O mercado de fusões entre firmas de advogados está em constantes mutações e é uma prática recorrente entre os principais players. A fusão da SRS com a AAA é a mais recente registada no mercado.
Fusões de empresas são cada vez mais frequentes nos diversos setores de atividade. Entre os vários incentivos a esta prática, recentemente avançou um novo fundo, o Portugal Growth Capital Initiative, que pretende estimular o crescimento de empresas mais maduras e promover fusões e internacionalização. Este fundo, alimentado pelo FEI, vai arrancar com 100 milhões de euros e pretende mobilizar cerca de 300 milhões para financiar PME portuguesas.
No mercado da advocacia, o mês de junho ficou marcado pelo ‘casamento’ entre a SRS Advogados, fundada há mais de 25 anos por Pedro Rebelo de Sousa, e a AAA que tem Gabriela Martins e Dulce Franco, ex-sócias da PLMJ, na liderança.
O acordo está fechado e aguarda agora apenas as aprovações formais e administrativas, como a comunicação à Ordem dos Advogados. Uma operação que deverá estar concluída no curso do segundo semestre deste ano. “As evidentes sinergias que a operação oferece” são mencionadas por Pedro Rebelo de Sousa, managing partner da SRS, “que considera uma indesmentível mais-valia a soma das equipas numa estratégia de fortalecimento da estrutura existente definida no final de 2019”, diz o sócio, em declarações à Advocatus.
A SRS tem cerca de 125 advogados e mais de 25 anos, enquanto a AAA tem 20 advogados, mas esta integração permitirá à sociedade liderada por Pedro Rebelo de Sousa o reforço de competências na área de corporate. Gabriela Martins é advogada da família Amorim e da Galp, por exemplo, enquanto Dulce Franco tem, entre os seus clientes, a AutoEuropa.
“As fusões são uma forma extraordinária de criação de valor. É pena não haver em Portugal mais fusões do que aquelas que conhecemos. Um mercado com fusões é um mercado adulto, irreverente e sólido. Por sinal, na minha opinião, as fusões podem ser uma boa forma de trazer para o mercado os grandes empreendedores da advocacia portuguesa”, assegura Nuno da Silva Vieira, sócio da Antas da Cunha ECIJA.
A Advocatus foi conhecer a visão da Antas da Cunha ECIJA e da PRA – Raposo, Sá Miranda & Associados, duas sociedades que apostaram na união de equipas.
“Tipicamente, num negócio como o da advocacia, não se vendem participações, mas sim, as operações de concentração fazem-se através de fusões. Basicamente uma das sociedades é integrada na outra. Os clientes, advogados, bem como todos os restantes bens corpóreos e incorpóreos da sociedade incorporada, passam a fazer parte integrante da sociedade incorporante”, explica Fernando Antas da Cunha, managing partner da Antas da Cunha ECIJA, que recentemente integrou a Vieira Advogados.
Para o advogado, o importante é que exista uma “estratégia de integração”.
Nuno da Silva Vieira assegurou à Advocatus que o processo de fusão das duas firmas foi bastante rápido. “Eu e o Fernando Antas da Cunha entendemos dar muita importância à cultura das duas organizações e perceber se havia zonas cinzentas. À medida que avançávamos, eram mais as complementaridades do que as diferenças. Posso dizer que nem discuti participações sociais. O Fernando lançou um número para a mesa e eu aceitei com enorme sensação de reconhecimento”, nota.
A PRA é resultado também da fusão de três sociedades de advogados: Pedro Raposo & Associados, Sá Miranda & Associados e Almeida Correia, Ney da Costa & Associados. Para o presidente do conselho de administração, Pedro Raposo, um processo de fusão funciona com a “identificação dos objetivos comuns, com humildade de todos os intervenientes e com bom senso”.
Apesar de considerar que não existe uma “receita mágica”, Pedro Raposo assegura que existem várias boas razões tanto para iniciar um processo de fusão, bem como o evitar.
“No nosso caso, a consolidação dos projetos, o somatório das experiências, o aumento das competências e uma maior implantação territorial, dotou a PRA de uma capacidade de resposta diferente que permitiu um crescimento bastante mais rápido do que o que resultaria do desenvolvimento orgânico de cada um dos projetos per si”, assegura o presidente do conselho de administração da PRA.
