Descentralização não é sinónimo de despesismo, diz Miguel Cadilhe
Apologista da regionalização, Miguel Cadilhe defende que a descentralização regional e municipal não é sinónimo de despesismo.
“Não pode haver dúvidas [de que] a descentralização regional e municipal não é sinónimo de despesismo; pelo contrário, deve ser antónimo do despesismo público tanto quanto possível”, defendeu o antigo ministro das Finanças Miguel Cadilhe, durante a apresentação do livro de Luís Braga da Cruz, na sede da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDR-Norte).
A propósito do despesismo, Miguel Cadilhe lembrou que “foi graças ao centralismo que Portugal caiu no colapso e desonra das finanças públicas por excesso de despesa pública, em 2011, e caiu nos braços pouco amorosos da troika. Foi pelas mãos do centralismo que isso aconteceu, porque o centralismo detém a grande percentagem do Orçamento de Estado, a maior percentagem ainda da dívida pública”.
Apologista do “reformismo” e da “regionalização no Continente“, o antigo ministro das Finanças deixou bem claro que “não são razões históricas que justificam as regiões do Continente”, mas sim, “razões económicas e sociais“, alertando para as desigualdades de desenvolvimento existentes nos diferentes territórios do país.
“Como o autor Luís Braga da Cruz, sou pelo reformismo, incluindo a reforma do Estado. E sou pela plausível porta para realizar a reforma do Estado que é a regionalização do Continente”, frisou o antigo ministro das Finanças que lamentou, contudo, o facto de o processo da “descentralização regional deixar [o país] pessimamente colocado” em relação ao resto da Europa.
Miguel Cadilhe chamou ainda a atenção para a importância de haver movimentos na sociedade. “Há espaço para a sociedade civil, algo mais reivindicativo, com voz mais sonora. O país precisa muito do movimento pelo interior“, defendeu. Citou, por isso, o “caso paradigmático do movimento pelo interior” como um “exemplo de sociedade civil, mas que já tinha predestinada uma certidão de óbito, ou seja, ira desaparecer. Luís Braga da Cruz critica isto” no livro “Crónicas sobre o Douro… e outros temas”.
O antigo ministro lembrou ainda a petição pública pela reabilitação e modernização da linha do Douro que mereceu unanimidade, apresentada pela Liga dos Amigos do Douro Património Mundial, em 2019, como outro exemplo dos movimentos da sociedade. “Foi um pujante momento da sociedade civil. Eu nunca vi algo assim no Parlamento (…) mereceu unanimidade de todos os grupos parlamentares. Cada grupo parlamentar, da extrema-esquerda à direita, fez recomendações em prol do acolhimento da petição pública pela Linha do Douro”, recordou. Criticou, contudo, o facto de “a linha do Douro continuar lamentavelmente subalternizada nas prioridades de investimento público”. Prioridades essas mais relacionadas com o centralismo, apontou.
“Modelo centralizado” do Estado “está esgotado”
Já o presidente da CCDR-Norte, Antonio Cunha, frisou que “o modelo centralizado do Estado e do desenvolvimento socioeconómico – modelo de que atuais CCDR são subsidiárias – está esgotado e todos os dias chegam sinais do seu cansaço”. Para o antigo reitor da Universidade do Minho, “importa ter presente que a coesão territorial não se alcança pela adoção de uma espécie de país médio, por fórmulas uniformes de uma folha de cálculo que, cada vez mais, são arquétipos distantes da realidade que tentam modular e, por isso, apenas aceitáveis para quem desconhece essa realidade”.
As limitações que o presidente Luís Braga da Cruz sentiu no seu exercício, na capacidade de tomar decisões ou de muito simplesmente gerir um orçamento, um património ou um quadro de pessoal são, 30 anos depois, as mesmas que sente hoje o presidente da CCDR-Norte ou ainda mais graves.
Para António Cunha, o país tem um “modelo centralizado e macrocefálico na capital e fragmentado, dependente e envelhecido nos territórios que a ninguém beneficia“. Referiu ainda que “a CCDR-Norte, nos seus mais de 50 anos de história, mais não é do que o ensaio, o laboratório, o amadurecimento do projeto regional, ou seja, de uma governação regional moderna, democrática, de confiança e de proximidade”.
O responsável lamentou, contudo, que “as limitações que o presidente Luís Braga da Cruz sentiu no seu exercício, na capacidade de tomar decisões ou de muito simplesmente gerir um orçamento, um património ou um quadro de pessoal são, 30 anos depois, as mesmas que sente o presidente da CCDR-Norte ou ainda mais graves”.
António Cunha defendeu, por isso, que “não é possível pedir mais a um modelo que, por maior que seja o esforço dos seus protagonistas, se tornou insuficiente para responder aos desafios multiformes e ao tempo rápido dos dias”, concluindo: “Como lembra bem Miguel Cadilhe, no seu prefácio, até o bom controlo central é aliado da boa descentralização”.
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