Cascais e Oeiras desenham eixo alternativo à A5

Fazer fletir o perfil de via rápida a EN117 para leste até ao Autódromo do Estoril é um plano de Oeiras. Cascais projeta via que entrelaça com esta, a partir de Tires.

Isaltino Morais, presidente da CM Oeiras e Carlos Carreiras, presidente da CM Cascais, têm projetos geograficamente confluentes para dar às populações e empresas uma verdadeira alternativa de mobilidade à A5

Os autarcas de Oeiras e de Cascais pretendem implementar um eixo que acompanhe a A5 a norte e proporcione uma alternativa de mobilidade a esta via concessionada à Brisa e atualmente com volumes de tráfego que provocam congestionamento do trio de vias ao longo de quilómetros durante as horas de ponta. A posição da Brisa merece críticas veementes de Isaltino Morais, conforme ficou patente na conferência Smart Mobility, organizada pelo ECO e pela Parques Tejo.

O troço nascente da nova via alternativa à A5 inicia-se na EN117, via rápida também designada de “Cabos d’Ávila” (em alusão à antiga fábrica existente no concelho da Amadora). Sempre dentro do território de Oeiras, a partir dali a estrada segue para oeste por Carnaxide, Queijas e Barcarena, até Trajouce, com a auto-estrada concessionada à Brisa a sul e o IC19 a norte, explicou Isaltino Morais durante o debate com Carlos Carreiras, moderado pelo ECO/Local Online.

No lado de Cascais, Carlos Carreiras já tem pronto o projeto, assegurando estar consensualizado com a Brisa entroncar a nova via rápida na A5 na zona do aeródromo de Tires, para onde está projetado um novo nó desta autoestrada. Dali, uma variante seguirá para norte em direção à zona da Tabaqueira, onde necessitará da colaboração de Sintra para chegar ao IC16, e outra chegará ao Autódromo do Estoril, entrando pela autoestrada A16.

“As variáveis estão todas negociadas. Estamos à espera do BRT [Bus Rapid Transit, transporte rápido por autocarro em via dedicada], porque se o BRT vier, a Brisa faz o investimento todo, se não vier, nós temos que fazer parte do investimento e a Brisa faz a outra parte do investimento. Já estão negociados a percentagem e incumbências para a câmara municipal e para a Brisa”, assegura Carreiras.

O autarca admite que a implementação do BRT implicará o aumento do prazo de concessão da Brisa, tema que terá de ser analisado entre a empresa e a comissão criada em dezembro pelo Governo para efetuar a renegociação das concessões.

As variáveis estão todas negociadas. Estamos à espera do BRT [Bus Rapid Transit, transporte rápido por autocarro em via dedicada], porque se o BRT vier, a Brisa faz o investimento todo, se não vier, nós temos que fazer parte do investimento e a Brisa faz a outra parte do investimento. Já estão negociados a percentagem e incumbências para a câmara municipal e para a Brisa.

Carlos Carreiras

Presidente da Câmara Municipal de Cascais

Já Isaltino Morais, que não se coibiu de fortes críticas à Brisa apesar da presença na conferência do administrador executivo da Brisa e CEO da divisão de concessões, Manuel Melo Ramos, admitiu que a via a construir por Oeiras é mesmo para avançar. “Será paralela à autoestrada, e, por acaso, até estamos a pensar portajá-la para fazer alguma concorrência à Brisa, que é para ver se a Brisa… eles não acreditam no que estou a dizer, mas vamos fazer mesmo. Ainda tenho tempo de a fazer, até porque o projeto está muito avançado”.

Isaltino Morais acrescenta que “é indiscutível que, no caso de Oeiras, o desenvolvimento do concelho em termos de ordenamento do território, de atração de empresas, vai ser feito nesse eixo”.

[A nova via rápida a norte da A5] será paralela à autoestrada, e, por acaso, até estamos a pensar portajá-la para fazer alguma concorrência à Brisa, que é para ver se a Brisa… eles não acreditam no que estou a dizer, mas vamos fazer mesmo. Ainda tenho tempo de a fazer, até porque o projeto está muito avançado

Isaltino Morais

Presidente da Câmara Municipal de Oeiras

A partir de Trajouce, a entrada no concelho de Cascais retira o poder de decisão ao autarca que há quatro décadas governa Oeiras (quase ininterruptamente), mas Isaltino Morais assegura que tomou a liberdade de pensar o trajeto para lá da sua fronteira, tendo já um projeto até ao Autódromo do Estoril.

A um par de quilómetros da linha de divisão intermunicipal, um outro projeto, este da câmara de Cascais, prevê também uma via alternativa à A5, revelou, por sua vez, Carlos Carreiras. Iniciando-se junto ao aeródromo de Tires, esta estrada seguirá também a norte da A5 e igualmente até à zona do Autódromo do Estoril, onde já passa a autoestrada A16.

Assim, para fechar o eixo EN117-A16, paralelo à A5 e ao IC19, seria necessária apenas uma consensualização de traçado numa extensão entre algumas centenas de metros e um ou dois quilómetros.

Oeiras e Brisa em contramão

Muito crítico da Brisa, Isaltino aponta críticas à concessionária da autoestrada que o autarca considera determinante para o desenvolvimento de toda a área empresarial de Oeiras, permitindo nestas quase quatro décadas elevar o concelho a segundo mais rico do país – o projeto de construção desta autoestrada passou pelo seu gabinete em 1987, era primeiro-ministro Aníbal Cavaco Silva, e a A5 ainda só ligava o Estádio Nacional ao Viaduto Duarte Pacheco.

Exemplo da relação difícil, a intransigência na construção de um nó no sentido Cascais-Lisboa junto ao Lagoas Park, apesar de a autarquia se ter disponibilizado para assumir o custo de construção de 20 milhões de euros, aponta Isaltino Morais. Referindo-se à nova via rápida paralela à A5, o autarca mostra-se resoluto na afronta à concessionária: “pomos uma portagem [que será] metade da da Brisa. Já vi na legislação e isso é possível. Estamos numa fase de desenvolvimento deste território que necessita de uma nova via estruturante a norte da A5. Quando eu digo, com alguma ironia, que queremos fazer concorrência à A5, obviamente que não é uma questão de concorrência, é uma necessidade vital”.

Estamos numa fase de desenvolvimento deste território que necessita de uma nova via estruturante a norte da A5. Quando eu digo, com alguma ironia, que queremos fazer concorrência à A5, obviamente que não é uma questão de concorrência, é uma necessidade vital.

Isaltino Morais

Presidente da Câmara Municipal de Oeiras

Manuel Melo Ramos, administrador executivo da Brisa e CEO da Brisa Concessão Rodoviária responde ao autarca de Oeiras ressalvando que o planeamento no que concerne às autoestradas é responsabilidade do Estado central, cabendo à empresa gerir as vias de acordo com os termos acordados.

O presidente Isaltino falou muito em planeamento e eu queria aqui lembrar que não compete à Brisa fazer planeamento. À Brisa compete gerir uma infraestrutura, ao concedente compete fazer esse planeamento. Estamos disponíveis para nos sentarmos com o concedente, com as autarquias, e encontrarmos em conjunto uma solução para aquilo que é a evolução das infraestruturas face àquilo que é a evolução do território.

Estado e Brisa já estão a renegociar concessão das autoestradas

A renegociação da concessão da A5 e das restantes autoestradas foi um dos temas referidos nesta conferência realizada em Oeiras.

Miguel Pinto Luz, ministro das Infraestruturas e Habitação, acusou o anterior Governo de não ter dado início à renegociação da concessão das autoestradas com a Brisa, situação que impossibilita a criação de novos nós, a retirada de alguns veículos da classe 2 nas portagens e o estabelecimento de um serviço BRT (Bus Rapid Transit) na A5, por exemplo.

A lei é objetiva, obriga à constituição de uma comissão de negociação nomeada pela UTAP [Unidade Técnica de Acompanhamento de Projetos], em acompanhamento estreito pelas infraestruturas. Essa comissão nunca foi nomeada em oito anos, agora já está nomeada, [mas] entretanto o Governo entrou em gestão”, explicou o governante na conferência Smart Mobilty, aludindo à comissão criada em dezembro.

O nosso maior interlocutor é a Brisa, temos outros, mas a Brisa sabe que nós queremos negociar e queremos rapidamente pôr no terreno não só os investimentos que temos na A5, mas que temos nas outras [concessões de autoestradas] todas.

Miguel Pinto Luz

Ministro das Infraestruturas e Habitação

Em rigor, desde 2018 que existia formalmente uma comissão de negociação, a qual, inclusive, teve nomeações feitas. Em dezembro de 2024, um Despacho do Governo de Luís Montenegro refere a dissolução dessa comissão designada pelo Executivo de António Costa, e a “constituição de uma nova comissão de negociação com referência ao Contrato de Concessão Brisa”.

A necessidade de substituição prendeu-se, explica o Despacho de dezembro, com uma proposta do Instituto da Mobilidade e dos Transportes datada de 23 de outubro de 2024, na qual a entidade apresentou “uma proposta fundamentada para a dissolução da comissão de negociação suprarreferida, acompanhada da constituição de uma nova comissão de negociação”.

Manuel Melo Ramos assegura já ter existido uma comissão anterior à criada pelo atual Governo em dezembro, mas deixa uma ressalva: “havia, mas nunca reuniu e, portanto, ela foi dissolvida”. Confirmando as palavras de Pinto Luz, Melo Ramos diz que “foi nomeada agora uma comissão de negociação, onde estes temas serão abordados e desenvolvidos e essa comissão de negociação está já a trabalhar. As coisas estão a andar”.

