ILS – Insurance-Linked Securities: Tie-breaker anti Covid-19

  • António Pombeiro
  • 23 Abril 2020

António Pombeiro, originador e estruturador na Securis Investment Partners, explica como os fundos ILS funcionam e como se aplicam bem a riscos pandémicos como os vividos neste tempo.

Se há alguns meses atrás alguém sugerisse comprar um seguro contra pandemias como SARS, MRS ou coronavírus, certamente seria criticado por querer cobrir riscos despiciendos ou remotos, com prémios de seguro que, dir-se-ia, só rentáveis para as seguradoras.

No entanto, não foi essa a conclusão do The All England Lawn Tennis & Croquet Club (AELTC) responsável por organizar o Torneio de Wimbledon, ao comprar uma apólice de seguro para pandemias globais, incluindo coronavírus. Estima-se que o montante do sinistro a pagar pelas seguradoras seja à volta de 141 milhões de dólares (130 milhões de euros), o que permite ao AELTC recuperar a grande maioria de perdas financeiras devido ao cancelamento, garantindo assim ao clube a possibilidade de financiar etapas futuras do torneio. O prémio pago por este seguro foi de 2 milhões de dólares (1,8 milhões de euros) anuais. Sendo a organização detentora deste seguro há 17 anos, tal significa 34 milhões de prémios pagos versus 141 milhões de dólares de indemnização a receber.

Infelizmente, esta não foi a decisão tomada por várias empresas financeiramente expostas ao impacto que o Covid-19 tem vindo a revelar. Simplificadamente, tal decisão deve-se, provavelmente, a um reduzido enfoque da gestão de riscos remotos/extremos ou à falta de oferta deste tipo de seguro/protecção.

O atual contexto, certamente, irá melhorar o modo como empresas de diversos setores abordam este tipo de risco numa perspetiva de business disruption, e o setor Insurance-Linked Securities (ILS) pode ajudar nesse sentido indiretamente, através de contratos de resseguro com seguradoras e diretamente, através de acordos diretos com empresas).

O que é Insurance-Linked Securities (ILS) e como pode beneficiar o setor segurador (e não só)

O setor ILS nasceu com o principal propósito, entre outros, de ser uma alternativa flexível ao setor ressegurador e de criar uma classe de ativos cuja correlação com ativos mais tradicionais como, por exemplo, ações ou dívida, é baixa ou em certos casos praticamente nula. Isto implica que a rentabilidade de ativos ILS não dependa de fatores como o crescimento económico, os lucros ou perdas de uma empresa ou tensões comerciais entre os EUA e a China.

No início, este setor era principalmente composto por obrigações de catástrofe, considerando este termo mais adequado do que obrigações catastróficas, por razões óbvias. Estas obrigações transferem o risco de catástrofes naturais, inicialmente subscrito indiretamente por seguradoras, como furacões, tempestades ou terremotos para o mercado de capitais, ou seja, fundos, entre os quais, ILS.

Comparando com uma obrigação normal, o emissor paga um cupão periodicamente e na maturidade devolve o principal. No entanto, quando ocorre(m) o(s) evento(s) coberto(s) pela obrigação, por exemplo, um furacão que cause perdas acima de um valor especificado, os cupões deixam de ser pagos e o principal é distribuído ao emissor para indemnizar perdas causadas por esse evento como exemplifica o esquema abaixo.

Estrutura simplificada de uma obrigação de catástrofe[1]

[1] Outros elementos como por exemplo conta de colateral, retorno de investimento sobre o colateral, quantia recuperável, attachment/detachment points e tipo de contrato (resseguro ou derivado) são omitidos de forma a tornar a estrutura mais intuitiva para o leitor, no entanto estes fatores terão que ser tomados em consideração quando uma transação deste tipo for contemplada.

Os benefícios são, por um lado, a transferência de risco (significativo) do Emissor (comprador da proteção) e, por outro lado, os investidores recebem um retorno (ajustado ao risco) atrativo e descorrelacionado com outros ativos tradicionais. A SPV (special purpose vehicle), entidade criada especialmente para a transação, assegura que nem o Emissor (comprador de seguro/protecção), nem os fundos ILS, têm risco de crédito entre eles.

Atualmente, este tipo de obrigações de catástrofe negociáveis representam aproximadamente 40% do mercado ILS que está avaliado em cerca de 100,4 mil milhões de dólares. Os restantes 60% consistem em transações privadas/bilaterais e incluem não só riscos Não-Vida como também riscos Vida e Saúde. Estas transações podem ser desde contratos de resseguro, financiamento de embedded value, financiamento estruturado a coberturas de pandemia.

No atual contexto pandémico, o foco para resseguros e cobertura de eventos pandémicos como o Covid-19 aumentou significativamente, não só no setor segurador como noutros setores severamente afetados – aviação, hotelaria e imobiliário, entre outros. ILS é uma alternativa sólida e testada para estruturar algo à medida que dê a cobertura necessária para cada setor.

A estrutura utilizada em obrigações de catástrofe pode ser reutilizada para riscos de pandemia como o Covid-19 ou outros tipos de coronavírus ainda não existentes, como foi o caso do seguro contratado por Wimbledon, com as modificações necessárias para garantir que as necessidades de cada setor são alcançadas. Por exemplo, na indústria hoteleira, a proteção pode estar diretamente ligada à taxa de ocupação, ou seja, se devido a uma pandemia a taxa de ocupação descer abaixo de um valor pré-determinado, o grupo hoteleiro receberá uma indemnização. O mesmo pode ser feito para vários outros setores, reduzindo significativamente a incerteza e o impacto financeiro sobre o negócio.

Esta cobertura não está limitada ao setor privado e pode igualmente ser um instrumento utilizado pelo Estado e Entidades Públicas para aliviar o impacto económico que uma pandemia, como o Covid-19, pode causar, proporcionando-lhes recursos financeiros rápidos e eficazes para atuar no restauro da economia e/ou serviços de saúde.

  • António Pombeiro
  • Originador e Estruturador na Securis Investment Partners

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

ILS – Insurance-Linked Securities: Tie-breaker anti Covid-19

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião