2023: Ordem para Gastar! – Parte I
Com a pressão para o Governo acelerar a execução das verbas do PRR (e também do PT2030), em 2023 importa gastar rápido e gastar bem, para que o país não perca terreno para os congéneres europeus.
Se 2020 foi o ano em que se começou a definir a estratégia para o período pós-Covid, e 2021 o ano da aprovação do famoso Plano de Recuperação e Resiliência, 2022 terá sido porventura um ano de alguma frustração, com atrasos na execução (como muitos antecipavam) decorrentes, em grande medida, da falta de meios e de preparação das estruturas e organismos públicos para agilizar a execução dos fundos atribuídos a Portugal. Para combater a força da inércia, António Costa e os seus principais ministros, começaram 2023 “ao ataque”, com uma agenda carregada de iniciativas que visam simultaneamente acelerar o ritmo de execução e dar visibilidade à obra em curso.
Em 2023 há por isso ordem para gastar, capitalizando muito do trabalho invisível feito ao longo do ano de 2022, e dinamizando os privados para a execução dos contratos-programa entretanto assinados, seja no âmbito das Agendas de Inovação, dos projectos de descarbonização ou nas iniciativas de digitalização do tecido empresarial. A boa execução destas verbas vai, espera o Executivo, funcionar como dínamo para a economia portuguesa, contrariando as dificuldades trazidas pela inflação e pela subida dos juros, e permitir ao país superar os riscos de estagnação ou crescimento tíbio que a maioria dos analistas vaticina para boa parte das economias do espaço europeu.
Ainda em 2023, e para além do PRR, são igualmente esperadas diversas calls no âmbito do PT2030 (o conjunto de programas de fundos europeus para o período de programação 2021-2027), através do qual serão aplicados em 12 programas de intervenção em áreas e geografias específicas mais de 23 mil milhões de Euros. Fica claro, portanto, que não será por falta de dinheiro disponível que o país deixará de fazer os investimentos considerados necessários para continuar a crescer.
Mas então porquê tanto alarido com a execução dos fundos europeus e o sucesso do seu impacto em Portugal?
Bom, desde logo, porque havendo boas ideias e meios financeiros disponíveis, faltam meios humanos (na preparação e na execução dos programas), recursos materiais (as cadeias de abastecimento estão debaixo de pressão) e sobretudo, falta confiança aos investidores que vêm no descontrolo da inflação e na subida das taxas de juro, sinais de incerteza que moderam o apetite pelo risco. A pressão de gastar, gastar bem e gastar depressa, esbarra por isso em factores críticos para o sucesso da execução que urge combater e contrariar.
Em termos de meios humanos (e formação), temos que ser criativos e ágeis… é fundamental potenciar a capacidade da Academia, envolver mais as universidades na execução de alguns destes programas, encontrar fórmulas para antecipar o contributo dos jovens licenciados e até dos universitários em fim de ciclo, tirar partido da formação profissional de base nos não licenciados e avaliar inclusivamente opções de sourcing de talento proveniente de outros mercados. O talento disponível em Portugal tem muita qualidade, mas é manifestamente insuficiente para toda a execução planeada para os próximos anos, pelo que teremos que apostar no que temos cá dentro, e no que possa vir de fora (incluindo uma aposta clara em continuar a recuperar para Portugal, os que emigraram ao longo da década passada no período pós-crise).
No que diz respeito aos recursos materiais, as empresas portuguesas têm que ter a ousadia de explorar caminhos alternativos: novos mercados de abastecimento, novas matérias-primas (obrigatoriamente mais sustentáveis) e maior capacidade de associação com entidades nacionais e europeias similares que lhes permitam ganhar poder negocial e diversificar o risco na relação com os seus fornecedores.
Já relativamente à confiança dos investidores, é crítico para Portugal continuar a ser visto como um mercado seguro e politicamente estável, com boas condições de trabalho, mas é igualmente importante criar melhores condições de atractividade ao nível fiscal e laboral, algo que ficou por concretizar no Orçamento de Estado para 2023, mas que terá que ser integrado na gestão governativa dos próximos anos. Não vai ser possível fazer subir a posição de Portugal nos rankings de atractividade se não houver uma acção forte nesta matéria e, em paralelo, por vias da digitalização e reorganização de processos, numa redução forte dos custos de contexto para quem queira investir no nosso país.
A situação é clara: é tempo de executar sobre o que se andou a planear e a trabalhar nos últimos dois anos. As condições não são as ideais, mas são as que temos… antes errar por opção, do que falhar por inacção!
Nota: Os pontos de vista e opiniões aqui expressos são os meus e não representam nem reflectem necessariamente os pontos de vista e opiniões da KPMG.
O autor, por opção própria, escreve ao abrigo do antigo acordo ortográfico.
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