Já para Fernando Antas da Cunha refere que existem vantagens se a integração ao nível da cultura resultar. “Ganhamos músculo, as sinergias e economias de escala são evidentes. Tendencialmente, os movimentos de concentração e crescimento inorgânico, aumentam a reputação e o valor da marca”, nota o managing partner.
Ainda assim existem alguns constrangimentos com a união de esforços entre duas ou mais firmas. “Quer se queira, quer não, a adoção de procedimentos novos geram sempre algum desconforto e requerem habituação. Também existe sempre uma relativa perda de identidade”, conta Fernando Antas da Cunha. Mas Nuno da Silva Vieira acredita que não existem desvantagens, porque se existissem não se avançava com a fusão.
Antas da Cunha ECIJA e Vieira Advogados: uma fusão com seis meses
Apesar de fundidas há apenas seis meses, o managing partner avança que não podiam estar mais satisfeitos. “Do ponto de vista da cultura parece, inclusive, que já trabalhávamos em conjunto há muito tempo. O compromisso, a dedicação, a cultura de colocar o cliente no centro de tudo é muito semelhante aquela que sempre praticámos”, explica.
Nuno Vieira da Silva fundou a Vieira Advogados em 2012, acreditando que estava a lançar um projeto de empreendedorismo na indústria legal portuguesa, e sete anos depois arriscou e juntou-se à Antas da Cunha ECIJA, uma vez que considerava inevitável.
“O nosso escritório estava situado em Braga e já éramos nove pessoas. Braga é uma cidade irresistível, mas o mercado é curto. Hoje sou sócio de um escritório internacional, presente em mais de uma dezena de países e que conta com escritórios em três cidades portuguesas. Por outro lado, o crescimento da Vieira Advogados só poderia continuar a existir se houvesse uma estrutura cada vez mais profissional. Não hesitei em deixar cair o meu nome na porta para ganhar uma estrutura capaz de potenciar todos os nossos projetos”, assegura o sócio.
Do outro lado da fusão, na Antas da Cunha ECIJA, a motivação foi a de complementar a oferta dos serviços, em particular o nosso foco no direito digital, “com alguém com as características pessoais do Nuno Vieira”.
Apesar de ainda ser cedo para fazer um balanço dos números de faturação e do volume de negócios desde a fusão, Fernando Antas da Cunha acredita que estes saíram reforçados.
“Diria que a estrutura de custos ficou mais eficiente. No que diz respeito ao volume de negócios, apesar de ainda ser cedo para ter um retrato fiel, os primeiros números são entusiasmantes”, assegura Nuno da Silva Vieira.
PRA: mais que duplicaram a faturação e clientes
Com uma fusão de quatro anos, Pedro Raposo, presidente do conselho de administração faz um balanço bastante positivo.
“Atingimos todos os objetivos propostos, aumento de competências e do número de sócios, aumento de faturação e clientes, a afirmação da sociedade a nível nacional com um aumento significativo da sua proximidade aos clientes só possível com cinco escritórios espalhados pelo território, mas o mais importante é que só quando nos questionam é que nos recordamos que éramos três sociedades, pois a integração correu de tal forma bem que hoje em dia é difícil saber o que veio de quem”, explica.
Com o desejo de crescer e de consolidar os respetivos projetos, as firmas decidiram dar o passo e consideraram que estavam reunidas todas as condições para dar o passo de fusão.
“Os escritórios do Porto queriam vir para Lisboa e o de Lisboa, que na altura já tinha escritórios nos Açores e no Algarve, queria ir para o Porto, mas todos tínhamos noção que para serem projetos de futuro teriam sempre de assentar em estruturas já existentes localmente. Como alguns de nós já se conheciam e as duas sociedades do Porto já estavam a pensar na fusão, achámos que estavam reunidas todas as condições e o momento era o ideal”, conta Pedro Raposo.
O presidente do conselho de administração assegurou ainda à Advocatus que após quatro anos, a PRA mais que duplicou a faturação bem como o número de clientes.
“Mesmo nos primeiros tempos, com a identificação das incompatibilidades, que levou necessariamente à impossibilidade de acompanharmos alguns clientes e processos, as dinâmicas de crescimento que cada escritório já trazia, e que foram depois potenciadas pela fusão, eram de tal forma significativas, que logo no ‘dia um’ se verificou um aumento e nunca uma regressão”, acrescenta.
