“Deficiências” no financiamento da ANAC comprometem “independência” e “isenção” do regulador da aviação, diz Tribunal de Contas

Regulador da aviação civil financiou-se quase totalmente, entre 2015 e 2017, através de taxas de segurança. Foram arrecadados 159 milhões, mas o Tribunal de Contas alerta para cobranças indevidas.

O Tribunal de Contas (TdC) encontrou “deficiências” no financiamento da atividade reguladora da aviação civil exercida a Autoridade Nacional da Aviação Civil (ANAC) entre 2015 e 2017. As irregularidades, identificadas no relatório de auditoria divulgado esta terça-feira, comprometem a independência e isenção da entidade reguladora.

A ANAC financiou-se em 168 milhões de euros nos três anos em questão, dos quais 95% dizem respeito à taxa de segurança (equivalente a 159 milhões), que constitui uma contrapartida dos encargos gerais da ANAC e das forças de segurança com serviços afetos à segurança da aviação civil.

“Porém, essa taxa (que engloba as duas componentes) abrange indevidamente, desde 2013, a contraprestação por serviços distintos prestados por entidades diferentes (ANAC, forças de segurança e entidades gestoras aeroportuárias) no exercício de competências diversas que, como tal, deveriam ser remunerados com receitas também diferenciadas”, explica o TdC. “Dessa situação resultam deficiências importantes, com destaque para o desrespeito do princípio orçamental da unidade e universalidade”.

Este princípio, determinado pela lei de enquadramento orçamental, é desrespeitado devido à omissão, nas contas públicas, da receita e da afetação (por despesa) da parte da taxa de segurança que é atribuída à ANA – Aeroportos de Portugal, que é uma empresa privada desde 2013. A estimativa do tribunal é que a omissão seja de 157 milhões.

Em sentido contrário, as receitas que deveriam financiar o regulador não dão qualquer contributo. “O produto da taxa de segurança atribuído à ANAC, como receita própria, não corresponde a contrapartida pelo exercício das suas competências setoriais de regulação, supervisão e inspeção, contrapartida essa, aliás, que não gerou qualquer receita até 2018, não obstante os Estatutos da ANAC a destacarem como primeira e principal fonte de financiamento”, acrescenta o TdC.

O tribunal critica ainda a ANAC por não discriminar custos regulatórios, diretos e indiretos, suportados pelas entidades reguladas, pois considera que a omissão revela que a entidade reguladora desconhece quanto custa aos regulados cumprir com as exigências regulatórias que lhes impõe. Assim, fica por avaliar o impacto dos custos de regulação no setor regulado e nos consumidores.

O TdC conclui assim que o financiamento da atividade reguladora da aviação civil entre 2015 e 2017 “enfermou de deficiências que constituem reservas importantes e suscitam crítica por afetarem a independência do regulador, ao não ter sido financiado com receitas cobradas pelo exercício da atividade reguladora, mas pelo serviço prestado por forças de segurança” e “não garantiu a regulação robusta, isenta e independente considerada urgente pelo legislador (no preâmbulo dos Estatutos da ANAC) quando assumiu não ser essa a realidade, por força de insuficiências estatutárias e orgânicas do Instituto Nacional de Aviação Civil (INAC), verificando-se que tal realidade se manteve, no essencial, até 2018″.

Face a estas conclusões, o tribunal faz uma série de recomendações ao Governo e à própria ANAC. Ao Governo aconselha que assegure a implementação do modelo de financiamento estabelecido pelos estatutos, que altere a regulação da taxa de segurança, que habilite e nomeie entidades públicas administradoras das taxas, que assegure a contabilização nas contas públicas, designadamente no Orçamento e na Conta Geral do Estado, destas taxas classificadas como receitas públicas com caráter obrigatório, bem como que corrija e previna as “demais situações geradoras de deficiências na gestão da ANAC”.

Já para o regulador, recomenda a implementação de uma reestruturação organizacional, a quantificação e segregação (através de contabilidade específica com registo autónomo) dos custos dos serviços prestados aos regulados, tal como a quantificar e divulgação dos custos regulatórios suportados pelo regulados. O TdC pede ainda à ANAC para “atualizar, aprovar e aplicar o plano de gestão de riscos de corrupção e infrações conexas, bem como o código de conduta“.

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