JCDecaux dá bolsas de mil euros aos trabalhadores que queiram terminar ensino obrigatório

Diretora de RH explica que mobilidade interna dos trabalhadores tem sido aposta da JCDecaux Portugal. "Não o fazemos por escassez de talento, fazemos para dar oportunidade ao nosso talento", diz.

Todos os anos, até três dos trabalhadores da JCDecaux Portugal que decidam concluir a escolaridade obrigatória vão receber uma bolsa de mil euros por parte da empresa para fazer face aos custos associados e incentivar essa aposta na formação. Esta medida foi lançada recentemente, segundo conta, em entrevista ao ECO, a diretora de recursos humanos, Carla Carvalho.

“Promovemos a mobilidade, mas damos às pessoas as ferramentas necessárias“, garante a responsável, que explica que a JCDecaux tem também suportado os custos com licenciaturas, pós-graduações e mestrados de colaboradores.

A liderar uma equipa de 241 trabalhadores, Carla Carvalho elege a criação de políticas diferenciadas que motivem empregados em diferentes fases da vida e da carreira como o principal desafio, frisando que, sob a sua gestão, tanto há jovens, como há quem tenha 20 ou mais anos de “casa”.

Carla Carvalho, diretora de recursos humanos da JCDecaux, em entrevista ao ECOHugo Amaral/ECO

A JCDecaux está presente, neste momento, em mais de 90 concelhos de Portugal. Entre pessoal que trabalha no terreno e a equipa de escritório, quantas pessoas têm hoje ao serviço?

Neste momento somos 241 colaboradores.

Quais são os principais desafios na gestão dessas duas centenas e meia de trabalhadores, sobretudo tendo funções tão diferentes?

Um dos desafios passa por garantir que desenvolvemos políticas de motivação, de carreira, e de desenvolvimento para públicos-alvo completamente distintos, por exemplo, em termos funcionais, porque temos desde as equipas de manutenção, de ateliê de cartazes, de eletrónica até às equipas de escritório, como comerciais, marketing, património, financeiro e recursos humanos. Com diferentes idades e de diferentes gerações. Temos colegas com 40 anos de casa e colegas com um ano de casa.

Que políticas têm desenvolvido para criar uma cultura empresarial coesa numa empresa com tantas diferenças no seu seio?

Tem muito que ver com o nosso espírito e com o ADN da empresa. Temos uma frase do nosso fundador, que é: tudo o que merece ser feito merece ser bem feito. Isto é transmitido de pessoa a pessoa. Há um sentido de união muito grande. Todos nós trabalhamos em áreas diferentes, mas todos temos a consciência de que o mais importante é o resultado global. Também ajuda o facto de promovermos muitos eventos fora do local de trabalho, com uma componente lúdica, em que as pessoas acabam por criar uma relação.

Quando temos alguém numa empresa há 20 anos, numa mesma função, é necessário criar condições para que a pessoa sinta que a carreira pode evoluir.

Consegue dar alguns exemplos?

Dentro de um conceito mais corporativo, temos o Conecta, que é um evento que normalmente marca o início do ano e cujo objetivo é a partilha daquilo que foram as conquistas no ano anterior e os resultados da empresa, incluindo a faturação. Por outro lado, serve para partilhar os objetivos para o próximo ano, para que eu entenda aquilo que tenho que alcançar individualmente e enquanto grupo, mas que também aquilo que o departamento comercial, marketing ou de operações tem de alcançar. Dá uma clarividência do trabalho do colega e do porquê de determinadas situações que acontecem no dia a dia.

Além disso, temos o nosso dia recreativo, que passamos na praia. Temos uma atividade de team building durante a manhã e, depois, a tarde é 100% lúdica. Temos também um grupo desportivo, que tem elementos de cada uma das equipas. Temos um budget que gerimos entre nós e desenvolvemos anualmente três atividades de grupo. Por exemplo, um torneio de futebol com almoço. São momentos de muita interação entre todos os colaboradores.

Disse que, além destas atividades recreativas, apostam em políticas diferenciadas para os diferentes públicos-alvo para garantir essa coesão entre as empresas. Consegue detalhar o que têm feito?