O sucesso tem um nome: estratégia
Nem todas as fusões são bem-sucedidas, mas existem algumas que se prolongam por vários anos. À Advocatus, Pedro Raposo explicou que o “alinhamento entre os sócios e o conhecimento” é o principal fator que contribui para o sucesso.
“O alinhamento entre os sócios porque se todos não estiverem absolutamente convictos da decisão, esta não vai funcionar. As sociedades de advogados são um somatório de profissionais, os sócios são o seu núcleo essencial e, sem o alinhamento absoluto de todos eles, há opções que não funcionam. O conhecimento das pessoas e das estruturas, que tem de ser absolutamente transparente e sem reservas”, explica.
Na PRA, mais de um ano foi para afinar todos os detalhes e a trabalhar juntos. “Tivemos alegrias, zangámo-nos, fizemos cedências, assumimos um compromisso e verificámos que o alinhamento era efetivamente aquele. Depois disso, foi fácil”, acrescenta.
Para Fernando Antas da Cunha, uma estratégia bem definida, compromisso, envolvimento de toda a organização, respeito e acolhimento do histórico da sociedade incorporada são fundamentais para um sucesso de uma fusão.
Mas quem lidera numa fusão? Será a partilha de liderança um risco que advém com uma fusão? À Advocatus, os advogados encontram-se divididos.
Para Fernando Antas da Cunha, a integração de um determinado escritório não implica a partilha de liderança. “As duas coisas não devem ser entendidas como indissociáveis. Se tivermos um determinado sócio que realmente gosta de liderar e de participar na gestão do escritório, é muito bem-vindo para a área de gestão. Caso contrário, uma fusão acaba por ser uma vantagem, porquanto esse mesmo sócio não terá de se preocupar com essas áreas”, explica.
"Se tivermos um determinado sócio que realmente gosta de liderar e de participar na gestão do escritório, é muito bem-vindo para a área de gestão. Caso contrário, uma fusão acaba por ser uma vantagem, porquanto esse mesmo sócio não terá de se preocupar com essas áreas.”
“Acho que só quem nunca liderou nada consegue ver a partilha da gestão como uma ameaça. Efetivamente, como em tudo na vida, não há nada melhor do que termos alguém com quem partilhar, o que corre bem e o que corre menos bem. Devo dizer que essa partilha e a solidariedade que daí resulta foi, para mim, um dos resultados mais apreciáveis e surpreendentes da fusão”, assegura Pedro Raposo.
Já Nuno da Silva Vieira considera que pode ser um risco, caso não haja disponibilidade para a partilha. “O Fernando Antas da Cunha é um managing partner de topo. Um dos melhores em Portugal e muitíssimo melhor que eu. As minhas qualidades como advogado saem reforçadas se tiver tempo para trabalhar, estudar e criar coisas. Seria estúpido se houvesse tema na partilha de lideranças”, reflete.
VdA quer continuar independente
Em 2015, a Vieira de Almeida (VdA) integrou seis novos sócios, entre eles Rui Amendoeira, sócio do escritório de Agostinho Pereira de Miranda, líder da área de oil & gas. Com ele levou mais de 18 advogados, todos da Miranda. Esta integração pretendia atingir dois objetivos estratégicos: acelerar o processo de internacionalização da VdA e aprofundar setores e criar novas áreas de atuação, segundo explicou João Vieira de Almeida na altura.
Esta integração durou pouco, já que, três anos depois, Rui Amendoeira acabou por sair do escritório. Numa primeira fase passou de sócio a consultor, mudança essa sem explicação oficial. Porém, a VdA considera que todas as integrações em que participou, foram “um sucesso”.
“Todas essas integrações se revelaram, até à data, um sucesso. O espírito aberto e inclusivo que tanto caracteriza a VdA facilitam a integração numa firma com a nossa dimensão”, explica a firma liderada por João Vieira de Almeida.
No momento de entrada na sociedade, os reforços contaram com um programa especial de integração. À Advocatus, a VdA assegura que é uma firma independente e assim se manterá. “O nosso crescimento continuará a assentar numa base essencialmente orgânica e por integração sempre que se justificar”, concluem.
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Fusões: o reforço de players no mercado da advocacia
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