Descida da retenção na fonte já pode levar a pagar IRS no reembolso de 2026. Veja as simulações

Os reembolsos podem encurtar significativamente no próximo ano e há contribuintes que podem ser chamados a liquidar imposto.

Trabalhadores por conta de outrem e pensionistas vão descontar menos em agosto e setembro para refletir a descida do IRS aprovada pelo Parlamento para este ano, mas, no próximo, podem ser surpreendidos com uma desagradável surpresa. Um exemplo: Um assalariado solteiro e sem filhos com um ordenado bruto mensal de 4.000 euros, que poderia receber 399 euros de reembolso, em 2026, poderá ter de pagar, afinal, 1.432 euros de imposto, segundo as simulações do fiscalista Luís Nascimento, da consultora Ilya, para o ECO. É que a retenção na fonte de IRS é um adiantamento dos contribuintes ao Estado e as contas exatas de IRS são, depois, apuradas no reembolso do ano seguinte, ou seja, o que descontou a menos nos próximos meses poderá resultar num valor a pagar ao Estado e não num valor a receber.

Os cálculos para este exemplo concreto têm apenas em consideração o limite de 250 euros para as deduções das despesas gerais e familiares. “Por isso, se os contribuintes forem disciplinados e pedirem fatura com número de contribuinte noutro tipo de gastos é possível abater mais ao imposto a pagar”, alerta o fiscalista.

O Governo aprovou esta terça-feira, e com um dia de atraso face ao anunciado pelo primeiro-ministro, as novas tabelas de retenção na fonte em sede de IRS, que vão refletir a redução do imposto em 500 milhões de euros, aprovada pelo Parlamento, e compensar, em dois meses, o valor descontado a mais desde janeiro por trabalhadores dependentes e pensionistas. Assim, em agosto e setembro, e de forma extraordinária, salários brutos até 1.136 euros estarão livres de retenção, quando até agosto descontavam 96,63 euros por mês, uma vez que esta isenção se aplicava até aos 991 euros, no caso de um solteiro sem filhos.

Nas pensões, não haverá lugar a retenção na fonte até aos 1.116 euros para um solteiro, divorciado, viúvo ou casado (dois titulares), quando até aqui este reformado descontava a partir dos 992 euros mensais. Isto significa um ganho, em agosto e setembro, de 67,3 euros por mês.

A partir de outubro e até ao final do ano, estarão em vigor outras tabelas já sem o efeito do mecanismo da retroatividade aplicado em agosto e setembro, de acordo com o documento publicado esta terça-feira no Portal das Finanças.

Deste modo, em outubro, a retenção na fonte volta a aplicar-se a remunerações mensais a partir dos 992 euros mensais. Ou seja, pontualmente, as taxas baixam mais em agosto e setembro e depois, em outubro, novembro e dezembro, são atualizadas face às que estão em vigor até agosto, em linha com a redução do IRS aprovada pelo Parlamento. A taxa mais baixa, de 13%, recua para 12,50%, a de 16,50% diminui para 16% e a de 22% baixa para 21,50%.

No entanto, é preciso ter em atenção que menos descontos agora pode significar imposto a pagar para o ano, se o IRS entregue ao Fisco este ano for inferior ao efetivamente devido. Por exemplo, um trabalhador por conta de outrem solteiro e sem filhos com 1.300 euros de vencimento bruto retinha na fonte cerca de 155 euros, entre janeiro e julho. Em agosto e setembro, vai passar a entregar a Fisco apenas 3,5 euros por mês. A partir de outubro, já com as “tabelas normais”, sem o o efeito de retroatividade, vai descontar 76 euros por mês. No entanto, em vez deste contribuinte ter direito a um reembolso de 129 euros, arrisca pagar 151 euros.

No caso de um ordenado superior, de 2.000 euros mensais brutos, o trabalhador que poderia ter direito a um reembolso de 205 euros pode ser chamado a pagar 435 euros de imposto, pelo facto de ter descontado menos nestes últimos meses do ano. Entre janeiro e julho, reteve cerca de 373 euros. Em agosto e setembro, vai descontar apenas 22 euros mensais e, a partir de outubro, a retenção mensal passa para 424 euros, segundo as contas da Ilya.

Para um contribuinte, também solteiro e sem filhos, com um salário bruto de 4.000 euros, os descontos vão baixar de cerca de 1.250 euros por mês, entre janeiro e julho, para 211 euros mensais, entre agosto e setembro, e depois sobem para 1.437 euros, entre outubro e dezembro. Se o Governo não tivesse mexido nas tabelas de retenção, este trabalhador iria ter direito a um reembolso de 399 euros, no próximo ano. Em vez disso, vai ser chamado a pagar 1.432 euros de imposto.

Noutro exemplo, um casal com dois filhos, ambos a ganhar 1.500 euros, iriam ser ressarcidos em 113 euros pelo Fisco no próximo ano pelo imposto retido a mais. Em vez disso, terão de liquidar 498 euros de IRS, de acordo com as simulações da Ilya. Isto porque a retenção na fonte baixou de cerca de 163,5 euros mensais, entre janeiro e julho, para zero, entre agosto e setembro, e 184,3 euros por mês, entre outubro e dezembro.

Mas há situações em que os descontos baixam e, ainda assim, os contribuintes continuam a receber reembolso. É o caso de uma família de dois pensionistas a ganhar entre 1.300 e 1.500 euros por mês cada um. No primeiro exemplo, em vez de terem direito a um cheque de 814 euros serão ressarcidos em pelo menos 309 euros, em 2026. No segundo exemplo, em vez de receber 776 euros vai ter um encaixe de 57 euros.

