Derrama Municipal sobre rendimentos do estrangeiro – afinal uma saga inacabada

  • Catarina Gomes Correia
  • 9:30

A contradição entre decisões arbitrais motivará os contribuintes a convocar a apreciação do tema pelo Supremo Tribunal Administrativo em sede de recurso para uniformização de jurisprudência.

Na sequência do Acórdão n.º 0924/17 do Supremo Tribunal Administrativo (STA), foram inúmeras as decisões arbitrais proferidas junto do CAAD no sentido de os rendimentos gerados no estrangeiro estarem excluídos de derrama municipal. Entre outros fundamentos, o facto de a derrama municipal apenas dever incidir sobre rendimentos que tenham uma ligação territorial a um determinado município, o que legitima a sua cobrança em virtude da receita ser destinada ao financiamento das autarquias locais. Deste modo, diversas sociedades residentes em Portugal, que obtiveram rendimentos no estrangeiro, encetaram contenciosos tendentes a recuperar a derrama municipal paga em excesso.

Quando se pensava que o tema estava consolidado na jurisprudência (apesar de existirem algumas decisões contrárias), eis que começam agora a surgir decisões arbitrais com um fundamento de improcedência totalmente inovatório – v.g., as Decisões Arbitrais n.os 631/2024-T, 950/2024-T, 1060/2024-T, no sentido de que os rendimentos oriundos do estrangeiro só poderão estar excluídos de derrama municipal se puderem ser imputáveis a estabelecimento estável aí situado e/ou se não se tratarem de rendimentos passivos (juros, dividendos, etc.), pois estes derivam de decisões de investimento e gestão necessariamente tomadas na sede em Portugal.

Todas aquelas decisões têm em comum o Prof. Dr. Rui Duarte Morais como árbitro-presidente, que antes advogava pela exclusão dos rendimentos gerados no estrangeiro da derrama municipal, mas assume agora uma mudança expressa de posição.

Recentemente, também o próprio STA (Acórdão n.º 0560/22.5BEALM), proferiu semelhante entendimento quanto à necessidade de existência de um estabelecimento estável situado no estrangeiro para excluir de derrama municipal os rendimentos do estrangeiro. Curiosamente, nesse caso, estava em causa um serviço (atividade operacional) prestado localmente no estrangeiro e, mesmo assim, o STA decidiu desfavoravelmente ao contribuinte apenas porque não existia um estabelecimento estável.

Mais recentemente, pela Decisão Arbitral n.º 1121/2024-T (Prof. Fernando Araújo como árbitro-presidente) surge pela primeira vez uma pronúncia (ainda que implícita) contrária à tese do estabelecimento estável.

A contradição entre decisões arbitrais (seja na tese clássica, seja na tese inovatória) e até mesmo entre decisões arbitrais e o STA e entre decisões do STA é evidente, o que motivará os contribuintes a convocar a apreciação do tema pelo STA em sede de recurso para uniformização de jurisprudência. Até ao momento, não se conhece nenhuma decisão nesta sede.

Para nós, parece evidente que a conexão ao município é essencial para justificar a cobrança deste tributo. Acresce que, à semelhança do que sucede com uma pessoa singular, também uma empresa pode receber rendimentos do estrangeiro, sem que para o efeito seja necessário deter aí um estabelecimento estável.

  • Catarina Gomes Correia
  • Associada Sénior na Área Fiscal da MFA Legal

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