António Costa e Bruno de Carvalho: Varões de Plutarco

José Miguel Júdice analise no Jornal das 8 da TVI o que uniu António Costa e Bruno de Carvalho na última semana: O medo. E elogia a primeira boa semana de Rui Rio.

O método das Vidas Paralelas de Plutarco parece-me que ajuda a perceber a razão das coisas; por isso o vou voltar a usar. Desta vez, quero comparar António Costa com Bruno de Carvalho. E, de novo, é evidente que são diferentes.

Bruno de Carvalho criou de si a imagem de um homem forte, agressivo, violento, sem papas na língua, que pretende quebrar os consensos supostamente podres, que quer mudar as coisas. Uma espécie de Trump sem cabelo louro. O que não significa que não tenha fraquezas e amizades.

António Costa, pelo seu lado, é todo melífluo, sempre sorrisos, procura não ser agressivo, tenta não fazer inimigos mais do que fazer amigos. Isto não quer dizer que não saiba ser violento e que não tenha “killer instinct”: Nunca chegaria onde chegou sem isso…

Mas vejamos os dois acontecimentos que motivam a comparação: o conflito com os jogadores do Sporting após a derrota com o Atlético de Madrid e os subsídios do Estado à Cultura. Aí se revela o que têm de comum: ambos cederam em toda a linha quando confrontados com uma resistência que não antecipavam, pelo menos na sua dureza e dimensão. Porquê? Por causa do medo.

Não me interpretem mal. Ter medo é a reação natural do ser humano e de qualquer outro animal. O medo faz-nos fugir de um perigo excessivo, e sem esse instinto básico nenhuma espécie teria resistido aos desafios.

Vivemos a glorificar os heróis, que nos ensinam o valor da coragem (que não é um instinto, apenas um adquirido cultural que se tornou um elemento essencial da hominidade). Mas devíamos agradecer a todos os medrosos que fugiram ao longo dos séculos, pois, sem eles, talvez nem eu nem os que me ouvem se calhar existiríamos.

Imaginemos que António Costa e Bruno de Carvalho não tinham reagido com medo. O Sporting teria sido destroçado pelo Paços de Ferreira e teria ficado definitivamente arredado do 2º lugar e da ténue esperança de ir à Champions (e o Presidente seria culpado disso pelos adeptos e teria de se demitir). E se Costa não tirasse da cartola uns milhões de euros, o Governo veria crescer a onda de descontentamento dos agentes culturais (que são muitas vezes líderes de opinião), com efeitos nefastos sobretudo à sua esquerda, comprometendo a hipótese da desejada maioria absoluta.

Se fossemos apenas animais irracionais (alguns de nós parecem ser quando se trata de futebol e política…), a história acabava aqui. Mas não somos, e a evolução cultural adquirida mudou em grande parte a nossa relação ética com o medo.

E por isso é que – deixemos agora Bruno de Carvalho em paz, embora seja curioso que esteja agora a fugir do medo, podendo assim lixar tudo – o visível medo de António Costa, que nasceu de uma natural reação instintiva primária, foi politicamente um erro. E porquê?

Em primeiro lugar, porque a mensagem que passou é que a solução para os problemas é despejar dinheiro em cima deles. Todos os grupos de interesse ficaram informados. Depois, porque com isso – como aliás é natural – os agentes culturais não vão parar nem acalmar. Cheiraram o medo, como dizem que os cães também conseguem. E não tendo António Costa fugido (é isso que o instinto de sobrevivência determina) fica mais vulnerável. Finalmente, porque pelo caminho ficou fragilizado perante os seus apoiantes. Sinais disso? O secretário de Estado Miguel Honrado não hesitou em desmentir o primeiro-ministro quando este, para se proteger, mandou dizer que foi surpreendido pela situação. E, logo a seguir (estas modas pegam-se…), o líder do Montepio Tomás Correia de novo o desmentiu (pelo cauteloso silêncio em todo o caso…) deixando viva a tese de que foi S. Bento que lhe enviou um investidor chinês. E o facto de Costa ter desmentido algo que seria normal também é muito revelador.

