A revolução 4.0. trouxe consigo novas formas de trabalho. Nem sempre a legislação acompanha as alterações e o job sharing é um exemplo disso.
O job sharing, o recente fenómeno do século XXI, é uma forma de flexibilidade laboral que facilita a conciliação entre a vida profissional e pessoal. Pelo mundo cada vez mais são contratados trabalhadores a tempo parcial partilhando o mesmo posto de trabalho, de forma a que somando as suas horas perfaçam o tempo exigido a um trabalhador com uma jornada laboral completa.
Esta realidade ainda não é legislada por grande parte dos países. O Reino Unido, Hungria, Eslováquia e Itália são alguns exemplos de territórios que assumiram os avanços laborais e adotaram a sua legislação. Nestes países europeus os contratos estipulam o número de horas e as tarefas de cada empregado. No caso de um deles adoecer e solicitar baixa médica, o outro é obrigado a substituir o seu companheiro de posto de trabalho.
Portugal ainda assim continua com uma legislação laboral “bastante conservadora no que diz respeito à flexibilização das relações laborais e à adoção de qualquer modelo organizacional de trabalho que ponha em causa o princípio da estabilidade”, refere Pedro Antunes, sócio do departamento de laboral da CCA.
“Caso o país sinta interesse em aderir ao modelo do job sharing como modelo possível, já estaria, de facto, atrasado”, assegura Rui Valente, sócio laboral da Garrigues. O advogado aponta ainda que o tema não tem estado na “ordem do dia” dos partidos com representação parlamentar o que provoca o atraso legislativo. Mas qual é realidade normativa portuguesa nesta matéria?
Recentemente o legislador nacional levou a cabo uma revisão do código laboral, mas uma vez que o intuito era o combate à precariedade, esta modalidade de flexibilização das relações laborais não foi discutida.
“Atendendo que nos encontramos num período em que a taxa de desemprego atingiu mínimos históricos, possivelmente o legislador não sentiu a necessidade de promover o job sharing”, nota Joana Carneiro, advogada em direito laboral e sócia da JPAB – José Pedro Aguiar-Branco Advogados.
Atendendo que nos encontramos num período em que a taxa de desemprego atingiu mínimos históricos, possivelmente o legislador não sentiu a necessidade de promover o job sharing.
Em países como a Irlanda, o regime de job sharing é legislado através de convenções coletivas. Mas para o sócio da Garrigues, Rui Valente, não é viável que a “contratação coletiva preveja algo que a lei não regula, nem autoriza”. Posição que o sócio da CCA, Pedro Antunes, partilha. “Na Irlanda, o contexto era diferente, porquanto ainda que as convenções coletivas não o previssem anteriormente, a realidade jurídica laboral quotidiana já conferia expressão à realidade e, ao contrário do que sucede em Portugal, urgia uma regulamentação desta prática. Essa regulamentação veio a ser alcançada, precisamente, por via da contratação coletiva”, nota o sócio.
E se quiser contratar trabalhadores em regime de job sharing?
Apesar de não estar regulamentado, as empresas podem sempre recorrer ao regime do contrato de trabalho a tempo parcial. Rui Valente apresentou um exemplo, “contratar dois trabalhadores a tempo parcial que ocupem sucessivamente o mesmo posto ou equacionar modalidades de isenção de horário de trabalho – mas sem que daí possa resultar uma implementação “tal e qual” do modelo do job sharing”.
O trabalho a tempo parcial pode ser horizontal e vertical. No primeiro o “trabalhador labora todos os dias da semana mas o número de horas por dia é reduzido”. Por outro lado, no trabalho parcial vertical, “o trabalhador não labora todos os dias da semana, por mês ou por ano, o que torna o seu conceito próximo da modalidade de trabalho intermitente alternado”, explica Joana Carneiro, da JPAB.
Qual o futuro do regime de job sharing em Portugal?
Segundo Rui Valente, sócio da Garrigues, as possíveis futuras alterações só surgirão se advierem da “progressiva regulamentação do tema nos demais Estados-membros da União Europeia” e se os “millennials” assim o exigirem.
Já a perspetiva da advogada da JPAB é que para Portugal será mais vantajoso explorar as formas de trabalho existentes e proceder a “pequenas alterações legislativas” de forma a facilitar a implementação e adequá-las à necessidade da empresa. “Damos como exemplo a legislação relativa ao teletrabalho, que tende a ser a forma que mais evoluirá e que terá maior aplicabilidade prática no futuro, por causa dos avanços tecnológicos que permitem que o trabalho seja executado à distância, a partir de qualquer local com acesso à internet, e sem o controlo direto do empregador”, demonstra Joana Carneiro.
Os desafios do legislador podem ser variados no momento de elaboração de normas que regulem esta matéria. “As principais dificuldades estarão relacionadas com a aplicação de regimes específicos próprios do contrato de trabalho, como por exemplo o regime das faltas e licenças, mas também, ao nível da própria forma de avaliação de performance individual dos trabalhadores que prestem trabalho neste regime”, explica Pedro Antunes. O sócio da CCA acrescenta ainda que a “partilha de direitos do trabalhador” poderá também levantar dificuldades jurídicas no futuro.
As principais dificuldades estarão relacionadas com a aplicação de regimes específicos próprios do contrato de trabalho, como por exemplo o regime das faltas e licenças, mas também, ao nível da própria forma de avaliação de performance individual dos trabalhadores que prestem trabalho neste regime.
Na opinião de Joana Carneiro, as dificuldades centrar-se-ão em conhecer “bem a figura e perceber quais as respetivas vantagens e diferenças em relação às figuras que já se encontram previstas em Portugal”. A sócia da JPAB evidenciou ainda a importância em avaliar os “riscos e prejuízos” para o trabalhador, “sob pena deste ficar mais prejudicado do que ficaria com a utilização das figuras já previstas na lei”.
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Job sharing: uma revolução laboral?
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