Private equity apostam em empresas de contabilidade em Portugal

Os investidores de private equity veem no setor da contabilidade uma aposta atrativa, numa altura em que as empresas deste segmento tentam crescer além da via orgânica para se manterem competitivas.

O crescimento das empresas de contabilidade tem sido feito de forma orgânica, à boleia da sua reputação no setor e numa aposta em relações de longo prazo com os clientes. Mas a rápida revolução digital, aumento da concorrência e necessidade de escalar os serviços têm tornado os investimentos externos mais atrativos. Esta necessidade abre a porta a outras entidades, nomeadamente aos investidores de private equity, que veem neste mercado uma oportunidade. É uma realidade nos EUA e na Europa a que Portugal não escapa.

“A área da contabilidade tem sido tradicionalmente caracterizada por estruturas de partnership e por um crescimento orgânico. As empresas têm crescido através de desenvolvimento interno, relações de longo prazo com os clientes e reforço da reputação, em vez de investimentos externos ou aquisições”, refere um estudo publicado pela Accountancy Europe, entidade que representa 49 organizações profissionais de 35 países e que representa um milhão de contabilistas, auditores e consultores na Europa.

No entanto, “a rápida evolução tecnológica, digitalização e aumento da concorrência têm levado as empresas a investirem mais para se tornarem competitivas. Ao mesmo tempo, os private equity têm identificado oportunidades para investir em empresas de contabilidade, atraídos pelas suas receitas recorrentes, fluxos de caixa e potencial de crescimento. Tem havido um aumento notável dos investimentos de private equity em contabilidade nos últimos anos”, indica a análise que abrange o período de 2015 a 2025, notando que esta tendência começou por surgir nos EUA, mas “rapidamente se estendeu para o Reino Unido e para a Europa”, nomeadamente para Portugal. É, hoje, um dos temas quentes neste setor.

“Esta tendência já existe em Portugal, havendo fundos de capital com participações consideráveis em sociedades de contabilidade e consultoria fiscal”, afirma fonte oficial da Ordem dos Contabilistas Certificados (OCC) ao EContas, explicando que o “International Ethics Standards Board for Accountants (IESBA) tem vindo a analisar com bastante atenção a crescente influência do private equity nas firmas de contabilidade, especialmente no que diz respeito à independência, integridade e objetividade dos profissionais da contabilidade”.

"Esta tendência já existe em Portugal, havendo fundos de capital com participações consideráveis em sociedades de contabilidade e consultoria fiscal.”

Fonte oficial da Ordem dos Contabilistas Certificados

“A temática tem ganhado destaque à medida que fundos de investimento adquirem participações significativas em firmas de auditoria ou contabilidade, criando potenciais ameaças à ética e à independência profissional”, continua a mesma fonte, apontando para as “pressões comerciais para maximizar retornos, que podem conflituar com a obrigação de agir no interesse público, interferência na governação das sociedades, podendo comprometer decisões éticas, e conflitos de interesse, caso o investidor tenha interesses noutras entidades auditadas pela firma”.

A OCC reconhece, ainda assim, que a entrada de investidores de private equity pode trazer vantagens estratégicas e operacionais, nomeadamente o “acesso a capital para investimento em talento e tecnologia, profissionalização da gestão, crescimento rápido e escalável, aceleração da digitalização de processos e aumento da rede de contactos”.

Regulação dificulta aposta na auditoria

Se, por um lado, está a crescer o interesse dos investidores de private equity no setor da contabilidade, os constrangimentos regulatórios fazem com que seja mais difícil investir na auditoria, indica o estudo da Accountancy Europe. “As regras europeias obrigam que as empresas de auditoria sejam detidas na sua maioria por auditores qualificados”, refere, fazendo com que “cerca de 60% dos negócios dos private equity seja com empresas de contabilidade, fiscalidade e consultoria, enquanto 40% envolvem empresas com serviços de auditoria”.

"Os negócios de private equity [na contabilidade] passaram de ser 10 a 20 anualmente antes de 2022 para mais de 100 transações em 2023 e perto de 200 em 2024.”

Estudo da Accountancy Europe

Ainda assim, observa-se um crescimento em ambas as áreas. Enquanto antes de 2022 havia, anualmente, entre 10 a 20 negócios dos private equity no setor da contabilidade, em 2023 esse número foi superior a 100 e cresceu para perto de 200 no ano passado. Na auditoria, e apesar das limitações impostas pela regulação, também há um aumento. A mesma análise revela que os investimentos triplicaram em 2023 e quadruplicaram em 2024, o que “mostra um aumento do interesse apesar dos constrangimentos da legislação”.

Recentemente, em conversa com o ECO, José Carmo, CEO e cofundador da consultora de auditoria C. (antiga Carmo e Cerqueira), revelou ter sido abordado por estas entidades. “Há fundos, como a Explorer, a tentar comprar sociedades de revisores. Já vieram falar connosco para nos tentarem adquirir”, além de terem sido também abordados por algumas das “Big Four”, disse. Mas “não temos interesse em caminhar para aí. Uma coisa é integrar uma estrutura de auditoria, uma PwC ou uma EY, [outra coisa é integrar uma estrutura liderada por um fundo]. Não temos essa ambição”.

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