Covid-19: O day after para o setor segurador

Nuno Luis Sapateiro, associado coordenador nas áreas de Bancário e Financeiro e Mercado de Capitais da PLMJ, considera que esta crise faz parte da mudança de paradigma no mundo e, claro, nos seguros.

O Covid-19 tem afetado, de forma marcante, a vida das pessoas e os negócios em todo o mundo. Ainda que não seja possível, para já, determinar a dimensão exata e o impacto da pandemia na nossa economia, devemos estar prontos para lidar com as consequências da antecipada recessão.

Os possíveis impactos incluem perdas financeiras decorrentes, designadamente, do adiamento ou cancelamento de transações e eventos, da interrupção da cadeia de distribuição, da redução da produtividade, do alargamento dos prazos para pagamento de encargos e, em última instância, da insolvência de pessoas singulares ou coletivas.

Em momentos de incerteza como aquele que vivemos hoje, importa encontrar soluções para problemas imediatos e pensar estrategicamente sobre o futuro. Ainda terão que ser apurados os efeitos desta pandemia no setor segurador, sendo certo que a revolução tecnológica em curso poderá mitigar o impacto do teletrabalho e outras medidas de contenção na gestão dos desafios operacionais das seguradoras junto dos seus cientes. Uma questão distinta prende-se com o impacto desta pandemia no modelo de negócio do setor segurador.

Note-se que também é nestes momentos de maior pressão que o setor segurador se consegue reinventar e despertar os consumidores para soluções de transferência de risco que, muitas vezes, já estavam disponíveis no mercado. Foi o caso, por exemplo, do aumento da procura de produtos de seguro D&O (Directors & Officers) na sequência da crise financeira global de 2008, da vaga de ataques cibernéticos que fez despertar os seguros cyber ou das discussões em torno do desenvolvimento de produtos que assegurem a cobertura de riscos associados às alterações climáticas.

A experiência que temos vivido não deixa margem para dúvidas sobre o potencial de perdas decorrentes de uma pandemia e a prudência que deve ser adotada na eventual cobertura deste risco. Da mesma forma, toda a aprendizagem que se retirar deste fenómeno deve ser considerada para efeitos de análise de risco por parte do setor segurador, sendo essencial que este seja munido de meios tecnológicos e pessoal especializado na análise deste tipo de fenómenos.

Existem diferentes variáveis que podem ser consideradas pelo setor para construir uma solução e delimitar o seu nível de exposição perante um risco desta dimensão, seja ao nível do prémio, das franquias, do limite temporal da cobertura (nomeadamente no caso de perdas de exploração), em sede de exclusões ou na forma como a solução é apresentada (cobertura complementar / voluntária).

Sem prejuízo dos melhores esforços que sejam empregues no desenho de soluções, não podemos esquecer que as seguradoras têm sido sujeitas a uma enorme pressão em termos de requisitos de solvência e compliance e só terão capacidade para aceitar este tipo de riscos se conseguirem transferir parte ou totalidade dos mesmos, nomeadamente através do resseguro.

Da mesma forma, o Governo e demais autoridades competentes também devem fazer parte da solução e esta é a altura para se discutir o âmbito do, eternamente adiado, fundo sísmico e a eventual necessidade de replicar ou estender esta solução para outros fenómenos excecionais como este que estamos a viver. Esta seria uma excelente solução para disseminação do risco.

Estamos perante um mundo novo que se vai habituando a lidar com fenómenos que outrora se consideravam excecionais ou praticamente impossíveis e que, por essa razão, eram letra morta na lista de exclusões dos produtos de seguro. O paradigma do mundo está a mudar e o dos seguros também.

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