Avaliação da Função Pública na mesa das negociações com greve à vista

O Governo volta a sentar à mesa com os sindicatos para discutir a revisão do sistema de avaliação dos funcionários públicos. Negociação deverá estender-se até ao final do ano.

Os sindicatos que representam os funcionários públicos rumam, esta segunda-feira, ao Ministério de Alexandra Leitão para o segundo encontro negocial sobre o sistema de avaliação dos trabalhadores do Estado (SIADAP). O Governo já disse que dificilmente serão eliminadas as quotas, que é uma das grandes reivindicações das estruturas sindicais. A Frente Comum convocou, entretanto, uma greve, motivada em parte por estas negociações.

Lançado em 2004, o SIADAP determina que, a cada dois anos, os trabalhadores do Estado devem ser alvo de avaliação, mas independentemente do seu desempenho efetivo apenas uma parte destes têm acesso às melhores notas. Assim, apenas 25% dos funcionários de um serviço podem ter a classificação de “relevante” e 5% de “excelente”.

Essas notas ditam, depois, o ritmo de progressões na carreira dos funcionários, já que cada um desses saltos exige 10 pontos e, enquanto as duas classificações mais altas correspondem a quatro e seis pontos, respetivamente, a imediatamente abaixo (“adequado”) equivale apenas a dois pontos. Resultado: a generalidade dos trabalhadores públicos leva dez anos a conseguir uma progressão, por força das chamadas quotas.

A ministra da Administração Pública, Alexandra Leitão, já disse que considera que esses 10 anos são excessivos, defendendo a anualização e simplificação do sistema. “Não quer dizer necessariamente que as pessoas ganhem mais dinheiro, o que é preciso é que as pessoas ganhem mais cedo mais dinheiro“, disse a governante, numa audição no Parlamento, na qual admitiu que as quotas que têm desacelerado as progressões nas carreiras dos funcionários públicos poderão, afinal, manter-se.

Aliás, no memorando entregue aos sindicatos na primeira reunião negocial sobre o SIADAP, o Executivo de António Costa já dava a entender que essas quotas iriam para continuar a existir, admitindo, em alternativa, a sua majoração para os serviços com melhores classificações. Em causa está uma solução que não agrada os sindicatos, que insistem na necessidade de se eliminarem, de todo, as quotas.

A líder do Sindicatos dos Quadros Técnicos do Estado (STE), por exemplo, mostrou-se receosa quanto a essa opção, sublinhando que os trabalhadores não são responsáveis pelos meios financeiros e materiais que permitem “uma atuação bem-sucedida” dos serviços. E também o dirigente da Federação de Sindicatos da Administração Pública (FESAP) revelou-se preocupado e salientou que não aceitável que a avaliação dos serviços tenha, de alguma forma, implicações negativas nas avaliações dos trabalhadores, uma vez que isso “agravaria as injustiças e desigualdades”.

Já a Frente Comum — outro dos três sindicatos que se sentarão, esta segunda-feira, à mesa com o Governo — defende a revogação de todo o sistema de avaliação e a substituição por um outro “sem quotas, formativo, transparente, equitativo e justo”.

Recusamos a operação cosmética que o Governo pretende fazer ao SIADAP“, salienta a estrutura, na convocatória de greve distribuída aos funcionários públicos. A paralisação — que está marcada para dia 20 — é, aliás, motivada, em parte, por este processo negocial. Sebastião Santana considera que o que tem acontecido é somente “um simulacro de negociação” em que o Executivo não apresentou qualquer proposta concreta.

Além das quotas, os sindicatos reclamam que, no âmbito da revisão do SIADAP, sejam feitas alterações à tabela remuneratória única, que tem sido “achatada”, nos últimos anos, com os aumentos dos níveis mais baixos — nomeadamente o salário mínimo — não acompanhados por atualizações nas demais posições. A ministra Alexandra Leitão já admitiu a criação de escalões intermédios nessa tabela a par da anualização do sistema de avaliação, mas no memorando distribuído pelos representantes dos trabalhadores não se dá mais detalhes sobre o assunto.

Outro ponto de fricção entre estruturas sindicais e Executivo é a data de entrada em vigor das alterações em discussão. O Governo estima que este processo deverá estender-se até ao fim do ano e que, estando em curso atualmente um ciclo de avaliação, fará sentido que as alterações produzam efeitos em 2023. “Não faz sentido que os ciclos de avaliação sejam interrompidos”, disse o secretário de Estado da Administração Pública, à saída da primeira reunião sobre esta matéria. Já a FESAP exige que em 2022 as mudanças já sejam sentidas pelos trabalhadores.

Afinal, o que diz o memorando do Governo?

O processo negocial entre Governo e sindicatos acerca do sistema de avaliação dos funcionários públicos começou com a entrega de um memorando — e não de uma proposta mais concreta, têm criticados os sindicatos — por parte do Ministério de Alexandra Leitão.

O documento, a que o ECO teve acesso, tem cinco páginas e enumera os “princípios gerais” defendidos pelo Executivo, incluindo:

  • “Resultados individuais interdependentes dos resultados da unidade orgânica;
  • Maior relevância da gestão do desempenho por competências e sua contribuição para os resultados da unidade orgânica;
  • Diversificação do conjunto de comportamentos, atitudes e capacidades que permitem ao trabalhador demonstrar determinada competência;
  • Simplificação do procedimento de definição do parâmetro de avaliação “resultados”, na medida em que elimina a definição de objetivos individuais e dos respetivos indicadores de desempenho e metas;
  • Simplificação do processo de monitorização do desempenho e de revisão dos objetivos, quando tal se revele necessário;
  • Maior envolvimento dos trabalhadores na prossecução dos objetivos da unidade orgânica;
  • Tónica do processo de avaliação de desempenho na capacitação dos trabalhadores e na sua evolução profissional, interligando esta com os resultados dos serviços e, nesta medida, com a prossecução de um serviço público de crescente qualidade.”

No memorando, o Governo destaca ainda outros aspetos, defendendo-se, por exemplo, a “introdução de uma abordagem 360º na avaliação dos serviços” — em linha com a interdependência dos resultados individuais relativamente aos da unidade orgânica –, a anualização dos ciclos de avaliação, o eventual aumento das quotas, a simplificação do SIADAP e a disponibilização de uma plataforma informática para a tramitação do processo avaliativo.

Na reunião desta segunda-feira, segundo sinalizou Alexandra Leitão, deverá ser entregue aos sindicatos uma proposta legislativa mais concreta. “Marcaremos uma nova reunião com um primeiro draft de diploma”, disse a ministra, no Parlamento, referindo ao encontro desta segunda-feira.

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