Farmacêuticas: Gerir novos riscos para conseguir sobreviver

  • José Miguel Batista
  • 5 Abril 2020

José Miguel Baptista, Head of Risk Management da Willis Towers Watson Portugal, analisa as ameaças com que a indústria farmacêutica tem de conviver, sempre a pensar no longo prazo e em sobrevivência.

As empresas de todos os setores devem ter entre as suas prioridades a análise das circunstâncias e do meio ambiente e desenvolver medidas apropriadas para reforçar a sua viabilidade futura. No caso do setor farmacêutico, conhecer os riscos que enfrentam ou podem vir a enfrentar é ainda mais determinante, uma vez que se trata de um setor que, num mercado altamente competitivo, requer investimentos de longo prazo e com altas necessidades de I+D+i.

Falamos de um setor que necessita de longos períodos de investigação antes de conseguir obter autorização para o lançamento de um novo produto por parte das autoridades do medicamento, além de investimentos significativos para poder ratificar a sua viabilidade e segurança via investigação, desenvolvimento e execução de exaustivos ensaios clínicos.

A isto acrescentam-se outros fatores de risco no momento de analisar a viabilidade de uma empresa farmacêutica, como o tempo limitado da exclusividade do produto após o processamento de uma patente, o escasso apoio público ao investimento em novos produtos ou ao desenvolvimento de empresas de biotecnologia, o impacto dos novos regulamentos europeus sobre a segurança dos dispositivos médicos, a intersectorialidade da Administração Pública e da indústria farmacêutica, a resistência antimicrobiana, a pressão da crescente comercialização de medicamentos genéricos, o impacto do meio ambiente sobre o desenvolvimento de certas patologias ou o uso controverso de terapias alternativas em vez da medicina tradicional, apenas para dar alguns exemplos.

Estamos, portanto, perante um contexto em que os desafios que a indústria tem vindo a enfrentar não param de aumentar e tornar-se cada vez mais abrangentes, continuando a evoluir e a requerer novas ferramentas e protocolos de análise para poder conhecer, quantificar e enfrentar o risco. Ou seja, para poder estabelecer um plano de continuidade do negócio verdadeiramente eficaz.

A melhor maneira, na nossa opinião, de enfrentar a análise dos riscos deste tipo de indústrias é ter o que chamamos uma Mapa de Riscos de 360º, que permita analisar todas as situações complicadas que podem surgir em todas as áreas, como de âmbito jurídico, de reputação, ambiental, de gestão de pessoas, tecnológico e operacional. O modelo de trabalho envolve submeter todas estas áreas a uma matriz de medição de impactos e probabilidades, corrigida pela existência de controlos de risco ou através da proposta e execução, conforme os casos, de novos controlos. Desta forma, e com as atualizações apropriadas do Mapa, poderemos ter a qualquer momento uma visão real e projetável no tempo sobre a realidade do risco, sem nunca esquecer o possível surgimento de “cisnes negros”, como podem ser as pandemias, por exemplo.

Também é desejável num setor tão estratégico para as populações de todo o mundo preservar os riscos operacionais das empresas farmacêuticas, estabelecendo Planos de Continuidade do Negócio de forma a calcular os tempos em que diferentes processos (produtivos ou outros) podem ser interrompidos e como reativá-los antes que a situação se torne irreversível. Na nossa opinião, além das razões comerciais, a dedicação final dos produtos farmacêuticos exige o cumprimento dessa obrigação moral em favor dos cidadãos de um setor que respeita os mais elevados padrões de segurança nos seus produtos.

Medidas para uma correta análise do risco

Primeiro que tudo, é importante estabelecer e manter planos de contingência contra o risco que maior impacto tem no negócio: o reputacional. Para tal, é necessária uma análise que endereça os pontos em que possa ser necessário melhorar os processos produtivos ou de outra índole.

Outro ponto-chave é o investimento contínuo em investigação. A busca por novas patentes que substituam as que estão prestes a expirar, ou novos usos ou aplicações para as existentes, são aspetos fundamentais para enfrentar o risco inerente ao tempo limitado de exclusividade que proporcionam, como já mencionámos antes. Igualmente importante é identificar possíveis associações ou colaborações com empresas do mundo biotecnológico com o objetivo de diversificar e expandir a proposta de produtos ao mercado.

É também necessário prestar uma atenção especial à identificação de novos mercados a nível internacional, de forma a melhorar a margem de lucro dos produtos com baixa rentabilidade local – especialmente no que toca aos medicamentos genéricos -, assim como observar de perto as alterações legislativas que podem afetar a indústria farmacêutica. Nesse momento, a intervenção das associações do setor é essencial, propondo adaptações funcionais à transposição de diretrizes que pavimentem o caminho para os seus membros.

Também não nos podemos esquecer da dependência da interação com mercados externos, patente na respetiva Balança Comercial. Tal, terá que ser igualmente considerado nos Mapas de Riscos e Planos de Continuidade de Negócio, quer a empresa se dedique à produção ou distribuição de medicamentos, ou à produção de produtos farmacêuticos.

Claramente, as empresas da indústria farmacêutica, além do que foi referido anteriormente, têm que saber gerir os novos riscos que surjam no mercado para conseguir sobreviver. Analisar, quantificar e planear é mais do que essencial – é vital para a sua continuidade.

  • José Miguel Batista
  • Diretor de Enterprise Risk Management & Engineering da WTW

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