Duzentos ex-políticos acumulam, sem limite, subvenções vitalícias e reformas

  • ECO
  • 17 Junho 2019

Uma falha na lei permite que centenas de ex-políticos continuem a receber sem limite, subvenções vitalícias e reformas. Juízes falam em "enredo" legal que deve ser esclarecido.

Há uma falha na lei que está a permitir, há várias décadas, que ex-políticos acumulem, sem limite, pensões mensais vitalícias com pensões de reforma ou aposentação. Em causa está uma lei que remeteu durante vários anos para uma legislação que estava, afinal, revogada. O alerta está numa auditoria do Tribunal de Contas (TdC), com mais de um ano, que aconselha o Parlamento a esclarecer a legislação.

No final de novembro do ano passado, de acordo os números adiantados pelo Ministério do Trabalho à TSF, existiam 322 beneficiários de subvenções mensais vitalícias para antigos políticos, dos quais 216 tinham uma acumulação de “pensão+subvenção” superior ao salário do cargo de ministro (o valor considerado limite, mas que esteve revogado durante oito anos).

O Parlamento acabou em 2005 com as subvenções mensais vitalícias, mas a história já leva décadas. Em junho de 1987, o Parlamento alterou o Estatuto Remuneratório dos Titulares de Cargos Políticos, prevendo um “limite” para o conjunto “subvenção mensal vitalícia+pensões de aposentação ou de reforma”. O problema é que esse limite, equivalente ao ordenado de um ministro, estaria previsto em dois decretos de lei que tinham sido revogados quinze dias antes.

Ou seja, continuou a estar previsto um limite, mas o valor desapareceu da legislação, e esta falha durou oito anos (até 1995), quando uma nova lei voltou a colocar como limite o ordenado do ministro. Mas, ainda hoje há consequências. Isto porque, quem já tinha direito à subvenção vitalícia sem limite continuou a ter esse direito, disse o TdC à TSF.

Problema passou despercebido até 2014

Esta falha na lei passou despercebida até 2014, altura em que a Secção Regional da Madeira do TdC avaliou as subvenções vitalícias pagas aos deputados regionais e concluiu que o legislador sempre quis aplicar um limite e que este devia ser o que está nos decretos de lei revogados: a remuneração dos ministros.

Só entre os antigos deputados regionais madeirenses existiam, em 2011, 16 a beneficiar deste vazio, recebendo, em conjunto, mais 180 mil euros por ano do que deveriam receber se o limite do ordenado de um ministro fosse aplicado.

Foi assim que, no ano passado, o TdC avançou com uma auditoria a este assunto, e aconselha agora o Parlamento a esclarecer a legislação para que não restem dúvidas. Na mesma auditoria, o regulador dá razão à interpretação que a Caixa Geral de Aposentações (CGA) faz da lei, mas classifica-a de “complexa”. “Estamos perante um limite estabelecido mas não quantificado e, por isso, impossível de efetivar”, defende a auditoria, citada pela TSF.

Considera-se de toda a utilidade que a matéria em apreço seja objeto de clarificação, por via legal, por forma a não subsistirem possíveis dúvidas de qual a norma aplicável quanto à sujeição ao limite na acumulação da subvenção mensal vitalícia com pensão de aposentação ou reforma”.

Isto porque, explica o TdC, o Parlamento extinguiu a figura da subvenção mensal vitalícia em 2005, mas “podem ainda existir titulares de cargos políticos em situação de elegibilidade para requererem o direito à subvenção”.

Fonte oficial do gabinete da presidência da Assembleia da República (AR) disse à TSF que auditoria foi encaminhada para a Comissão de Orçamento, Finanças e Modernização Administrativa. Contudo, recentemente, a presidência do Parlamento detetou que, afinal, a auditoria nunca tinha sido enviada à AR, tendo-a requerido ao TdC que a encaminhou rapidamente pelas vias formais. O Parlamento vai começar, agora, a avaliar se vale ou não a pena clarificar a lei.

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