Prazeres

Nuno Mendes está de volta – e o Santa Joana é a sua nova obra-prima

Rita Ibérico Nogueira,

Santa Joana é o novo restaurante de Nuno Mendes em Lisboa. Escondido num convento, com ingredientes locais e técnicas gastronómicas vanguardistas oferece uma experiência memorável.

No coração de Lisboa, numa rua reservada e dentro de um ainda mais discreto convento, Santa Joana surge como um santuário gastronómico onde a tradição e a modernidade se entrelaçam de forma magistral. O mais recente projeto de Nuno Mendes – chef consagrado que regressou a Portugal em Outubro passado após uma carreira de sucesso em Londres – é um tributo à cozinha portuguesa, elevada por técnicas inovadoras e uma curadoria meticulosa dos ingredientes.

O espaço traduz essa filosofia: um ambiente sofisticado e intimista, onde os interiores minimalistas, assinados por Lázaro Rosa-Violán, dialogam com elementos tradicionais portugueses, como azulejos contemporâneos e madeiras nobres. Na sala principal, os tetos abobadados desvendam, com pompa e circunstância, janelas altas que deixam entrar uma imensidão de luz natural. Numa outra secção do restaurante, sofás de veludo dão o mote para jantares mais intimistas que se estendem noite dentro. Nas paredes, vislumbram-se criações de artistas e ateliers nacionais, como Carolina Vaz, Grauº Cerâmica e Pareidólia, que se inspiraram na história do edifício e nas descobertas arqueológicas para produzir peças exclusivas. A iluminação quente e a paleta de cores neutras criam uma atmosfera acolhedora, que convida à contemplação. O serviço, discreto mas atento, reflete a hospitalidade portuguesa.

No menu, cada prato conta uma história, numa homenagem, segundo Nuno Mendes, “à nossa história mercantil – onde fomos, onde estivemos, o que levámos e trouxemos”. As entradas surpreendem com combinações ousadas e contrastes de textura e sabor. A santola com emulsão de algas, por exemplo, evoca a frescura do Atlântico, enquanto os peixinhos da horta reinterpretados com um toque de tempura japonesa mostram a influência global do chef. Nos pratos principais, o arroz de línguas de bacalhau, cozinhado lentamente num caldo rico e finalizado com ervas aromáticas, remete para as memórias de uma cozinha familiar, mas com um rigor técnico que o transforma numa obra-prima. O leitão confitado com puré de tremoço, servido com um molho de especiarias fumadas, é uma ode às receitas tradicionais, reinventadas com sofisticação. Mas há mais: as propostas desdobram-se entre corações de galinha grelhados com molho pica-pau, presa de porco alentejano com pasta de nozes estufadas, nabos e grelos marinados e assados, panisse de grão-de-bico, chouriço de porco fumado e pickles ou mexilhões de sagres fumados com batata nova assada e molho de alho verde, criações que desvendam receitas tradicionais com o melhor produto da terra e do mar – a base da cozinha portuguesa.

A carta de vinhos, cuidadosamente selecionada, privilegia pequenos produtores nacionais, com especial atenção a castas autóctones e vinhos naturais. Para os apreciadores de cocktails, a casa apresenta criações exclusivas que combinam destilados com infusões de ervas e especiarias portuguesas, resultando em combinações inesperadas.

Santa Joana é uma declaração sobre o futuro da gastronomia portuguesa. Nuno Mendes volta a desafiar convenções e a mostrar que a inovação e a tradição podem coexistir de forma sublime. A cada prato servido, conta-se uma história de paixão, técnica e respeito pelo produto, numa celebração da autenticidade portuguesa traduzida para o presente.

Nuno Mendes, o regresso de um visionário
Com um percurso que o levou de Lisboa a Londres e ao estrelato internacional, Nuno Mendes é um dos chefs portugueses mais inovadores da sua geração. A sua carreira é marcada por projetos disruptivos, como o Viajante, que lhe valeu uma estrela Michelin, e o Taberna do Mercado, onde explorou a riqueza da gastronomia portuguesa num registo mais informal.

Formado no conceituado Culinary Institute of America, Mendes passou por cozinhas de renome, incluindo a do lendário Ferran Adrià, onde aprendeu a desconstruir conceitos culinários e a explorar novas abordagens ao sabor e à técnica. Em Londres, o seu nome tornou-se sinónimo de experiência gastronómica sensorial, atraindo foodies e críticos de todo o mundo.

Apesar do reconhecimento internacional, o seu regresso a Portugal sempre esteve no horizonte. Santa Joana marca essa nova fase, onde traz a sua visão vanguardista para o solo natal, num projeto que equilibra memória afetiva e inovação. O que distingue Mendes é a sua abordagem sensorial e emotiva à culinária. Mais do que pratos tecnicamente perfeitos, o chef procura contar histórias através da comida, resgatando memórias e reconfigurando sabores tradicionais com uma linguagem moderna.

Com Santa Joana, reafirma-se não apenas como um dos grandes nomes da gastronomia portuguesa, mas também como um contador de histórias através do paladar. O seu regresso não é só uma celebração da sua trajetória, mas um novo capítulo para a gastronomia nacional. Se o seu percurso até aqui foi pautado pela vontade de inovar e experimentar, agora é tempo de consolidar essa visão em solo português, criando um legado que honra as suas raízes e aponta o caminho para o futuro.

 

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