Um reformado solteiro, único titular, a ganhar 1.300 ou 1.500 euros também continuará a ter direito a reembolso, mas baixa de 407 euros para 155 euros e de 388 euros para 29 euros, respetivamente, de acordo com os cálculos da Ilya para o ECO.

A baixa da retenção na fonte reflete a descida do IRS em 500 milhões de euros, proposta pelo Governo e viabilizada pela Assembleia da República, determina reduções do imposto entre 0,40 e 0,60 pontos percentuais (p.p.) até ao oitavo escalão de rendimentos.

Em concreto, a taxa do primeiro escalão vai descer de 13% para 12,5%, a do segundo de 16,5% para 16%, a do terceiro de 22% para 21,5%, a do quarto de 25% para 24,4%, a do quinto de 32% para 31,4%, a do sexto de 35,5% para 34,9%, a do sétimo de 43,5% para 43,1% e, por último, a do oitavo de 45% para 44,6%. A taxa do último escalão de rendimentos continua nos 48%.

Simulações apresentadas pelo Governo mostram que esta nova descida do IRS vai fazer subir o salário líquido entre dois e 15 euros por mês.

Quem ficou desempregado será excluído da medida

O Governo optou por reduzir mais as taxas de imposto em agosto e setembro para “compensar” os descontos efetuados em excesso desde janeiro. Porém, esta solução não irá cobrir todos os casos. Ou seja, quem não tiver rendimentos de trabalho ou pensões em agosto ou setembro não irá beneficiar desta descida suplementar das tabelas de retenção na fonte, ainda que tenha descontado a mais ao longo do ano. Nestas situações estão trabalhadores que ficaram desempregados ou que passaram de assalariados a recibos verdes.

Por outro lado, quem mudou de emprego e teve aumentos salariais ou quem estava desempregado e passou a ter um vínculo de trabalho por conta de outrem vai sair a ganhar, porque o Fisco vai aplicar as tabelas de setembro e outubro considerando que aquele contribuinte obteve aquele rendimento mensal desde janeiro.

O Ministério das Finanças esclareceu, no ano passado, quando aplicou o mesmo mecanismo que, como as tabelas de retenção são adiantamentos do imposto ao Estado, no próximo ano, na altura da liquidação do imposto, serão feitos os acertos necessários. Quem descontou a mais, terá um reembolso menor e quem descontou menos poderá ser chamado a pagar a diferença.

Empresas podem acertar retenções mais tarde se não aplicarem tabelas em agosto

As empresas e outras entidades empregadoras têm de aplicar as novas tabelas de retenção nos salários de agosto, mas se não o conseguirem fazer nesse mês podem corrigir os valores mais tarde, até ao fim do ano. A salvaguarda está consagrada no despacho do Governo que fixa as novas tabelas de retenção na fonte, publicado esta terça-feira no Portal das Finanças.

A garantia diz respeito às taxas de retenção de agosto e setembro, que têm valores especialmente mais baixos do que as de janeiro a julho, para compensar os contribuintes do valor retido nos primeiros sete meses do ano com base numa versão do IRS diferente da que se aplicará aos rendimentos de 2025, porque, entretanto, o parlamento reduziu as taxas do IRS do 1.º ao 8. escalão.

A possibilidade teórica de fazer a correção ao valor da retenção de agosto e setembro é válida quer para as entidades que pagam salários (como as empresas, os serviços públicos ou as IPSS), quer para as entidades pagadoras de pensões (como a Segurança Social e a Caixa Geral de Aposentações).

No texto assinado pela secretária de Estado dos Assuntos Fiscais, Cláudia Reis Duarte, fica previsto que “nas situações em que as retenções na fonte sobre os rendimentos do trabalho dependente e de pensões pagos ou colocados à disposição entre 1 de agosto e 30 de setembro de 2025 não tenham sido efetuadas de acordo com as tabelas previstas no nº 2 [do despacho], a entidade sobre a qual recai a obrigação de retenção pode proceder à retificação nas retenções a efetuar nos meses seguintes, até ao mês de dezembro de 2025, inclusive”.

Apesar disso, o Governo espera que, ao dar a conhecer as tabelas neste momento, as entidades pagadoras ainda consigam aplicar as novas tabelas em agosto, incluindo a Segurança Social e a Caixa Geral de Aposentações.

Questionada pela Lusa sobre o assunto, a secretária de Estado dos Assuntos Fiscais lembra que, no ano passado, as tabelas foram conhecidas com uma distância temporal mais curta em relação ao momento do processamento dos rendimentos e, mesmo assim, “a generalidade dos agentes económicos conseguiu adaptar os seus sistemas”, por isso, “a expectativa” para 2025 “é que o consigam fazer” a tempo.

“Não obstante, se algum agente económico, algum empregador ou pagador tiver dificuldades e não conseguir logo no mês de agosto, pode fazer o acerto nos meses seguintes até ao fim do ano, de resto, como também já aconteceu com as tabelas do ano passado”, afirma, em declarações à Lusa.

Em 2024, ano em que o IRS também baixou a meio do ano, as novas tabelas de retenção foram conhecidas a 26 de agosto, para serem aplicadas em setembro. Como nessa altura a Segurança Social já tinha pensões processadas, só aplicou as novas taxas em outubro, fazendo a respetiva correção.

No entanto, este ano, o Governo conta que os pensionistas recebam os valores corretos logo desde o início. “A expectativa é que os pensionistas possam ver esta redução refletida já no mês de agosto”, afirma a secretária de Estado.

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