
Reforma ou Invalidez Permanente do Estado?
Mais do que nunca, a economia, os cidadãos e as empresas precisam de condições reais para um melhor desempenho económico, com vista ao bem-estar social.
Longe vão os tempos em que as necessidades de uma sociedade – para o bom funcionamento do Estado – se resumiam maioritariamente à defesa coletiva. Entretanto evoluímos e as exigências para nos relacionarmos com o dito Estado, com a economia e uns com os outros, são bem mais alargadas.
Estas relações são, na maioria das vezes, pautadas pela discrição, nem damos conta a menos que nos confrontemos com a inevitabilidade do pagamento de impostos, taxas e taxinhas por oposição ao benefício imediato do cidadão.
Em nome das necessidades coletivas, entidades e instituições procuram atingir meios económicos suficientes para suportar os encargos inerentes a essa satisfação. São as receitas o suporte das despesas efetuadas em nome do superior interesse público.
Há uns dias, o Governo anunciou que vai “mesmo fazer a reforma do Estado e uma guerra à burocracia”, ainda que seja um processo duro e que origine resistências. É agora que vamos sair do ranking dos países mais burocráticos da Europa? Podemos fazer um cocktail de Verão: juntar ao caldeirão da burocracia a que todos nós – cidadãos, entidades públicas e organizações privadas – somos sujeitos, a confusão dos portais da Administração Pública. Só nestas últimas semanas o portal da Segurança Social Direta e o Portal das Finanças, estiveram em convalescença.
A ingénua cidadania fiscal que se tem acentuado nas últimas décadas serve de justificação para o elevado crescimento que a rubrica “coimas” apresenta nos últimos Orçamentos de Estado, que, se comparada em percentagem de PIB compreendemos a importância que estas “coimas” representam em termos de receita global.
Se por um lado temos algum – para não dizer bastante – desconhecimento fiscal por parte do contribuinte, por outro, assistimos à produção em catadupa de legislação fiscal. Receita quase sempre certa para o adensar da confusão e da burocracia, ficando o cidadão cada vez mais refém do “poder do porteiro”, que é como quem diz, da “interpretação e do especial favor”.
Um exemplo vale mais que mil palavras, não é verdade? Em 2007, também o País pretendeu simplificar, com a introdução da Informação Empresarial Simplificada (IES) tendo como propósito reunir num só documento a informação que é necessária para 4 entidades: a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), o Instituto de Registos e Notariado (IRN), o Banco de Portugal (BdP) e o Instituto Nacional de Estatística (INE). Apesar da origem da criação da IES pretender ser o princípio da simplificação, modernização e informatização de forma a evitar duplicações de pedidos de outras entidades, passados 18 anos – dezoito anos! – esse objetivo não está cumprido na sua totalidade, pois de forma avulsa as entidades são obrigadas a vários reportes.
Mais, criaram-se obrigações declarativas em duplicado para que possam, cada uma per si, serem enviadas para a AT e para a Segurança Social (SS). É isso que sucede todos os meses com os processamentos dos vencimentos dos trabalhadores, uma declaração para a SS e outra para a AT. E como se estas 24 declarações não fossem o bastante, ainda há a obrigação de, em Janeiro do ano seguinte, enviar à AT a declaração anual de remunerações (que é a soma das 12 anteriores).
Mas não fiquem a pensar que o complicómetro é só nas finanças. Imaginem que precisam de atualizar o registo comercial (no Instituto dos Registos e Notariado, INR) de uma entidade. Prazo atual normal de atualização de registos e consequente emissão de certidão permanente: 4 meses! – quatro meses! Obviamente que existe a taxa de urgência que anda à volta dos 350 euros que resolve o assunto em menos de 30 dias.
Mas para que serve essa atualização de registo comercial? Sem ela, não há nova certidão permanente, não há novo RCBE (Registo Comercial do Beneficiário Efetivo), não há como aceder a contas bancárias, ficando as entidades reféns da burocracia, dos seus tempos e das suas vontades, todas estas alheias às necessidades das empresas.
Mais do que nunca, a economia, os cidadãos e as empresas precisam de condições reais para um melhor desempenho económico, com vista ao bem-estar social. O sucesso da mudança não depende apenas da força legislativa. É necessário o envolvimento de todos os intervenientes, para que possa ser (re)construída uma administração pública, que respeite o cidadão – seja singular ou coletivo – e seja atuante em transparência e com princípios, sem criar ainda mais entropias, contribuindo para um desenvolvimento plural.
Que o legislador atenda ao mais absoluto de respeito pelos direitos, pelas liberdades e pelas garantias que se aplicam a todo e qualquer cidadão e contribuinte, e que de forma tão magistralmente constam em vitral no salão nobre da sede do Ministério das Finanças, em Lisboa, da autoria de Carlos Calvet, “Exactidão de Contas por Direito Certo”, é o desejo de todos nós.
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