Por exemplo, a iniciativa que criámos este ano para aqueles que têm filhos. Um dos desafios que temos, porque temos muitos casais a colaborarem connosco em departamentos diferentes, tem que ver com o verão e com conseguirmos criar flexibilidade para existir equilíbrio entre a vida pessoal e profissional. Decidimos, então, criar uma colónia de férias para os filhos dos colaboradores. Uma iniciativa 100% suportada pela empresa. Os pais levavam os filhos de manhã e tínhamos um autocarro que os levava até à colónia de férias.

E, no que diz respeito às diferenças fases da carreira em que estão os trabalhadores, que políticas têm pensadas?

Quando temos alguém numa empresa há 20 anos, numa mesma função, é necessário criar condições para que a pessoa sinta que a carreira pode evoluir. Uma das políticas que implementámos é, quando temos uma qualquer vaga, independentemente do departamento, divulgamos essa vaga internamente e abrimos candidaturas. Tivemos imensas pessoas nestes últimos dois ou três anos a evoluírem, em processos de mobilidade de carreira. Não é uma mobilidade só porque sim, é uma mobilidade baseada numa cultura de meritocracia. Fazemos um exame prático.

Essa política resulta também no facto de estar a ser mais difícil recrutar externamente? Fala-se tanto em escassez de talento. Também a sentem?

Não, resulta de uma política de comunicação de porta aberta e escuta ativa. Quando integrei a JCDecaux, concluí que era fundamental conhecer as pessoas. Se estivesse numa sala e não conhecesse a realidade, o terreno e as dificuldades, era-me difícil criar políticas de recursos humanos que fossem ao encontro de um público-alvo que não conhecia. Foi fundamental falar com todas as pessoas, fazer uma fixação de rua durante a noite, fazer a manutenção de um equipamento e perceber as dificuldades. Ao fazer esse trabalho, percebi os pontos nos quais tínhamos que atuar, e um deles era a mobilidade. Não o fazemos por escassez de talento, fazemos para dar oportunidade ao nosso talento interno. Até porque, no que se refere à política de recrutamento, temos também um programa em que os próprios colaboradores referenciam pessoas para determinadas funções.

Carla Carvalho, diretora de recursos humanos da JCDecaux, em entrevista ao ECO Hugo Amaral/ECO

Como é que funciona? Há algum prémio para quem referencie candidatos?

O prémio é um cartão presente no valor de 200 euros, que oferecemos a todos os colaboradores que nos indiquem a alguém que seja contratado para a empresa. Obviamente que o prémio é sempre simpático, mas sinto que as pessoas já não o fazem exclusivamente pelo prémio. Fazem-no muitas das vezes porque sentem que trabalhar na JCDecaux é muito bom, pela política de benefícios, pela estabilidade e pela evolução.

Falou em estabilidade e evolução. Já disse que há pessoas que estão há 40 anos convosco. Em média, quanto tempo é que as pessoas ficam convosco?

Depende da área. Por exemplo, em equipas que têm mais jovens, o turnover [a rotatividade] é um bocadinho mais elevado. Em equipas mais técnicas, como a eletrónica, o turnover é menor. O turnover global da empresa é à volta de 3%. A nossa percentagem de retenção é muito elevada. De modo geral, em todas as áreas, tirando os departamentos mais recentes, temos pessoas com uma média de dez a 15 anos na empresa.

Promovemos a mobilidade, mas damos às pessoas as ferramentas necessárias.

A pensar na evolução e retenção de talento, sei que também têm bolsas para trabalhadores que não tenham concluído o ensino hoje considerado obrigatório e que desejem fazê-lo. Como é que funcionam?

No pilar da responsabilidade social, criámos dois programas, um dos quais foi lançado em setembro do ano passado e outro em setembro deste ano. No ano passado, lançámos a academia inclusiva e este ano lançámos o programa de bolsas de estudo, que consiste em incentivar os nossos colaboradores a concluir o ensino obrigatório. Até porque, a partir daí, temos um plano de formação anual e a JCDecaux, muitas vezes, suporta os custos com licenciaturas, pós-graduações e mestrados de colaboradores.

Promovemos a mobilidade, mas damos às pessoas as ferramentas necessárias. No programa de bolsas de estudo, pedimos aos colaboradores o seu comprovativo de matrícula e, caso concluam com sucesso o ano letivo, recebem uma bolsa de mil euros, para fazer face aos custos que tenham tido e como um incentivo à conclusão daquilo que é um ensino obrigatório.

Quantas vagas têm neste programa?

Temos três vagas por ano. O balanço que fazemos é que, ainda que seja só uma pessoa, já é uma vitória, porque foi, pelo menos, um colega que conseguimos incentivar a concluir o ensino e ajudar neste processo de mobilidade.

Como surgiu a ideia de criar estas bolsas?

Foi através de uma outra ferramenta nossa. Fazemos uma auscultação contínua às equipas. Esta ideia da bolsa de estudos veio de uma colaboradora nossa, através desta auscultação. Uma colaboradora que tem o ensino concluído, portanto, não seria para si, mas para os colegas. Analisámos a ideia, achámos que fazia todo o sentido na nossa realidade e implementámos.

Em setembro do ano passado já tinham lançado a academia inclusiva, disse há pouco. Que programa é este?

O grupo JCDecaux lança todos os anos o desafio de cada região concorrer com projetos sustentáveis, seja numa componente social, seja numa componente ambiental. Uma das sugestões que surgiu numa sessão de brainstorming no ano passado foi a de que seria muito interessante colocarmos o conhecimento dos nossos colaboradores a favor daquilo que é o sistema de formação de outras pessoas e de ajuda à integração no mercado de trabalho.

De que modo?

Muitas vezes, a primeira ideia que temos é: vamos ter com instituições que precisem da nossa ajuda. Mas isso já fazíamos. Percebemos que, desde que existe legislação que regulamenta a inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho, a taxa de desemprego desceu drasticamente. Então, pensámos que este é um público-alvo que queremos incluir, mas existem muitas outras franjas que a legislação ainda não contempla, como os migrantes, os jovens institucionalizados à procura do primeiro emprego, ex-reclusos e pessoas em situação de desemprego de longa duração, que, além da questão do desemprego em si, têm o fator social e a parte emocional associada à não conquista de um novo desafio. Criámos a academia inclusiva para todos estes públicos-alvos.

Carla Carvalho, diretora de recursos humanos da JCDecaux, em entrevista ao ECOHugo Amaral/ECO

Como funciona?

Lançámos internamente esta academia, permitindo às pessoas que trabalham na JCDecaux inscreverem as pessoas que fazem parte do seu círculo familiar, amigos, e conhecidos. Integrámos uma colega, dentro do conceito de desemprego de longa duração. Integramos na empresa pelo período de estágio remunerado de um ano. Começou em janeiro e terminará em dezembro. E depois, em dezembro, reavaliaremos se faz sentido integrar a organização.

Já consegue perceber se esta primeira beneficiária da academia inclusiva vai ficar convosco?

Neste caso, faz sentido continuar, sim.

Esta pessoa ficou integrada em que área de negócio?

Ficou enquadrada dentro das operações, numa área administrativa. Passou por um processo de entrevista, tentámos perceber o que é que tinha sido o background e, face ao âmbito do projeto, tendemos a proteger de alguma forma a pessoa, ou seja, não são funções que tenham um nível de pressão ou de exposição elevado. Claro que é um win-win, quando conseguimos que a pessoa também acrescente valor à organização, que felizmente é o que tem acontecido. Mas, acima de tudo, o objetivo deste programa é a organização acrescentar valor à vida daquela pessoa.

Portanto, um ano depois, em setembro voltaram a abrir uma nova vaga?

Sim, este setembro abrimos nova vaga. É-nos difícil, em 241 colaboradores, conseguirmos ter muitas vagas deste estilo em simultânea.

Portanto, prevemos que, no próximo ano, teremos alguns recrutamentos, quer em áreas de vendas, quer nestas áreas mais tecnológicas e direcionadas para estes novos equipamentos.

À parte deste programa, para 2026, têm recrutamentos previstos?

Claramente com a evolução tecnológica dos equipamentos digitais, cada vez mais a contratação de técnicos de eletromecânica é para nós uma necessidade. Também as equipas comerciais normalmente tendem a crescer todos os anos. Portanto, prevemos que, no próximo ano, teremos alguns recrutamentos, quer em áreas de vendas, quer nestas áreas mais tecnológicas e direcionadas para estes novos equipamentos.

Tem um número em mente?

Prevemos até um máximo de seis ou sete novas contratações.

Veja a entrevista em vídeo na íntegra abaixo:

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

JCDecaux dá bolsas de mil euros aos trabalhadores que queiram terminar ensino obrigatório

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião