Quando o tédio se senta à secretária

  • Íris Matos
  • 15 Outubro 2025

A verdade é que o tédio profissional não é um estado neutro: é um aviso de que algo se perdeu — seja propósito, desafio ou reconhecimento.

Nos últimos anos, temos assistido a um crescimento silencioso e discreto do fenómeno do boreout, seja nos escritórios e coworks, mas talvez mais ainda nos home offices de todo o mundo. Ainda que o tema seja relativamente recente, ele tem trazido à discussão um estado de espírito já com milhares de anos: o tédio.

Um sentimento que na vida profissional e na rotina de trabalho pode ser tão fatal quanto o stress. Para mim, o melhor antídoto é a junção da transparência e da criatividade.

Acredito que um dos maiores causadores de uma sensação constante de aborrecimento no trabalho é o desalinhamento de expectativas entre a empresa e o colaborador. Estar num cargo sem perspetivas de progressão e sem desafios é como permanecer num solo fértil para a estagnação, onde não se desenvolvem competências e cada dia se torna repetitivo e monótono. Naturalmente, há quem prefira trabalhos com uma rotina mais constante e quem não se importe de estar com as mesmas responsabilidades durante vários anos. Mas arrisco a dizer que a grande maioria de nós gosta de pensar e agir fora da caixa, gosta de desafios e de novos projetos.

E aqui surge a maior reflexão: até que ponto estamos, enquanto líderes e colegas, atentos a estes sinais de aborrecimento? Quantas vezes confundimos silêncio com equilíbrio, ou conformismo com estabilidade? A verdade é que o tédio profissional não é um estado neutro: é um aviso de que algo se perdeu — seja propósito, desafio ou reconhecimento. É fundamental sermos observadores, conhecermos as pessoas com quem trabalhamos e perceber se deve haver alguma mudança para motivar quem está a passar por esta situação. É essencial que as lideranças estejam alerta para este fenómeno porque ignorá-lo é abrir espaço para a apatia, a desmotivação e, até, a perda de talento.

O boreout questiona-nos não apenas sobre o que fazemos, mas sobre como vivemos o trabalho. E, às vezes, a solução é mais simples do que aparenta ser. Desafiar a equipa com um novo projeto, dar palco a novas ideias ou sugerir novas posições dentro da empresa que possibilitem um maior crescimento, podem ser o trampolim de mudança que faz com que deixemos de estar desmotivados a olhar para o computador. Mas além do investimento no percurso profissional, também acredito que é fundamental criar um espaço de trabalho onde se investe na experiência e felicidade da pessoa, de forma a romper com a monotonia e estimular o bem-estar e criatividade no dia-a-dia.

Sou da opinião que a resposta está em cultivar mais humanidade no trabalho. Escutar mais, abrir espaço para a curiosidade, permitir que cada pessoa explore as suas capacidades para lá da descrição de funções. Acredito firmemente que o trabalho é como qualquer tipo de relação: exige atenção, respeito, cuidado, nunca há um dia igual a outro. Mas é isso que nos permite crescer com os desafios que vão surgindo. Só dessa forma se vive feliz e realizado, na vida e no trabalho.

Afinal, quando o trabalho nos desafia e inspira, deixa de ser uma obrigação e transforma-se numa fonte de crescimento — para o indivíduo, para a equipa e para a organização como um todo.

  • Íris Matos
  • People and Operations Manager no IDEA Spaces

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

Quando o tédio se senta à secretária

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião