Será o setor financeiro a salvação?

É relevante termos presente que nos últimos meses bancos como o Credit Suiss e o Goldman Sach assumiram compromissos drasticamente diferentes das suas praticas usuais.

No World Economic Forum (WEF) deste ano muito se falou de clima, transição energética e Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável. António Guterres, secretário-geral das Nações Unidas e o Príncipe Charles do Reino Unido, apelaram a uma só voz a necessidade de todos, Estados, empresas e pessoas agirem já.

Temos 10 anos para fazer a transição energética, temos 10 anos para conseguir alterar o nosso modelo económico, sob pena de, se nada fizermos, virmos a sofrer fortes impactes ambientais que terão consequências financeiras, humanas, urbanísticas, de saúde, entre muitas outras.

Num dos debates do WEF sobre Economia verde, a moderadora começa a conversa perguntando “para atingir a economia verde, o que temos de deixar de ter?”. Felizmente o primeiro interlocutor do debate foi Francine Lacqua, diretora executiva do Green Peace, que começou por dizer que a pergunta estava mal feita, e que, tendo em conta as implicações futuras decorrentes da inércia atual em nos afastarmos de uma economia com base em combustíveis fósseis, a pergunta deveria ser “O que é que nos impede de aceleramos esta mudança?”.

Segundo, Andrew Liveris, Administrador da Saudi Aramco, o que falta “É um alinhamento, vontade e propósito de todos os grupos envolvidos de trabalharem em conjunto para fazer essa mudança acontecer”.

E de facto, faz sentido refletir porquê que é tão difícil fazer com que se deixe de investir na economia assente nos combustíveis fósseis. Sabendo nós que, o mundo ao caminhar para a neutralidade carbónica na segunda metade deste século, e a Europa até 2050, vai originar nova legislação, limitações, proibições e uma política fiscal verde que penalizará os mais poluidores, o que impede os gestores de serem mais rápidos no processo da transição energética? A crença de que o mercado ainda valoriza os combustíveis fósseis, e por isso vamos manter a atividade até conseguir maximizar as mais-valias ainda existentes no mercado? A crença de que não vai existir legislação? A crença de que, o que quer que aconteça, “já não estarei aqui para sentir o impacte?”.

Por vezes penso que só há dois tipos de racionais que podem, de facto, acelerar esta transição, sem free riders e sem oportunistas. O racional do respeito pelo outro, de fazer o bem e o que é certo, e por isso, como gestor, também se toma as decisões moralmente certas tendo em conta o quadro de referências éticas e humanistas universais atuais. Ou o racional da prevenção e minimização do risco, onde se reconhece que a probabilidade de perdas elevadas num futuro próximo é tão elevada, que faz sentido estrategicamente tomar decisões dramaticamente diferentes da maioria do mercado e das que tinham sido tomadas anteriormente.

Paul Polman, ex-CEO da Unilever, e agora co-vice Chair do UN Global Compact, fez em setembro passado no SDG Business Fórum no âmbito da Nações Unidas um discurso brilhante e que evidencia o racional ético que é necessário ter para acelerar a mudança. Mas como o mundo parece estar numa fase de carência de praticantes de ética, Paul Polman tem tido pouca companhia. O ser humano esqueceu-se de ser humano. Temos de reaprender.

Ao nível do racional associado à elevada probabilidade de perdas no futura próximo, é relevante termos presente que nos últimos meses bancos como o Credit Suiss e o Goldman Sach assumiram compromissos drasticamente diferentes das suas praticas usuais. O Crédit Suisse, decidiu que que não vai promover nenhum tipo de financiamento especificamente relacionado com o desenvolvimento de novas centrais a carvão.

O Goldman Sachs também afirmou terminar com financiamento direto à exploração de minas de carvão, centrais térmicas a carvão novas ou em expansão em todo o mundo, bem como com o financiamento direto a novas explorações e produção de petróleo do Ártico. Além disso, o banco também se comprometeu com a eliminação progressiva do financiamento a empresas de mineração de carvão térmico que não possuem uma estratégia de diversificação. Esta política assume o com compromisso explícito de eliminar progressivamente o investimento ao “carvão”, não apenas a redução.

Eu preferia termos mais seres humanos preocupados com os outros seres humanos. Preferia que fossemos mais como o Paul Polman. Seríamos pessoas mais felizes e seres humanos mais completos, e isso faria muito bem à humanidade. Mas atendendo a que só temos 10 anos, é bom mesmo que comecemos a acreditar que muita gente, agora passiva, vai perder muito dinheiro, e que será o banqueiro mais capaz de se adaptar à mudança que será vencedor.

  • Economista especializada em sustainable and climate finance

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

Será o setor financeiro a salvação?

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião