Non performing loans – vender ou não vender, eis a questão

  • Vasco Rodrigues
  • 8 Fevereiro 2021

A colocação de carteiras de NPL no mercado e organização de processos de venda será a forma mais eficaz de controlar o agravamento destes rácios e contribuir para uma maior solidez das instituições.

Uma década depois da Grande Recessão, as economias mundiais vêem-se novamente confrontadas com uma crise à escala global, provocada por um evento inédito na era da globalização: uma pandemia. Um dos efeitos previsíveis será o aumento do crédito malparado, vulgarmente denominado non-performing loans (NPL).

Em 2016, o volume de NPL existente no balanço dos bancos portugueses atingiu o seu máximo: cerca de 50 mil M€. Desde então, a banca portuguesa conseguiu reduzir o volume de NPL para cerca de 17 mil M€, mormente através da organização de processos de venda de carteiras de NPL. Ainda assim, os bancos nacionais apresentam atualmente rácios de NPL superiores à média europeia (5,7% e cerca de 3%, respetivamente), pelo que qualquer aumento terá efeitos particularmente nocivos para a nossa economia.

O regime das moratórias de crédito – aprovado pelo Decreto-Lei nº 10-J/2020, de 26/03 – permitiu suavizar o impacto imediato da pandemia e das medidas implementadas para a controlar, mas a incerteza sobre os seus efeitos não conseguirá evitar o incumprimento da dívida de muitas empresas e particulares, face à crise que se adivinha. Também os anunciados apoios estatais constituirão uma panaceia para as dificuldades que as empresas atravessarão, mas, neste caso, ao contrário do que esperamos que venha a acontecer para a cura da pandemia, não haverá vacina que permita chegar à imunidade de grupo.

Para o Comissário Dombrovskis, os efeitos da pandemia deverão ser “um duro golpe na qualidade dos ativos dos bancos e, consequentemente, na sua capacidade de conceder crédito”. É por isso que entendemos ser crucial que a banca dê continuidade ao processo de desalavancagem destes ativos, evitando prejudicar o equilíbrio futuro da banca, que assumirá um papel fundamental no apoio às empresas e particulares para ultrapassar desafios e desenvolver novos projetos de investimento, contribuindo geração de riqueza e emprego.

O setor financeiro português não está dormente. Se, no seguimento da paralisação da economia que afligiu o Mundo em março, várias transações em fase embrionária foram suspensas ou canceladas, o segundo semestre viu muitos desses processos renascer, gerando interesse entre investidores internacionais.

Não é de estranhar que a procura por este tipo de ativos não tenha sido afetada pela pandemia. Após o boom económico da segunda metade da última década e o sucesso obtido no levantamento de capital (fundraising), os fundos de investimento dispõem de liquidez para continuar a transacionar. Este mercado tem também potencial para atrair outros agentes usualmente focados em ativos mais tradicionais, procurando diversificar o seu portfolio e investir em ativos distressed com um maior potencial de rentabilidade.

Desta forma, entendemos que a venda de carteiras de NPL deverá ser encarada como um imperativo e que esta posição não deveria sequer ser controversa. Não obstante alguma cobertura mediática que demoniza bancos vendedores pelos descontos que aceitam e fundos “abutres” pelo aproveitamento da situação, a venda de NPL é parte da atividade normal das instituições financeiras, permitindo retirar ativos não produtivos do balanço e reduzir requisitos de capital. Já os fundos assumem um papel essencial na criação de um mercado secundário competitivo.

Deverão também ser implementadas outras medidas que contribuam para melhor controlo do nível de rácios NPL da banca. No entanto, quaisquer alternativas dificilmente irão mitigar o risco de crescimento que ocorrerá em 2021, findo o período das moratórias de crédito. A colocação de carteiras de NPL no mercado e organização de processos de venda será a forma mais eficaz de controlar o agravamento destes rácios e contribuir para uma maior solidez das instituições financeiras, de forma a que estas possam também ser um agente efetivo no processo de retoma.

  • Vasco Rodrigues
  • Associado principal da área de bancário, financeiro e M&A da Garrigues em Portugal

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