Mais terço menos terço: Ordem para Gastar! – Parte II
Mas não tenhamos ilusões: apesar da ordem para gastar, é preciso demonstrar como se gastou e sobretudo, como se executou. Para que esta não seja uma história de mais terço menos terço.
Com muitas vozes de todos os quadrantes a pressionar o Governo para maior celeridade na execução das verbas do PRR (e também do PT2030), 2023 vai ser seguramente um ano de forte investimento público e de avanço significativo na operacionalização dos diversos programas de inovação empresarial financiados por Bruxelas… importa gastar rápido e gastar bem, para que o país não perca terreno para os restantes congéneres europeus.
Segundo o senhor ministro da Economia e do Mar, o Estado injectará sob a forma de investimento público derivado do PRR ao longo do ano de 2023 quase dez milhões de euros por dia, factor decisivo para contrariar o abrandamento da economia face ao crescimento explosivo de 2022. De facto, à data, e depois da chegada do último cheque de Bruxelas, o país pode dizer que aproximadamente um terço do “dinheirinho” já está nas mãos do Estado português (ainda que nem todo aplicado na execução dos projectos contratados… ainda!).
Bruxelas aceitou mais algumas metas e objectivos como satisfeitos e, como tal, o Plano português tem agora um grau de execução próximo dos 20%. Adicionando os 13% de adiantamento recebidos aquando da aprovação do PRR, assim se chega ao primeiro terço do valor prometido por Bruxelas.
Esta “matemática” é importante, porque a partir de agora, gastar vai ser ainda mais difícil. No passado recente, nos quadros comunitários anteriores, a utilização de fundos europeus dependia de uma dinâmica bem conhecida: vender (uma ideia inovadora), obter a aprovação da candidatura, facturar todas as despesas do projecto assim que possível e tranquilamente cobrar e executar o projecto (tantas vezes por esta ordem exactamente).
No âmbito do PRR a dinâmica para as empresas muda, uma vez que a execução condiciona directamente a possibilidade de cobrar, o que torna mais exigente a boa gestão de tesouraria e a coordenação exemplar entre o empenhamento de meios e a boa cobrança das despesas incorridas. É importante aproximar o planeamento e a orçamentação da execução, até porque no contexto inflacionista em que vivemos, qualquer plano de há um ano custará hoje bastante mais euros a executar (não só pela inflação dos materiais, mas até mesmo pela falta de mão-de-obra para executar).
Em termos de novidades, e tal como tem sido anunciado, nos próximos meses vão avançar projectos de grande dimensão em novas infra-estruturas e novas áreas de conhecimento: da inteligência artificial às energias renováveis, passando pelas ciências médicas ou até por inovações nas áreas da mobilidade. São projectos de dezenas de milhões de euros de investimento, com potencial para desenvolver novos polos de conhecimento e para criar novas fileiras produtivas que podem transformar a face do tecido produtivo português para o futuro.
E não haja dúvida que estes projectos geram enorme entusiasmo nos seus promotores e nas equipas que com eles colaboram, empenhados em fazer ver a luz aos produtos e serviços inovadores imaginados ao longo dos últimos meses, mas sejamos realistas: mais além das verbas que se movimentarão com a execução dos projectos, o verdadeiro impacto destas iniciativas do ponto de vista económico será primordialmente sentido a médio prazo, alguns talvez ainda nesta década, mas muitos, mesmo muitos, com impacto efectivo para além de 2030 e não antes.
Talvez por isso, o pouco entusiasmo com o PRR de alguns dos nossos governantes, particularmente os que têm responsabilidades mais focadas no âmbito regional e local. Os efeitos do PRR, quando acabem por se concretizar, irão alimentar eleições muito para além dos seus actuais mandatos e marcarão, a par do PT2030, a agenda da próxima geração, mais do que da actual.
Os próximos meses serão por isso da maior importância: cada projecto protocolado e que avance com o planeamento financeiro e gestão de riscos adequada, será uma carta de alto valor na construção de um futuro melhor para o nosso país. Olhando para as metas e objectivos propostos no PRR português, restam-me poucas dúvidas que o próximo terço das verbas aprovadas acabará por chegar a Portugal e que à entrada para o último ano (2025), cerca de 65% do valor estará à disposição do executivo português e mais de 50% já aplicada e executada.
Mas o último terço não será fácil e o tempo vai passar num ápice. Portugal tem os próximos 18 meses para pôr a andar todas as iniciativas que estavam planeadas e que ainda não estão executadas… e terá outro tanto para rematar a faena.
O preço do insucesso seria uma oportunidade perdida pelo país para utilizar verbas europeias para acelerar a modernização da administração pública e a transformação da economia nacional. Serão contas de “sumir”, num desfecho que será sempre de muitos milhões… complementar alguns projectos com verbas do PT2030 será sempre uma opção, juntando um efeito multiplicador aos investimentos agora propostos.
Mas não tenhamos ilusões: apesar da ordem para gastar, é preciso demonstrar como se gastou e sobretudo, como se executou. Para que esta não seja uma história de mais terço menos terço.
Nota: Os pontos de vista e opiniões aqui expressos são os meus e não representam nem reflectem necessariamente os pontos de vista e opiniões da KPMG.
O autor, por opção própria, escreve ao abrigo do antigo acordo ortográfico.
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