Gestão de resíduos no Algarve entre a inovação tecnológica e os entraves burocráticos

  • ECO
  • 9 Julho 2025

Robôs, algoritmos e circularidade esbarram em regras desajustadas. Participantes no segundo painel da conferência ECO Cidade Albufeira alertam para risco de colapso na gestão de resíduos na região.

A gestão de resíduos urbanos no Algarve enfrenta um momento crítico. O alerta foi lançado no segundo painel da conferência ECO Cidade Albufeira, dedicada à inovação na resposta aos resíduos, onde responsáveis de entidades públicas e privadas identificaram falhas estruturais, desafios sazonais e bloqueios regulatórios como entraves à sustentabilidade.

Isabel Trigo de Morais, CEO da Sociedade Ponto Verde (SPV) alertou que “o sistema não está dimensionado para as necessidades reais da população — nem da residente, nem da flutuante. Vamos andar a passear camiões de resíduos pelo país”. A responsável apontou ainda a injustiça do atual modelo tarifário, indexado ao consumo de água per capita, que penaliza residentes permanentes durante os picos turísticos.

"Não podemos ter uma estratégia única. É preciso adaptar as respostas às diferentes realidades — zonas urbanas, áreas dispersas, territórios turísticos”

José António Pacheco, vice-presidente da CCDR Algarve

José António Pacheco, vice-presidente da CCDR Algarve, reforçou a necessidade de criar soluções segmentadas: “Não podemos ter uma estratégia única. É preciso adaptar as respostas às diferentes realidades — zonas urbanas, áreas dispersas, territórios turísticos”. Destacou ainda os investimentos em curso — cerca de 600 mil euros em projetos de circularidade — mas alertou para os obstáculos burocráticos: “Quando conseguimos aprovar um projeto, muitas vezes já perdeu utilidade. Os processos arrastam-se entre pareceres, concursos e empresas que não concorrem”.

A inovação tecnológica foi um dos pontos centrais do painel. Miguel Nunes, responsável da área técnica e de I&D da Algar, revelou que a empresa já tem em curso dois projetos práticos: a instalação de braços robóticos para triagem de resíduos e sistemas de otimização de rotas de recolha baseados em dados. “A tecnologia existe e pode ser aplicada. Mas temos de resolver o que bloqueia a sua adoção. O problema não é técnico, é estrutural.”

O representante da Algar denunciou ainda as limitações impostas pelo regulador do setor: “Mesmo quando os municípios querem aumentar o número de equipas de recolha para responder ao verão, não podem. Se estão aprovadas 20 equipas na tarifa, não se contratam 40. E se o salário aprovado é 1.000€, não podemos pagar os 1.200€ que o mercado exige. O sistema é pouco flexível para uma economia que muda muito rápido”.

Miguel Nunes destacou igualmente que a adesão das populações continua a ser o maior desafio: “A separação começa em casa. A União Europeia quer fluidez seletiva, mas isso não acontece se os cidadãos não participarem. E não basta investir em tratamento mecânico porque isso não conta para as metas”.

Em estudo está, contudo, uma proposta inovadora: usar dados reais de produção de resíduos para apoiar decisões políticas, como a definição de taxas turísticas ajustadas ao impacto ambiental real. “Há municípios com muita pressão turística que precisam de ferramentas para justificar custos e investimentos. A tecnologia pode dar esse suporte”, explicou Miguel Nunes.

Isabel Trigo de Morais acrescentou que já estão a ser testados modelos de triagem automatizada com inteligência artificial, e defendeu que a inovação tem de premiar quem faz bem. “Mas nem isso conseguimos. Preciso de autorização para pagar melhor desempenho. Levo sete meses a conseguir”.

Apesar das dificuldades, os intervenientes sublinharam a importância de atuar com urgência. “Estamos em incumprimento com Bruxelas nas metas de reciclagem”, lembrou Isabel Trigo de Morais. José António Pacheco concluiu com um apelo à articulação: “Precisamos de visão estratégica, mas também de simplificação. Caso contrário, andamos sempre atrás do prejuízo”.

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