Nem todos foram felizes na sua terra. Veja como se votou nos lugares de onde vêm os líderes dos partidos

Ventura só precisou de meia dúzia de anos para ser o mais votado na mais populosa freguesia do país. Mortágua não chega às quatro dezenas de concidadãos. E os outros? Veja aqui.

Uma dezena de partidos, incluindo o CDS-PP, dentro da coligação AD, vai sentar os seus deputados em São Bento nesta legislatura, mas nem todos levam na bagagem o título de “melhor filho da terra”. Se Luís Montenegro e André Ventura podem ir agradecer aos seus concidadãos pelas vitórias claras, Pedro Nuno Santos deverá estar bem mais cabisbaixo quando chegar ao concelho que o viu nascer, que preferiu colocar as fichas no concorrente laranja.

O primeiro-ministro cessante terá de fazer uma viagem dupla para deixar agradecimentos: à terra onde nasceu e, depois, à freguesia duriense onde brincava na quinta do avô.

Já o líder do Chega, em quem Pedro Passos Coelho fez recair a escolha para candidato autárquico em Loures em abril de 2017, lançando-o na ribalta política, deu os primeiros passos na vida noutro subúrbio de Lisboa, na mais populosa freguesia do país, Algueirão Mem-Martins. Ali, território do concelho de Sintra, Ventura levou a melhor sobre todos os adversários.

Saiba ainda como votaram os concidadãos de Rui Rocha, adotado por Nogueiró, os alfacinhas Rui Tavares e Inês Sousa Real, o setubalense de adoção Paulo Raimundo, a bejense Mariana Mortágua, o madeirense Filipe Sousa e o famalicense Nuno Melo.

Luís Montenegro

Nascido no Porto, mas criado em Espinho, onde tem residência no edifício que continua a ser sede da polémica Spinumviva, o primeiro-ministro cessante conseguiu ali um resultado sólido para a AD, distanciando a coligação dos socialistas e quase igualando o somatório do PS e do Chega. No concelho de Espinho, a AD somou a preferência de 8.072 eleitores, equivalente a 40% do total. O PS obteve 5.116 (25,35%) e o Chega 3.154 (15,6%). Há um ano, a coligação AD vencera por apenas 47 votos.

Entre as duas eleições legislativas, a AD amealhou mais 1.300 votos, o PS perdeu mais de 1.500 e o Chega, terceira força partidária na terra onde Montenegro cresceu, teve um impulso de 500 votos. No que toca à mobilização, os espinhenses ficaram marginalmente aquém da participação do ano passado.

A história de vida do primeiro-ministro cruza-se também com a freguesia de Barrô, no concelho de Resende, onde em criança brincava na quinta do avô materno. Aí, a AD teve praticamente metade dos votos, bem acima do PS. Em 353 eleitores, alcançou mais 77 que os socialistas. Há um ano, a diferença era de nove. Nas legislativas de 2022, era o PS quem liderava, por 15.

Nuno Melo, líder do CDS-PP, na noite eleitoral das legislativas de 2025. Hugo Amaral/ECO

Nuno Melo

Natural de Famalicão, no distrito de Braga, o líder do CDS-PP entrou nas listas da AD como número dois… pelo Porto. Foi eleito este domingo neste círculo eleitoral, logo atrás do social-democrata Paulo Rangel. A AD, coligação do PSD e CDS-PP, venceu em Famalicão, com 36,2% (1881 votos), acima dos 24,6% do PS e 21,9% do Chega.

Na sua freguesia natal, Joane, a coligação alcançou 1.881 votos, equivalentes a 35,5%, acima dos 1.466 votos do PS (27,7%). A última vez que o CDS-PP concorreu sozinho a legislativas, em 2022, a freguesia de Nuno Melo não valeu mais de 87 votos ao partido então liderado por Francisco Rodrigues dos Santos, que se viria a demitir após o desaire eleitoral que deixou os centristas fora do parlamento nacional.

Pedro Nuno SantosJOSÉ SENA GOULÃO/LUSA

O líder socialista acabou por deixar o PS ser superado na sua terra natal, São João da Madeira. No histórico legislativo da década, 2022 é um oásis perante a derrocada deste domingo. Naquela que foi a histórica maioria absoluta de António Costa, São João da Madeira contribuiu com 5.225 votos (45,3%), acima dos 3.499 votos do PSD (30,3%). O Chega estava então em quinto lugar nos resultados finais da terra de Pedro Nuno Santos, com 447 votos, abaixo do Bloco de Esquerda e da Iniciativa Liberal.

