Nenhum tempo é tempo demais

Dez anos é uma eternidade ou é pouco tempo para tudo o que Portugal tem para fazer e para melhorar? Web Summit fica. Seria melhor se nos deixasse?

“Não sei como vou explicar isto ao meu pai”, diz Paddy Cosgrave, CEO e cofundador da maior conferência de tecnologia e empreendedorismo do mundo, à margem da conferência de imprensa que oficializou a permanência do Web Summit por mais 10 anos em Portugal. Entre confissões, o irlandês recebia os parabéns dos assistentes, entusiasmados com a novidade. “Boa decisão”, diziam-lhe. Paddy respondia: “Obrigada. Assim espero”. E, mais baixo, sussurrava: “Hoje vou ter de ligar aos governos de Espanha e da Alemanha para comunicar oficialmente a nossa decisão”.

A decisão, como disse Paddy, talvez seja “a mais louca” que tomou na vida. Portugal, o país à beira-mar plantado, soalheiro, do surf, do vinho e do peixe, foi o eleito para crescer e fazer crescer o Web Summit até 2028 (a cláusula de rescisão que os irlandeses assinaram no valor de 340 milhões por ano não cumprido leva a pensar que jamais o evento possa sair de Portugal antes da data prevista). Mas, não é só a ele que assusta assumir uma relação que se espera feliz para os próximos dez anos: o que significa para Portugal ter a garantia de dez anos vezes 70 mil pessoas — ou mais? Dez vezes 300 milhões de retorno económico? Dez vezes 30 milhões de receita fiscal? Dez vezes dezenas de unicórnios, centenas de pitch, milhares de investidores? Dez vezes infinitos é muito tempo?

Lamento informar mas a resposta é: depende.

Se pensarmos nos últimos três anos — ou quatro, considerando o entusiasmo desde aquele dia em Dublin, quando Paulo Portas e Leonardo Matias subiram ao palco da conferência e elogiaram o sol, as ondas e o surf português –, o caminho fez-se tão a correr como a velocidade a que António Costa abandonou esta quinta-feira a conferência de imprensa. As agendas cheias nem sempre se coadunam com anúncios de última hora. E parece que, até sexta-feira passada, ninguém sabia — nem Paddy, nem Medina, nem mesmo Costa — que o Web Summit tinha vindo para ficar.

Preparar as negociações e, sobretudo, tomar decisões, leva tempo. E, ainda que Paddy e a equipa não tenham precisado de muito mais de dez segundos para dizer o sim final, o processo fez-se de muitos sims, nims ou assim-assims.

Há dez anos, lembro-me eu, Lisboa, Portugal e os portugueses estavam (estávamos) mergulhados na maior crise de que tenho memória. Há dez anos — apenas ou já há dez anos? — havia um pessimismo latente, uma indústria antiquada, uma economia estagnada e dependente de mercados que, nessa altura, precisavam de muito mais de um fornecedor como Portugal para fazer face aos desafios. Hoje, Portugal é tema de conversa na imprensa internacional. Debate-se a estratégia, elogiam-se os resultados, questiona-se o futuro. Chamam-nos os “novos navegadores”, imagine-se. Há dez anos lá podíamos imaginar uma coisa assim?

Ontem, Fernando Medina falava em competição. “Ganhámos”, disse. Há dez anos, mal sonhávamos que, dez anos depois, teríamos ganho muito mais do que o Web Summit. Três unicórnios criados por portugueses, um IPO em Wall Street com direito a bandeira portuguesa, uma estratégia nacional para o empreendedorismo — a Startup Portugal — e mais de 140 incubadoras e aceleradoras (organizadas numa Rede Nacional de Incubadoras), uma startup portuguesa vencedora do concurso de pitch do Web Summit, centenas de startups criadas e mais de 3.000 em incubação, milhares de postos de trabalho, milhões levantados em rondas de capital de risco. E podia continuar ou resumir numa só palavra o que aconteceu em Portugal nos últimos dez anos: mindset. Mudámos.

Deixámos de ser as promessas que não chegavam a ser e pusemos mãos à obra: numa mesa da sala de estar criaram-se projetos de milhões, de um concurso de ideias nasceram unicórnios. E se fizemos isto tudo nestes dez anos que passaram a correr, imaginem o que podemos fazer nos próximos dez.

O Web Summit e Paddy estão de parabéns pela decisão tomada: ficar em Portugal é investir num país de talento, com sol, mundo e vontade. E o pai de Paddy que se prepare: dez anos é tempo suficiente para mudar o mindset e a morada… para Lisboa.

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

Nenhum tempo é tempo demais

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião