Prevenção da corrupção: existe vontade política?
Leia aqui o artigo de opinião da sócia na área de criminal, contraordenacional e compliance da PLMJ, Alexandra Mota Gomes, sobre a prevenção da corrupção.
Portugal é um dos países com mais casos mediáticos de corrupção envolvendo altos cargos públicos e políticos, banqueiros, empresários, gestores, entre outros ilustres.
De dia para dia somam-se em tribunal processos mediáticos de corrupção que aguardam por decisão judicial.
E a decisão política, onde anda ela?
Para lá das inúmeras Comissões Parlamentares de Inquérito para se discutir o que aconteceu e como aconteceu, escasseiam na Assembleia da República as discussões sobre como evitar e como prevenir para que não mais volte a acontecer.
É indiscutível que a corrupção é um fenómeno de natureza global que afeta o desenvolvimento económico das sociedades, constitui um sério obstáculo ao bom e normal funcionamento das instituições, quer públicas quer privadas, e põe em causa a confiança dos cidadãos na democracia.
Portugal não é exceção e tem visto a sua reputação no mercado internacional afetada por força dos casos mediáticos de corrupção que proliferam na comunicação social.
Não obstante, a verdade é que Portugal é o país europeu que menos cumpre as recomendações do Conselho da Europa contra a corrupção.
Mas ninguém parece querer mudar este cenário.
Os nossos vizinhos europeus apresentam quadros radicalmente diferentes. No Reino Unido, o Bribery Act 2010 impulsionou a legislação anticorrupção de vários países, através da criação de mecanismos de prevenção do risco de corrupção. Em Espanha, foi aprovada a Lei Orgânica 1/2015, que procedeu à alteração do Código Penal, estabelecendo, em especial, um regime de prevenção de ilícitos. Em França foi aprovada a Lei Sapin II (2016) que, além de impor a implementação de mecanismos de prevenção de corrupção, criou uma Agência Anticorrupção para assegurar o cumprimento da lei. Estas leis anticorrupção têm em comum a possibilidade de atenuação ou mesmo isenção da responsabilidade criminal das pessoas coletivas, na eventualidade de ocorrência de um crime, perante a demonstração da correta implementação de programas de Compliance, o que constitui um incentivo direto às empresas.
Aguarda neste momento publicação, uma Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho destinada à proteção do whistleblower, tanto no setor público, como no privado, que vem impor a obrigação de criação de canais internos para comunicação de denúncias de infrações e a efetiva proteção dos denunciantes contra eventuais retaliações, para além de disciplinar a forma como as autoridades e os próprios cidadãos devem tratar as divulgações públicas de infrações relacionadas com a contratação pública, a proteção do ambiente, a saúde, entre outras.
As entidades publicas e privadas portuguesas, obviamente as de maior dimensão, facilmente podiam ser motivadas pelo legislador a rever as suas políticas e procedimentos internos e a implementar programas de Compliance adequados a prevenir a ocorrência de crimes e a reduzir significativamente o risco da sua ocorrência.
Aguarda o legislador português por mais motivação ou faltam-lhe Diretivas para prevenir a corrupção em Portugal?
Este status quo há muito que reclama do nosso legislador, sempre tão prolífero, uma lei clara, devidamente ponderada e suficientemente abrangente cujo objeto seja não só a repressão, mas, essencialmente, a prevenção do fenómeno da corrupção através da imposição da obrigatoriedade de implementação de políticas que reduzam o risco do seu aparecimento.
Afinal, mais vale prevenir do que remediar…
*Alexandra Mota Gomes é sócia na área de criminal, contraordenacional e compliance da PLMJ.
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