Em 2024, já com Pedro Nuno Santos à frente dos socialistas, o PS aguentou a liderança, mas baixou para 37,4%, escolhido por 4.989 eleitores. O PSD do “vizinho” Luís Montenegro, com 29,3% (3911 votos) aparecia de novo em segundo em São João da Madeira, e a fechar o pódio vinha o Chega, com 13% (1726), mais do dobro da IL e quase o triplo do BE.

No domingo, Pedro Nuno “entregou” a sua terra à coligação encabeçada pelo espinhense Montenegro, por uma diferença de 321 votos. O Livre, refira-se, teve 485.

André Ventura

André Ventura, criado no Algueirão Mem-Martins, concelho de Sintra, tem vindo a conquistar o voto dos eleitores da sua freguesia, a mais populosa do país, ao longo desta década. Neste domingo, o Chega, formado em 2019, tornou-se o partido mais votado, com uma subida de cerca de 1.557 votos, ao passo que o PS, partido que governa a freguesia, perdeu 2.110 votos face às legislativas de há um ano. Com isto, em termos de legislativas, o PS passou de primeira a terceira força partidária na terra de Ventura, baixando para 8.150 votos, contra 9.892 do Chega.

Nesta freguesia do concelho de Sintra, o PS viu-se ultrapassado também pela AD, por uma diferença de 249 votos. Olhando para o total do município liderado por Basílio Horta, eleito pelo PS para o terceiro mandato na câmara de Sintra em 2021, o Chega repete a façanha de vencer e relegar o PS para terceira força política. Se no ano passado, o Chega estava a 16 mil votos dos socialistas e atrás da AD por mais de 2.500 votos, neste domingo dominou: 52.868 votos para os cheganos, 50.263 para a coligação de centro-direita e 48.297 para o PS.

Na comparação com os resultados das legislativas de 2022, realizadas há três anos e três meses, a viragem com o município onde Ventura nasceu é ainda mais estrondosa para o balanço do PS. Com António Costa a liderar os socialistas, Sintra contribuiu com mais de 81 mil votos para a segunda maioria absoluta de sempre do partido (após a de José Sócrates em 2005).

Menos de 40 meses depois, o PS tomba de 44% dos votos para 23,8%. Em volume de votos, os socialistas baixaram dos 81 mil votos da maioria de Costa, para pouco mais de 48 mil votos com Pedro Nuno Santos. Já Ventura, quase chega aos 53 mil votos. Em 2022, não atingira os 18 mil, mas no ano passado superou os 44 mil.

Rui RochaANTÓNIO PEDRO SANTOS/LUSA

Nascido no Lobito, em 1970, Rui Rocha é um bracarense “de adoção” desde 1978. Em Braga foi recebido na freguesia de Nogueiró Tenões, onde a IL, com 13,8%, superou o Chega por 91 votos, convencendo 511 concidadãos de Rocha. Já no concelho, a IL alcançou 9,5%, sendo a quarta força partidária, mesma posição que assegura no distrito onde o seu líder foi eleito, e onde não vai além dos 6,8%.

Esta percentagem foi mais do dobro do obtido pela IL no distrito por onde o seu líder foi eleito. Tanto na freguesia como no distrito, a Iniciativa Liberal supera a soma da esquerda, excetuando o PS.

No global do distrito de Braga, a IL é a quarta força política, com 36.687 votos, o suficiente para eleger Rocha para o Parlamento, num dos 19 lugares destinados aos candidatos por Braga. A AD leva oito deputados para São Bento, enquanto o PS e o Chega repartem os dez restantes.

Face a 2024, a maior diferença está na repartição de deputados, com troca de um neste domingo entre PS e Chega, após os primeiros perderem mais de 30 mil votos e os segundos assegurarem um crescimento de cerca de 26 mil.

Por seu lado, o partido de Rocha manteve o quarto lugar e aumentou a votação em 2.700. Já o PSD permanece como líder no distrito de onde é natural o seu secretário-geral, Hugo Soares, mantém os oito deputados e aumentou o apoio com mais 13 mil eleitores, para um total de 198 mil votos.

Rui Tavares

Nascido em Lisboa, por onde foi eleito para a Assembleia da República, o fundador e líder do partido consegue um forte resultado, com 9,4% e 29.605 votos.

