BRANDS' Local Online Vasco Morgado: “O Estado deve parar de olhar a cultura como um nicho”
A freguesia de Santo António tem 3 teatros a funcionar no Parque Mayer, algo visto pela última vez na década de 90. Em entrevista ao ECO Local, o presidente reforça o papel da poder local na cultura.
Nascido entre ensaios e peças de teatro, Vasco Morgado é, além de presidente da Junta de Freguesia de Santo António, um acérrimo defensor da promoção da cultura. Filho dos atores Vasco Morgado Jr e Vera Mónica, o autarca vê com orgulho o facto de ter ajudado a levar um terceiro teatro ao Parque Mayer, que agora conta com a Tenda, o Teatro Maria Vitória e o Cineteatro Capitólio.
Não tem dúvidas de que a cultura, em todas as suas expressões, deve estar ao alcance de todos, um dos motivos que levou a junta que lidera a organizar o ciclo de Conferências ao Parque. A estreia aconteceu a 5 de junho com o tema “Cultura e os Desafios do Poder Local”, que serviu de pontapé de partida para várias sessões sobre temas pertinentes da atualidade. O ECO Local falou com Vasco Morgado sobre a iniciativa, a relação das autarquias com os agentes culturais e o papel do Estado no apoio ao setor.
Cultura e os Desafios do Poder Local foi o tema que deu o pontapé de partida ao ciclo de Conferências ao Parque. Para alguém que, como foi dito durante o evento, caiu no caldeirão da cultura quando era pequeno, qual é a importância de dedicar um dia de reflexão e debate em torno deste tema?A cultura em Portugal tem sido sempre tratada como um daqueles parentes de quem todos gostamos, mas de quem só nos lembramos quando precisamos de alguma coisa. O tema da cultura deve estar sempre no léxico de todos. Dedicar um dia ao tema com os painéis que conseguimos ter é, sem dúvida, a prova de que o saber não ocupa lugar. É um privilégio ouvir e sentir o pulso a tantos que efetivamente são uma mais-valia para a área, em conjunto com muitos outros que não vieram nesta oportunidade, mas que de certeza marcarão presença nas próximas conferencias sobre o tema.
Como autarca, o que considera que pode e deve ser melhorado na relação do poder local com os agentes culturais?O que deve e tem que ser efetivamente melhorado são as competências das câmaras municipais e freguesias, pois só com decisão direta e local podemos estar cada vez mais próximos das pessoas e da cultura.
O Parque Mayer não tinha três teatros a funcionar em simultâneo desde a década de 90. Que planos tem para este espaço que apontou como o coração da cultura do país?Como diz o atual presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Carlos Moedas, o Parque Mayer que se quer atual, como uma espécie de Parque Mayer 2.0, tem de ser um local que seja considerado uma “aldeia cultural”. Ao abrir este horizonte, estaremos a potenciar o mercado cultural de forma sustentada e estratégica. Estaremos a preparar o futuro. A formação de profissionais num ambiente de partilha e intercâmbio fomenta a necessidade e o ensejo de conjugar esforços com outras culturas.
Este espaço de ensino renovado é o palco onde poderemos cruzar todas estas diferentes realidades e reencontrar um local onde a internacionalização possa voltar a ser verdade. Quando tempos negros assolam a Europa, permitamos que Lisboa, cidade branca, contribua com a sua melhor nitescência. Queremos um Parque Mayer urbi et orbi, ou seja, para a cidade e para o mundo.
No evento esteve ainda presente o Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Carlos Abreu Amorim, que reforçou o compromisso do Governo para com a cultura e elencou algumas medidas que o executivo pretende fazer avançar. Entre elas, a revisão do estatuto dos profissionais da cultura. O que é, na sua perspetiva de autarca e de alguém muito próximo da cultura portuguesa, essencial que o Estado central faça para apoiar este setor?Para começar, o Estado deve parar de olhar a cultura como um nicho. Estes últimos anos foram um descalabro, marcados pela separação do “nós” e “eles”. A cultura, seja ela qual for, tem de ser vista como um todo, porque tudo é cultura e quem decide do que gosta é o ser humano por si mesmo – pode ir desde um pintor renascentista até à Revista à Portuguesa ou mesmo uma banda desenhada do Tio Patinhas. O tempo dos educadores do povo já passou há muito. Há espaço para tudo, desde o erudito ao popular. Temos de parar com a cultura do cancelamento higiénico woke porque isso já existiu e tinha um nome: censura! Acho que, por exemplo, a carteira profissional [de artista] devia voltar a existir, assim como a criação de uma “Ordem dos Artistas” para ajudar e defender o setor.
Este ciclo de Conferências no Parque é para continuar. Por que razão é esta uma grande aposta da Junta de Freguesia de Santo António?Claro que sim! É importante fazer conferências deste tipo, onde o problema é tratado por “tu”, sem dogmas, credos ou politiquice. Os problemas existem, temos de os encarar de frente e dar uma resposta concreta.
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