Foi nomeada agora uma comissão de negociação, onde estes temas serão abordados e desenvolvidos e essa comissão de negociação está já a trabalhar. As coisas estão a andar

Manuel Melo Ramos

Administrador executivo da Brisa

Por curiosidade, recuando na linha do tempo, aquando da constituição dessa comissão de 2018, o Despacho do Governo de António Costa apontava o dedo à inação da comissão nomeada pelo Governo de Pedro Passos Coelho: “Não obstante a constituição da referida comissão de negociação, o processo de negociação não teve desenvolvimentos, encontrando-se por executar alargamentos previstos no Contrato de Concessão”.

Na conferência do ECO e da Parques Tejo, realizada nesta quarta-feira, Pinto Luz deixou a nota da pretensão de se redefinir “rapidamente” os termos da concessão. “O nosso maior interlocutor é a Brisa, temos outros, mas a Brisa sabe que nós queremos negociar e queremos rapidamente pôr no terreno não só os investimentos que temos na A5, mas que temos nas outras [concessões de autoestradas] todas”.

Entre as novidades desta renegociação espera-se a introdução do BRT, cuja negociação está presa pelo entendimento entre o Estado e a concessionária. “Trata-se de uma questão de lei. Ou seja, há um contrato de concessão. Alterações a esse contrato de concessão, seja a introdução de novos nós com portagem, seja alterações substanciais àquilo que é o objeto do contrato de concessão, obrigam a uma comissão de negociação, é o que está estabelecido na lei”, afirmou Manuel Melo Ramos. Acresce, segundo o responsável da Brisa, que a via dedicada ao BRT não deverá ser retirada às atualmente existentes, mas sim adicionada, o que só pode ser desenvolvido no âmbito do novo contrato. O sistema BRT é a dedicação exclusiva de uma faixa para transporte através de autocarro, podendo ou não admitir também a circulação de veículos que seja ocupados por mais de uma pessoa, para incentivar a redução do número de automóveis na estrada.

A este propósito, Carlos Carreiras não dispensa a construção de uma via em cada sentido, ao invés de uma eventual solução de via única bidirecional que, como, diz, já foi equacionada para o separador central da A5.

Numa conferência dedicada à mobilidade, falou-se também, do lado de Oeiras, do LIOS, via dedicada a transportes que ligará Algés à Amadora, com conclusão prevista para 2030, e da conclusão do projeto SATU . Este veículo monocarril não tripulado, idealizado pelo autarca de Oeiras para ligar as linhas ferroviárias do Estoril e de Sintra, nunca passou de 1200 metros entre a estação de Paço de Arcos e o centro comercial Oeiras Parque. Com a regra da “troika” de encerramento das empresas públicas que dessem prejuízo durante três anos, o SATU foi encerrado por decisão do Governo de Pedro Passos Coelho em maio de 2015, há uma década, apesar de, destaca Isaltino Morais, todo o prejuízo (e eventuais lucros) ser assumido pela empresa concessionária, a construtora Teixeira Duarte, no âmbito do contrato de concessão então em vigor.

Agora, o monocarril será substituído por um veículo articulado elétrico que ligará Paços de Arcos à estação de Barcarena, na raia do concelho de Oeiras, tendo sido descartada a ligação inicialmente prevista, à estação do Cacém, por indisponibilidade da câmara de Sintra em se juntar a este projeto, apontou por seu lado o presidente da Parques Tejo, Rui Rei. Esta nova ligação sobre boa parte do traçado inicial do SATU estará concluída em 2028 ou 2029, prometem os responsáveis de Oeiras, fechando, finalmente, a ligação entre as duas linhas ferroviárias de ligação de Lisboa a Sintra e Cascais, e também à Linha do Oeste, que serve o país junto ao mar, para norte.

Isaltino quer gerir a Marginal

Isaltino Morais defendeu ainda que a gestão da Avenida Marginal, que liga Lisboa a Cascais, deveria ficar a cargo da de Oeiras, em vez de ser a Infraestruturas de Portugal (IP) a responsável. O responsável disse que em termos institucionais as relações entre a autarquia e a IP “são ótimas”, reconhecendo, no entanto, problemas a nível de gestão daquela via.

“A Câmara de Oeiras quer a [gestão da Avenida] Marginal, porque é a câmara que cuida da Marginal. Quando há chuvas fortes, marés vivas, remoção de areias, quando é preciso fechar estradas, somos nós, a IP não faz nada”, salientou. Segundo Isaltino Morais, a Infraestruturas de Portugal “está de acordo em passar a Marginal para a câmara”, bem como o ministro das Infraestruturas e da Habitação, lembrando que “agora começa o planeamento” e que a “vontade política é determinante”.

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