O “Achismo” como método

  • Pedro Vaz
  • 11 Janeiro 2021

O PCP deu entrada, na Assembleia da República, de um pedido de apreciação parlamentar do Decreto-Lei n.º 102-D/2020, de 10 de dezembro que consideraremos aqui como “UNILEX II”

O PCP deu entrada, na Assembleia da República, de um pedido de apreciação parlamentar do Decreto-Lei n.º 102-D/2020, de 10 de dezembro que consideraremos aqui como “UNILEX II”.

Independentemente da necessidade de transposição das alterações às Diretivas Europeias, já se aqui falou que este Decreto-Lei foi bem para lá da simples transposição para o ordenamento jurídico nacional dessas mesmas alterações. Portanto, e aproveitando o facto, este poderá ser um momento oportuno para avaliar convenientemente as políticas relacionadas com os resíduos em Portugal. Desde logo, uma avaliação efetiva e séria dos resultados alcançados pela legislação anteriormente em vigor.

Os objetivos a que se propunham o UNILEX I e o Regime Geral de Gestão de Resíduos foram atingidos? Quais eram? A política prosseguida quanto à redução e reutilização de resíduos e reciclagem foi eficaz? Se sim, porque se muda? Se não, porque e em que medida se altera? O que se pretende alcançar com o está agora em vigor? Quais os custos económicos, de contexto e sociais de alterações como o sistema de depósito de embalagens único previsto nos artigos 23º e seguintes? Quais os custos e para quem das alterações e obrigações criadas em matéria de recolha de biorresíduos, textêis, resíduos perigosos e óleos alimentares usados? Quais os impactos e custos para sistemas, empresas e particulares do novo regime de licenciamento ambiental? Quais os impactos financeiros, sociais e ambientais da alteração da TGR? Tudo isto deveria ter sido discutido e nada foi.

O Parlamento terá agora a oportunidade de fazer um debate sério sobre a política de resíduos em Portugal, que o Governo, apesar dos apelos, deixou passar.

A resposta a estas e outras questões radica na importância, permanentemente descurada, por parte do Estado, de fazer uma avaliação necessária e eficaz das políticas públicas levadas a efeito, especialmente aquelas que resultam de alterações legislativas.

Apesar da consolidação teórica, doutrinal e recomendações das organizações internacionais de que Portugal faz parte, teima-se em ignorar a importância da avaliação das políticas públicas e com isso, continuar-se-á em alterações de políticas e legislação em função do sopro do vento ou, mesmo, determinadas por impulsos mais ou menos mediatizados.

Se quando se alteram leis que permitem, por exemplo, que cidadãos se casem com pessoas do mesmo sexo, poder-se-á antever com relativa segurança, que os impactos socialmente positivos podem até ser economicamente vantajosos com o aumento das receitas do Estado com as receitas nas conservatórias e de mais bodas a serem realizadas dinamizando a economia, em matéria de políticas setoriais do Estado, as alterações às políticas devem ser motivadas por critérios claros, justificáveis e inteligíveis por todos, especialmente por aqueles que os terão de aplicar. Isto aconteceu com o UNILEX II? Não me parece de todo, especialmente, porque ainda não viu a luz do dia a nova Estratégia para os Resíduos Urbanos em Portugal para a próxima década.

Existem conceptualmente muitas formas de determinar uma política pública. Em Portugal escolhe-se, por norma, a pior – que é, na melhor das hipóteses, aquilo que se pode chamar de método dedutivo, mas na realidade é mais o “achismo” da parte de quem promove a política pública e dos que mais conseguem influenciar a ação legislativa.

  • Pedro Vaz
  • Jurista, com especialização em Direito do Ambiente, Energia e Recursos Naturais

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