O inimigo do teletrabalho

  • Susana Almeida Lopes
  • 3 Novembro 2020

As chefias não se vão tornar melhores ou piores em situação de teletrabalho. Os bons líderes que confiam, responsabilizam, delegam e orientam vão continuar a fazê-lo.

Durante a pandemia realizei um estudo na SHL sobre o teletrabalho em Portugal. Participaram 124 organizações, a maioria de grande dimensão. 99% tinha colaboradores a trabalhar remotamente e apenas 8% antecipava que o teletrabalho cessaria após a pandemia. Significa isto, portanto, que estamos perante um novo contexto para o qual, gestão e colaboradores, não estavam preparados.

O teletrabalho teve, até à pandemia, muita dificuldade de afirmação. Mas agora afirmado, vamos ter um novo normal, e o teletrabalho, reuniões, entrevistas de recrutamento, avaliações de desempenho, feedback e formações online vão seguramente fazer parte dele.

Em termos de eficiência, melhoria do work-life balance, redução de tempo em transportes, e redução de custos de imobiliário, deslocações, entre outros, o teletrabalho tem dado boas provas. Mas também existe um manancial de temas a gerir e a adaptar. Ainda no referido estudo, as organizações portuguesas indicavam que tinham como principais preocupações a reorganização do espaço de trabalho e o apoio à saúde psicológica dos colaboradores.

E esta última temática, é realmente premente. É que o trabalho remoto não nos impacta a todos da mesma forma. Desde logo não temos iguais condições de trabalho em casa, mas sobretudo temos perfis de personalidade diferentes e estamos em fases de carreira e de integração diferentes nas empresas.

É diferente transitar para teletrabalho quando há um conhecimento alargado da equipa e dos processos de trabalho, ou iniciar funções numa empresa imediatamente em teletrabalho. Esta integração é muito mais complicada e exige muito mais da equipa e da liderança.

No que respeita à liderança, as chefias não se vão tornar melhores ou piores em situação de teletrabalho. Os bons líderes que confiam, responsabilizam, delegam e orientam vão continuar a fazê-lo; os líderes controladores, que não confiam nos colaboradores vão ter dificuldades acrescidas para controlar e tal pode trazer um ambiente de desconfiança e de mal-estar.

Sendo que os perfis de personalidade diferem, é inútil procurar um receita para gerir os colaboradores. Para os mais extrovertidos, que precisam de contacto, os líderes precisam de disponibilizar mais para colaborar/conversar virtualmente. Com colaboradores que têm dificuldade em manter-se focados nas tarefas, que se dispersam, será necessário promover pontos de situação regulares.

Uma intervenção importante da gestão de RH é o incentivo aos colaboradores para se perguntarem a si próprios: “Como posso manter-me mais próximo do meu modo de estar habitual? Como posso prevenir o sentimento de solidão? O que posso fazer para me manter saudável e produtivo?” E trabalhar com as equipas, chefias e colaboradores, para potenciar a eficiência e promover
práticas direcionadas para as necessidades diferentes dos membros da equipa.

Algo também crítico a implementar em contexto de teletrabalho são as práticas de interação social em formato virtual. Somos seres sociais, com necessidade de relacionamento e de pertença a um grupo, como que a uma tribo. As neurociências ensinam-nos que as atividades sociais potenciam a libertação de oxitocina, tal como a celebração de feitos e conquistas potenciam a libertação de dopamina, ocitocina e endorfinas, que nos fazem sentir mais felizes.

Promover momentos como cafés virtuais, a celebração dos aniversários, as happy hours, a celebração de feitos, os espaços de brainstorming e de informação, é algo merecedor de toda a atenção dos RH.

*Susana Almeida Lopes é docente no ISEG em GRH e Gestão da Mudança e managing partner da SHL Portugal

  • Susana Almeida Lopes

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