Política ou a Imaginação sem Ideias

O Mundo está a mudar. A política entra em modo de fragmentação. Esta deriva disforme para o fragmento e para o passado são o sintoma de uma metamorfose da crise.

O Mundo está a mudar. A política entra em modo de fragmentação. A economia revisita planos derrubados pela História. Esta deriva disforme para o fragmento e para o passado são o sintoma de uma metamorfose da crise. Retomando o espírito de Elias Canneti, parece que a solução política para todas as coisas é o círculo cego sobre a deriva do Mundo, pequenas elevações na margem dos dias que permite uma pausa para a respiração de todas as ilusões. Chegar a estas elevações artificiais é o máximo esforço político da presente geração. Afinal a política não tem sentido e o futuro está no passado.

Mais ainda. O pensamento político e a doutrina económica projetam frequentemente ideias que ajudam a entender o Indivíduo e a explicar o Mundo, nomeadamente e na circunstância, o mito eternamente antagónico entre a “conservação” e a “mudança”. A “conservação” é o sonho da eternidade, o desejo de uma ordem fixa nas relações entre a política e a economia, talvez, e no limite, a estabilidade total de um Mundo previsível, o mito fundador de todas as tiranias. A “mudança” é o reconhecimento de um fluxo contínuo em que nada permanece na sua forma original, é a força impulsionadora que reconcilia a política e a economia numa dialética convergente que se eleva na cadência infinita do “progresso” que, no limite, representa a outra face do despotismo.

Convirá salientar que um dos grandes paradoxos deste conflito é que independentemente de quem ganha o confronto na realidade existe sempre uma nova geração de intelectuais, de políticos e de economistas, que se ocupam da tarefa de reinventar todas as derrotas no registo épico de todas as vitórias. Esta é a inversão do tempo político anulado pela narrativa económica, o retrato ruidoso de um Mundo a mudar.

Veja-se a política. Apesar de todas as previsões sobre a ascensão do Populismo, os populistas não conseguem vencer uma eleição na Europa. No entanto, a política convencional está em desagregação, o convívio e a coligação entre os partidos do centro-esquerda e do centro-direita parece a recordação de um passado jurássico. A mais pura fragmentação das Identidades surge talvez como a tendência mais marcada do novo fenómeno político.

Neste tempo de registo Pós-Ideológico, as coligações são exercícios políticos de geometria acrobática, são o percurso do compromisso no labirinto do Populismo, do Localismo, do Separatismo, do Pós-Marxismo. A política está dominada por uma ideia de Justiça Social, por uma dimensão de Igualdade Moral, pela afirmação de uma Virtude Universal, um ponto crítico em que todas as situações e todas as condições individuais, pertencem a uma narrativa política em que o Bem e o Mal se enfrentam numa guerra pelo futuro da Humanidade.

Existe uma alegria infantil, uma desonestidade intelectual, uma negação do tempo e da História, quando todas as soluções para todos os problemas económicos passam e exigem a ação e a intervenção do Estado — seja no extenso programa de nacionalizações do Labour de Jeremy Corbyn, seja na refundação do capitalismo americano nos planos do Partido Democrata versão Elizabeth Warren.

Carlos Marques de Almeida

A combinação cruzada de um “Pluralismo Combativo” e de uma “Cidadania Radical”, em conjunção com a afirmação de uma “Hegemonia Pós-Convencional”, podem levar ao extremo a flexibilidade própria das Democracias Liberais e colocar em causa o funcionamento e a lógica da própria Democracia Representativa. Para esta configuração do “Regresso do Político”, tudo converge no reconhecimento do caráter antagónico e irredutível do conflito político, caráter sem o qual a política é uma caricatura impotente que serve a dominação dos interesses económicos de uma oligarquia política privilegiada. É o fascínio da fragmentação na causa da reabilitação da Humanidade.

Veja-se a economia. O discurso que se eleva e se projeta como a solução económica para os problemas da Desigualdade, da Injustiça, da Pobreza, é uma revisitação da narrativa e da visão Marxista. Seja no Reino Unido com Jeremy Corbyn, seja na América com Elizabeth Warren, os discursos políticos ressaltam e provocam, por pura fricção, uma infinidade de fragmentos económicos que ilustram uma versão Marxista de um brinquedo económico que, reciclado no fulgor de toda a energia, faz disparar todos os alarmes da razão e da consciência quando se afundam na margem superficial de uma nova costa dos prodígios.

Existe uma alegria infantil, uma desonestidade intelectual, uma negação do tempo e da História, quando todas as soluções para todos os problemas económicos passam e exigem a ação e a intervenção do Estado — seja no extenso programa de nacionalizações do Labour de Jeremy Corbyn, seja na refundação do capitalismo americano nos planos do Partido Democrata versão Elizabeth Warren. A análise marxista regressa dos confins da História, o argumento de classe segue o seu instinto predador, a rejeição do Liberalismo e da Globalização rebentam no megafone. Quanto à dignidade do Indivíduo, esta é transformada num atributo criado pelo “realismo sujo” dos mercados, pois todo o “animal humano” é a representação de uma entidade ideal e abstrata que justifica a Igualdade e a compreensão de uma política económica que, com distanciamento político, promova a emancipação de classe e a higiene social.

O Mundo está a mudar e as soluções do futuro confundem-se com uma espécie de nostalgia futurista. É como o anúncio dos primeiros dias do último milénio, uma atmosfera onde todos os sonhos perderam o brilho fulgurante do technicolor. Sobra apenas a mutilação das cores na manipulação monótona da Ideologia.

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