Recessão, Comércio Internacional e os Novos Incoterms ® – Reagir é fundamental

  • Miguel Ferreira
  • 24 Maio 2020

Miguel Ferreira, da Nacora - International Insurance Brokers, constata que a introdução de novos Incoterms ® apenas coincidiu com a crise e aconselha adaptação às empresas exportadoras portuguesas.

Num mundo novo, pós-Covid-19, há um caminho de expiação que as empresas terão de percorrer. Entender e enfrentar uma nova realidade e adotar medidas certas é o que vai definir a continuidade e o sucesso das empresas.

Se é verdade que há empresas que conseguiram explorar um nicho de mercado sedento de procura, derivado de uma conjuntura muito própria criada pelo vírus, através de uma afetação de recursos a uma necessidade premente da sociedade, como é o caso das máscaras, luvas e outros equipamentos de proteção individual, outras há que anseiam a retoma total da sua atividade para entenderem o real impacto desta crise sanitária.

As últimas projeções não nos podem deixar indiferentes. O FMI prevê uma recessão mundial de 3% em 2020 e uma recuperação de 5,8% em 2021. Relativamente a Portugal, segundo esta mesma Instituição, prevê-se uma recessão de 8% e uma recuperação em 2021 de 5%. Pela primeira vez na história assistimos a uma crise verdadeiramente global, sem exceções, havendo mesmo quem acredite que a Globalização, enquanto fenómeno, irá sofrer um retrocesso, ressurgindo teorias que esta crise sanitária poderia ter menor impacto num mundo menos globalizado.

Neste contexto, a importância da gestão de riscos, seja em termos macro ou micro, fica realçada, demonstrando que quem identifica os principais transmissores de instabilidade num mundo que não para de mudar poderão ser aqueles que sobrevivem. Um verdadeiro plano de contingência e uma correta transferência de riscos não devem ser menosprezados em qualquer setor de atividade.

Sendo esta crise sanitária global, afeta diretamente o comércio internacional, motor essencial para muitas empresas portuguesas. Num contexto de permanência de Covid-19 é necessário minimizar os riscos para que a navegação em mares incertos seja mais capacitada. É natural que haja quem procure novas formas de interação, novos modelos a adotar, mas estamos no momento da reação e não da reflexão, sob pena das empresas portuguesas perderem a linha de vida.

A revisão dos Incoterms ®: Novos conceitos a reter, escolher e aplicar

Coincidência ou não, o início da pandemia dá-se quase em simultâneo com a revisão dos incoterms ® pela International Chamber of Commerce (ICC), que por norma, acontece de 10 em 10 anos, estando uma nova versão em vigor desde 1 de janeiro de 2020, (a anterior versão data de 2010).

Ora, os “incoterms®” (abreviatura de International Commercial Terms/Termos Internacionais de Comércio) são regras internacionais de interpretação uniforme da terminologia contratual comercial e foram apurados pela Câmara Internacional de Comércio que, em 1936, fixou uma série de regras destinadas a dividir custos e a interpretar e definir, de imediato e com precisão, a responsabilidade, no transporte, de vendedores e compradores no mercado internacional.

A sua importância, por demais evidente, realça o quão o comércio internacional tem evoluído no sentido da simplicidade e da minimização de ambiguidades de interpretações. Criou-se assim uma “instituição” que ajuda diariamente as empresas de todo o mundo a realizar operações e a desenvolver laços comerciais de uma forma simples e eficaz.

Deverá cada empresa repensar os incoterms® utilizados nos seus contratos internacionais, internalizando os ensinamentos desta crise sanitária? A resposta é clara: utilizar os instrumentos disponíveis para minimizar riscos desnecessários deverá ser o seu maior desafio.

Torna-se, por isso, fulcral cada empresa escolher o que melhor a beneficia a cada momento, para que a negociação seja bem conseguida sob vários aspetos (preço, risco, responsabilidades).

Neste retomar gradual de atividade, uma vez que os incoterms® 2020 têm um tempo de vida e uma experimentação reduzida face a este novo paradigma, afigura-se importante salientar as principais diferenças face aos incoterms ® 2010:

  • DAT (Delivered at Terminal) passa a denominar-se Delivered at Place Unloaded (DPU);
  • Quando referida, a alocação de custo entre o comprador e o vendedor é declarada com maior precisão – é referido de forma explícita todos os custos pelos quais o vendedor e o comprador são responsáveis;
  • CIP agora exige pelo menos um seguro com a cobertura mínima da Cláusula de Carga do Instituto (A) (All risks, sujeito às exclusões mencionadas).
  • O CIF requer pelo menos um seguro com a cobertura mínima da Cláusula de Carga do Instituto (C) (Riscos nominados, sujeitos a exclusões detalhadas).
  • Os Incoterms® Free Carrier (FCA), Delivery at place (DAP), Delivery at place unloaded (DPU) e DDP (Delivered Duty Paid), levam em consideração que as mercadorias podem ser transportadas sem a subcontratação de transporte, ou seja, usando seu próprio meio de transporte;
  • O Incoterm Delivery at terminal (DAT) foi alterado para Delivery at place unloaded (DPU) esclarecendo que o local de destino pode ser qualquer local e não apenas um “terminal”.

É consabido que a eliminação do risco é um desiderato que não existe. Entender os incoterms® é fundamental, mas haver uma consciencialização dos novos riscos emergentes e aqueles que são possíveis de mitigar, torna-se vital. Para isso, os brokers especializados são fundamentais neste processo, enquanto conhecedores e facilitadores de soluções.

Nada nem ninguém deverá ficar indiferente a este novo circuntancialismo que afeta a nossa vida pessoal e empresarial. Há quem fale em novo normal, eu prefiro chamar de um melhor normal. Demonstramos que somos capazes de uma resiliência sem igual e que perante adversidades extremas, reinventamo-nos, descobrimos novas soluções, solidarizamo-nos com todos aqueles que estão na linha da frente e que até há bem pouco tempo não dávamos o devido valor. Mostramos o melhor que há em nós. Nesta certeza sairemos mais fortes de tudo isto e um melhor normal surgirá naturalmente. Há que saber utilizar os instrumentos disponíveis e há que pensar que esta nova realidade pode perdurar. Preparemo-nos então…

  • Miguel Ferreira
  • National Sales Manager em Portugal da Nacora - International Insurance Brokers

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