Pressão dos salários nas autarquias aumenta desde a troika
Acréscimo de despesa com pessoal já representa, na média nacional, um terço das despesas municipais, mostra o Anuário Financeiro relativo a 2023. “Impacto pesado” é reconhecido pelos autarcas.
As despesas com pessoal somaram no ano passado 3.717 milhões de euros, representando 33,1% do total da despesa realizada pelos municípios, resultado de um crescimento homólogo de 13,6%. Em apenas um ano, o acréscimo cifra-se em 444 milhões de euros, revela o Anuário Financeiro dos Municípios Portugueses.
Na média nacional dos 308 municípios, a despesa com pessoal supera historicamente a realizada com aquisição de bens e serviços, mas nunca como em 2023 pesou tanto nas despesas totais. Só nestes últimos três anos, a despesa com pessoal cresceu 981 milhões de euros. Um desempenho que é explica por um lado pelo aumento salarial médio de 3,9% dos funcionários do Estado, o descongelamento das carreiras, mas também pelo aumento do número de funcionários nas autarquias decorrente da transferência de poderes para as câmaras.
Numa análise produzida a partir do ano 2013 — um ano antes do final do programa de ajustamento a que Portugal esteve sujeito, correntemente descrita como “a saída da troika” –, o documento salienta que “menos favorável [do que a melhoria do peso do investimento direto nas despesas totais] foram os acréscimos do peso despesa com pessoal na despesa total, pese embora o mesmo tenha decorrido da recuperação salarial após [a] troika e [do] descongelamento das carreiras na Função Pública, melhorando assim o bem-estar social.”
Neste anuário desenvolvido pelo Centro de Investigação em Contabilidade e Fiscalidade (CICF) do Instituto Politécnico do Cávado e Ave (IPCA), os autores notam que o aumento da despesa com pessoal começou a verificar-se a partir de 2016, quando subiu 1,6% (acréscimo de 35,6 milhões de euros). A partir daqui, a evolução foi de 3% em 2017, 5,5% em 2018, um “aumento significativo de 7,7% em 2019 (189 milhões de euros mais), 3,8% no primeiro ano pandémico e, depois, o regresso às subidas elevadas: 7,9% em 2021, 10,9% em 2022 e, no balanço mais recente, 13,6%.
A propósito deste acréscimo, Ribau Esteves, vice-presidente da Associação Nacional dos Municípios Portugueses (ANMP) e autarca de Aveiro, salientou, durante a apresentação do Anuário Financeiro, precisamente “as valorizações salariais de funcionários públicos”. Deixando nota de que se trata de algo que merece ser saudado, indicou o “impacto pesado, sobretudo nos municípios mais dependentes das transferências do orçamento do Estado”.
O estudo aponta que “o peso das despesas com pessoal na despesa total paga de cada autarquia” é “um indicador importante de análise e de condicionamento económico-financeiro da sua atividade”.
Mais ainda quando chega a superar metade das despesas totais, como sucedeu com Santa Cruz das Flores (50,4%) e Castelo de Vide (50,1%), ambos acima da fasquia dos 50% pela primeira vez neste horizonte 2013-2023. Nota ainda para Redondo, o terceiro mais onerado em despesas de pessoal (49,7%), mas que em 2019 e 2020 atingiu os 56,2%.
“Poderá ser preocupante para o desenvolvimento da atividade municipal nos diversos domínios das suas competências, a situação dos municípios que afetam metade ou mais dos seus recursos financeiros a despesas com pessoal”, notam os autores do anuário.
Se baixarmos a fasquia da análise para os 45%, temos mais uma dezena de municípios a considerar: Alcácer do Sal, Sardoal, Tarouca, Mesão Frio, Peniche, Figueiró dos Vinhos, Serpa, Alcochete, Barrancos e Borba. Pressionando ainda mais a fasquia, para os 40%, cabem 35 autarquias, “na sua maioria, municípios de pequena dimensão (trinta), sendo cinco de média dimensão”, aponta o estudo.
No lado oposto estão um sexteto de municípios que não chegam a alocar um quinto da dotação das despesas totais ao pessoal, variando entre os 15,5% do Nordeste e os 19,7% de Velas. Neste “Top6” entram ainda Sintra, Arcos de Valdevez e Cascais. Entre elas, a autarquia liderada por Basílio Horta já chegou a ter o dobro deste rácio de despesa em pessoal face à despesa total, quando, em 2017 e 2018, superava os 37%.
Nota ainda para a capital. Lisboa emprega 6,1% do total de trabalhadores autárquicos do país, mas os 299,9 milhões de euros pagos em 2023 representaram 8,1% das despesas nas 308 autarquias.
Alargando a análise ao nível distrital, o de Lisboa “consome 20,6% do total pago pelo setor autárquico ao pessoal das autarquias ao totalizar 767,4 milhões de euros nesta despesa municipal, sendo que neste distrito a mesma cresceu 10% em 2023”. O distrito do Porto surge em segundo lugar, mas apesar de ter aumentado 16,5% no valor alocado ao pessoal, apenas paga 65,9% do valor total do distrito de Lisboa.
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