Acima, o Chega, com 14,5% (45.740), o PS, com 23,3% (73.366) e a AD, com 31,65% e 99.641 votos. Somando os seus votos ao PS, teriam ultrapassado a AD em quase 4.000 votos – uma nota que poderá acender o debate de possível coligação entre a candidatura de Alexandra Leitão e o partido de Rui Tavares nas autárquicas deste ano. Ainda que, num exercício similar de aritmética simples, somando a IL à AD, daria vitória inequívoca para a direita.

Olhando para as legislativas de 2024, Tavares subiu na votação tal como os partidos Chega e IL. Já a AD e o PS caíram, juntos, cerca de 8.000 votos, o equivalente ao ganho do Chega, ou à soma do crescimento da IL e do Livre.

Paulo RaimundoLusa

Nascido na linha de Cascais, onde os pais trabalhavam no Estoril Futebol Clube, o líder do PCP cedo rumou a Setúbal, onde começou na escola na freguesia rural do Sado. Ali, neste domingo, comparando com 2024, a coligação PCP-PEV não só perdeu a terceira posição nas votações para a AD, como assistiu à ascensão do Chega como a força mais votada, relegando o PS para segundo.

A mesma ordem se estabeleceu no concelho, onde o Chega liderou as preferências, com 27,3%, acima dos 24,1% dos socialistas, os 22,5% da coligação de centro-direita e os 5,9% dos comunistas.

Já na globalidade do distrito de Setúbal, a relação de forças entre os dois maiores partidos alterou-se de forma substancial: o Chega não só passou a primeiro, superando o PS, como somou dois deputados eleitos, totalizando seis, enquanto o PS recuou outros tantos, para cinco. O PCP-PEV manteve um lugar parlamentar pelo círculo de Setúbal. Neste caso, não se trata de Paulo Raimundo, que corria por Lisboa, mas de Paula Silva.

Mariana MortáguaHUGO DELGADO/LUSA

Nascida em Alvito no ano em que Portugal entrou na CEE (hoje União Europeia), a líder do Bloco de Esquerda (BE) esteve nas segundas legislativas enquanto líder do partido. Neste domingo, em Alvito, o BE teve 3,07% dos votos, quase um décimo do obtido pelo Chega, vencedor nestas legislativas.

Há um ano, Mariana Mortágua teve os votos de 84 eleitores e neste domingo foram 37. Na liderança, o Chega, com 28,3%, seguido do PS (27%), da AD (21%) e do PCP-PEV, com 11,62%, mais do triplo dos votos depositados para o BE.

Em todo o distrito do Baixo Alentejo, o Bloco ficou-se por 1,85%, 1.365 votos, menos do que em 2015 conseguira apenas no concelho de Beja, e muito abaixo dos 4,41% de há um ano, ou dos 8,2% de 2015.

No resultado nacional, o BE teve 2% dos votos, muito aquém dos 8,61% obtidos em 2015, ano em que elegeu 19 deputados e foi parte essencial da “geringonça”. Desses 19 de um partido que começou a eleger em 1999 – na altura com dois assentos no Parlamento – resta, em São Bento, uma única deputada, Mariana Mortágua.

Inês Sousa RealMANUEL DE ALMEIDA/LUSA

Com 1,99% no distrito de Lisboa e 1,82% no concelho da capital, é na análise mais micro, à freguesia onde nasceu Inês Sousa Real, Alcântara, que o PAN tem o resultado mais modesto nesta análise, 1,65%. Local onde o PS teve 41%, o PSD 23% e a IL foi a terceira força partidária, com 9,7%, o PAN tem uma votação modesta, como, aliás, se verificou ao longo do país, onde não passou de 1,53%.

Apesar de tudo, Sousa Real conseguiu, in extremis, fazer-se eleger novamente como deputada única do PAN em São Bento.

Filipe SousaLusa

Fundador do Juntos Pelo Povo, com o seu irmão Élvio, este dissidente do PS, que chegou a presidir à junta da freguesia onde nasceu pelos socialistas, é, tal como o seu jovem partido, novato na Assembleia da República. Na freguesia de Gaula, no concelho madeirense de Santa Cruz, o JPP repetiu a vitória obtida nas legislativas de 2024, com 38,6%. A AD somou 27,8%, o Chega atingiu 16,2% e o PS ficou-se pelos 8,2%.

Já no concelho de Santa Cruz, a AD levou a melhor sobre o JPP, como já tinha acontecido há um ano. Dos quatro primeiros, o PS aprofundou o seu papel de quarta força partidária, com menos cinco pontos percentuais (para 10,05%), enquanto os três primeiros ganharam força eleitoral. O PSD teve 32,8%, o JPP 24,6% e o Chega alcançou 20,84%, o dobro dos socialistas.

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