Contrapartidas Ambientais

As grandes empresas e as PME que recebem ajuda estatal deveriam ser obrigada a reportar a percentagem do seu volume de vendas, OPEX e CAPEX que é verde.

Algumas empresas e algumas famílias precisam de ajuda decorrente da crise do Covid 19. Não há dúvidas e é preciso ajudar. Faz sentido debater-se de forma séria o rendimento básico garantido, bem como todas outras formas que consigam ajudar as famílias impactadas a superar esta crise. No entanto há questões que, podendo agora não ser politicamente corretas, necessitam de ser faladas: a gestão de curto prazo e as contrapartidas pelo apoio às grandes empresas e PMEs.

Consigo compreender que muitas empresas tenham entrado em lay off com o Covid-19. Mas não consigo compreender que tantas grandes empresas e algumas PMEs não consigam ter cash flow para assegurar a continuidade da empresa por 3 meses, num contexto de redução drástica de vendas. Isto significa que muita da gestão empresarial é feita numa ótica de “cash in/cash out” e de descapitalização da empresa, existindo uma ausência de capacidade em valorizar a disponibilização imediata de capital para fazer face a imprevistos.

Na realidade, parece que muitas grandes empresas e algumas PMEs são geridas no pressuposto de que não há imprevistos, e que ter dinheiro em caixa não é uma opção inteligente. Tendo em conta que as próximas décadas vão ser imprevistas e instáveis, faz-me sentido que a gestão comece a considerar como boa prática gerir empresas de forma a que estas se “aguentem” sem lay offs durante alguns meses. Existem várias opiniões a suportar a ideia de que teremos mais vírus a invadir a vida humana, e que esta possibilidade está ligada às alterações climáticas. Como estamos à beira de uma crise climática, e de não retorno, então é melhor que as empresas comecem a gerir tendo em conta imprevistos.

O outro tema relevante são as contrapartidas ambientais que grandes empresas e PMEs poderiam dar à sociedade, por estarem a receber apoio do Estado. O mesmo se aplica aos bancos que recebem apoio Estatal. Esta não é uma ideia original minha. Já está a ser usada em vários países. Em França, o apoio dado à Air France tem como contrapartidas melhorias ambientais significativas, nomeadamente: baixar para metade as emissões de CO2 por passageiro até 2030, usar pelo menos 2% de fuel provindo de fontes mais sustentáveis até 2025, reduzir a concorrência com as opções de comboio, não podendo agora vender bilhetes a um preço mais barato do que o comboio quando a viagem de comboio dura menos de 2,5 horas.

No Canadá, as empresas que receberam ajuda estatal são obrigadas a reportar como estão a combater as alterações climáticas usando as recomendação da Task Force Force on Climate-related Financial Disclosures do Financial Stability Board, sendo também obrigadas a reportar como é que as suas operações futuras irão apoiar os objetivos ambientais e de sustentabilidade do País.

Em Portugal esta abordagem deveria também ser seguida. Todo o apoio à TAP deveria ter contrapartidas ambientais; os apoios às PMEs e grandes empresas deveriam ter associado a obrigatoriedade da empresa: em aumentar a sua eficiência energética; aumentar a percentagem de fontes de energia renovável no seu mix de consumo energético; aumentar a sua autossuficiência energética; de diminuir os seus resíduos e o consumo de matérias-primas virgens.

Para atingir estes objetivos possivelmente as empresas necessitam de mais capital, mas este poderia vir de um potencial Banco Verde público, que ajudaria as empresas a identificar os objetivos possíveis para cada uma, e emprestaria capital a taxas muito próximas de zero e por um longo período de tempo, em que os pagamentos das prestações começariam quando as poupanças energética começassem a existir. Seriam as poupanças que pagariam parte dos empréstimos numa primeira fase.

Isto necessitaria de uma agilização de procedimentos e uma simplificação na burocracia. Iria implicar uma mudança cultural de algumas instituições, mas teria um potencial impacte muito positivo ao nível dos objetivos ambientais que Portugal tem. Iria também promover o desenvolvimento do mercado associado à eficiência energética e renováveis em vários setores como a construção, imobiliário, industria, agricultura e prestação de serviços de baixo carbono.

Todas as empresas recebem ajuda estatal, Micro, PME e Grandes, deveriam ser obrigadas a reportar como é que estão a contribuir para os objetivos ambientais do País.

Por fim, as grandes empresas e as PME que recebem ajuda estatal deveriam ser obrigada a reportar a percentagem do seu volume de vendas, OPEX e CAPEX que é verde. Esta obrigatoriedade já vai acontecer para as grandes empresas a partir de 2022 decorrente de uma diretiva comunitária, mas quanto mais cedo se tiver consciência destes desafios, melhor para as empresas portuguesas.

  • Economista especializada em sustainable and climate finance

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