Honrado está seguramente lixado, mas o mal está feito. A perceção do medo do primeiro-ministro libertou coragens. Má semana para António Costa, não há dúvida.

Rui Rio contra os impostos?

Essa má semana contrasta com a primeira boa semana de Rui Rio desde que ganhou a liderança do PSD.
E porquê? Por três razões.

  1. A primeira é quase irrelevante. Correu-lhe bem o Conselho Nacional no Porto. Isso é normal, pois os seus adversários não têm pressa.
  2. A segunda já é mais interessante. Rio não se meteu no tema dos apoios à cultura. Fez bem. É conhecida a sua posição (“quando ouço falar de cultura, puxo logo da calculadora”) e, por isso, quanto mais calado estiver nestes temas, melhor. Em todo o caso, o silêncio é mais estratégico do que pensaria, pois esta semana também disse que não são as oposições que ganham eleições, são os governos que as perdem. Este tema fica para uma próxima oportunidade, quando falar de políticos que se tornam comentadores.
  3. A terceira razão é bem mais importante. Numa conferência, o líder do PSD disse claramente que quando se atingir o equilíbrio das contas públicas (que o Governo anuncia para 2019), a opção deve ser começar a baixar impostos em vez de ser reforçar a despesa pública. E essa é uma clara divergência com o PS.

Temos aqui o que pode ser uma forte guinada estratégica do PSD que pode nela construir uma clara contraposição ao PS e ao mesmo tempo colocar ao Governo um dilema.

Porquê? Porque os impostos aumentaram como nunca (apesar de Costa o negar com a desfaçatez que lhe dá a sensação de impunidade), como bem afirmou Assunção Cristas, e por isso o tema vai continuar a ser sensível. E porque a geringonça quer, evidentemente, que os excedentes sejam usados para aumentar salários no Estado (o que Centeno quer evitar) e consumos intermédios – o que ajuda as clientelas – e potenciar o investimento público (bem menos útil macroeconomicamente do que o privado).

Se a direita não largar este osso, Costa vai ter o dilema das opções, pois não será difícil à direita ir a eleições com um programa para quatro anos de redução dos impostos, que agradará à sociedade civil, às classes médias urbanas, aos trabalhadores por conta de outrem, aos prestadores de serviços e aos empresários médios.

E com isso, a vida fica mais difícil para os socialistas. Veremos, em breve, se a luta pela redução de impostos vai ser mantida pelo PSD, mas para já parece estar a iniciar uma nova fase da oposição.

O cantinho das tontices

Tenho ouvido queixas por não estar a falar das tontices por vezes ridículas, por vezes também graves, que aliás são abundantes no nosso querido Portugal. Para me redimir, hoje tenho duas (além da mudança estratégica de Rio a ser verdade).

A primeira é a tontice do PSD estar a lutar contra a entrada da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa no Montepio e um peso pesado da equipa de Rio (um tal António Tavares) estar a levar a Misericórdia do Porto a entrar. Com pouco dinheiro é certo, mas com base numa avaliação absurda e por isso cometendo o erro que se critica. Claro que vai ser Presidente da Assembleia Geral, mas não deixa de ser uma estupidez política.

A segunda tem a ver com a Polícia. O DN revelou há dias que há 16 sindicatos diferentes na PSP, três deles com mais dirigentes do que filiados, e que por causa disso 36 mil dias de trabalho são pagos anualmente pelos nossos impostos para sindicalistas andarem a fazer sabe-se lá o quê! Esta bandalheira (não encontro palavra mais adequada) mantém-se porque os senhores deputados não são capazes de decidir alterar as condições para a sua manutenção.

Preocupa-me também que isto esteja a acontecer por todo o lado. Claro que é seguramente melhor ser dirigente sindical e folgar, em vez de patrulhar. Mas não pode valer tudo…

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