil milhões de euros, também com base nestes contratos que, agora, estão sob investigação judicial. E, tendo em conta o que até agora é público sobre o caso, foram os sucessivos governos desde 2007 os principais beneficiários dos CMEC, das rendas excessivas que pesam na fatura mensal do consumidor português, porque foi isso que permitiu as sucessivas operações de privatização com encaixes de milhares de milhões para o Estado.

António Mexia, presidente da EDP, e Manso Neto, presidente da EDP Renováveis, são dois dos arguidos neste processo e, desde o dia em que a investigação foi conhecida, a EDP perdeu cerca de 500 milhões de euros de valor em bolsa. E já tinha perdido mais, mas recuperou. E o primeiro-ministro já disse ao país, em pleno Parlamento, que as empresas de energia, e a EDP em particular, são “manhosas”. Leu bem, foi mesmo dito em Portugal, não foi num qualquer paí­s em transição para a Democracia, nem sequer para a ditadura. E neste segundo semestre do ano, há renegociação dos CMEC para os próximos dez anos…

Os principais acionistas da EDP, através do Conselho Geral, juram fidelidade a Mexia, mas sabe-se como estas promessas valem até ao dia em que deixam de valer. Os acionistas querem valor, e querem um gestor que lhes entregue isso sob a forma de dividendos. No final deste ano termina o mandato atual da administração da EDP e, nas últimas semanas, foi noticiado — e desmentido, como tinha de ser — uma possí­vel fusão entre a espanhola Gas Natural, controlada pelo grupo La Caixa, que acabou de tomar conta do BPI, e a EDP. As fusões e aquisições são verdade no dia em que se anunciam. Até lá são sempre uma mentira dos jornais.

Quem tem interesse nesta fusão? A Gas Natural precisa mais da fusão, que na verdade seria uma compra, do que a EDP. Os espanhóis precisam de uma mudança, querem o que a EDP tem, o negócio eólico, a EDP Renováveis, e não podem crescer em Espanha, por isso só lhes sobra a EDP. Para António Mexia, poderia ser uma saída airosa, se convencesse, primeiro, os acionistas chineses, depois o Governo (e sobretudo este Governo, que mete a mão em todos os negócios privados, quanto mais num que levaria a sede da EDP para Barcelona). Ao ‘annus horribilis’ de 2017, poderia suceder um ‘annus mirabilis’ de 2018, isto se se livrar, claro, do processo judicial. Para a EDP, essa, as vantagens estão por perceber, e para os consumidores portugueses também. Passaria a integrar um grupo espanhol, com sede em Espanha, com um acionista espanhol de referência, um chinês e um americano. E com um CEO português. O que é que isso vale? Não sabemos. Ainda.

O desfecho da OPA sobre a EDP Renováveis tem este quadro de fundo e talvez isso explique porque é que fundos com fôlego e tempo decidiram rejeitar uma oferta, mesmo com o risco de passarem a deter ‘papéis’ da EDP Renováveis e não ações. Muitas movimentações, muitos rumores e um segundo semestre do ano decisivo para a EDP tal qual a conhecemos hoje e para António Mexia, o último dos gestores-estrela do paí­s.

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