Inflação “mascara” aumento dos gastos das autarquias com Carnaval
De Torres Vedras à ilha da Madeira, os municípios estão a gastar mais com o Carnaval por causa da inflação. Verbas que esperam recuperar com o impacto económico gerado pela afluência dos foliões.
De Norte a Sul do país, incluindo a ilha da Madeira, há municípios a gastar mais dinheiro com as festividades do Carnaval devido ao aumento dos preços dos bens e serviços, a reboque da inflação. É o que acontece em Torres Vedras, que surge à cabeça dos concelhos com “o maior orçamento de sempre”: 1,1 milhões de euros, mais 170 mil euros do que os 930 mil euros gastos no último ano. Seguem-se a Madeira e Estarreja, com 515 mil euros e meio milhão de investimento, respetivamente.
Contactadas pelo ECO para aferir o impacto que estas festividades têm nas contas municipais ou do Governo Regional, no caso da Madeira, as entidades organizadoras são unânimes em apontar o dedo à difícil conjuntura económica nacional e internacional, que faz disparar os custos das matérias-primas, por exemplo.
“Neste ano, tal como no anterior, verificaram-se nos diversos eventos repercussões da inflação e aumento generalizado dos preços nos bens e serviços, havendo uma reflexão imediata destes fatores no orçamento”, afirma o secretário regional de Turismo e Cultura da Madeira, Eduardo Jesus, em declarações ao ECO/Local Online. Contudo, ressalva, “importa salientar os ajustes realizados relativamente aos apoios concedidos pela Secretaria Regional de Turismo e Cultura às trupes que desfilam no principal evento das Festas de Carnaval, o Grande Cortejo Alegórico”.
Neste ano, tal como no anterior, verificaram-se nos diversos eventos repercussões da inflação e aumento generalizado dos preços nos bens e serviços, havendo uma reflexão imediata destes fatores no orçamento.
Por tudo isto, completa Eduardo Jesus, “prevê-se um investimento do Governo Regional, através da Secretaria Regional de Turismo e Cultura, de 515 mil euros para as Festas de Carnaval 2024. Estamos perante um valor superior ao ano anterior, uma vez que o orçamentado para 2023 foi de 450 mil euros”.
O Carnaval é um dos pontos altos do calendário das festividades desta região insular, que arrasta milhares de turistas. Seja para o famoso Cortejo Alegórico ou para o satírico “Cortejo Trapalhão, inspirado no que era feito originalmente na Rua da Carreira na primeira metade do século XX — onde “a espontaneidade e criatividade dos participantes não tem limites, abarcando desde a sátira social e política, aos quadros tradicionais, e ao simples disfarce de caracterização”.
Já o centenário Carnaval de Torres Vedras tem este ano “o maior orçamento de sempre, na ordem dos 1,1 milhões de euros“. Em parte por causa do “aumento dos preços de bens e serviços” resultante da atual conjuntura económica”, explana Rui Penetra, responsável pela empresa municipal Promotorres, que organiza a festividade. A que acresce o “aumento do apoio à participação dos grupos organizados e do investimento em segurança e socorro”, completa.
Feitas as contas, a festividade carnavalesca envolve mais de 150 pessoas na organização e na produção, outras 74 na limpeza urbana, e mais de 1.500 profissionais entre forças de segurança e de socorro, calcula Rui Penetra. E arrasta milhares de pessoas para assistir aos desfiles de grupos e foliões nos corsos e às marchas luminosas ao ritmo do samba.
Já no ano passado, a presidente da câmara de Torres Vedras, Laura Rodrigues, se tinha queixado ao ECO/Local Online da difícil conjuntura económica por causa dos aumentos dos custos das matérias-primas.
Para muitos destes municípios o Carnaval é considerado um dos pontos altos das festividades locais e fazem, por isso, questão de garantir uma dotação em orçamento municipal. É o caso da Câmara Municipal de Loulé, que inscreveu 470 mil euros, mais 70 mil do que em 2023.
Também Estarreja destinou meio milhão de euros no Plano de Atividades Municipais do Orçamento para a edição deste ano. Neste caso, já abrange “o apoio municipal de 163.600,00 euros atribuído aos 13 grupos carnavalescos e às instituições do Carnaval Infantil para o desenvolvimento dos seus projetos”, assinala o autarca Diamantino Sabina.
Eleito pela Coligação PSD/CDS-PP “Sempre Mais”, o presidente de câmara de Estarreja adverte, contudo, que esta verba não inclui “o investimento dos grupos que têm o seu orçamento próprio que acresce aos valores atribuídos pelo município”.
Qual o impacto económico?
É ponto assente que as verbas atribuídas ao Carnaval assumem um peso nas contas municipais. Ainda assim, os autarcas são unânimes em antecipar um elevado retorno económico, em tempos conturbados. Elencam o forte contributo do Entrudo para o tecido económico da região, com despesas em estadias e alimentação dos milhares que visitam o território nesta altura do ano.
Em Torres Vedras, por exemplo, Rui Penetra, da empresa municipal Promotorres, estima “um impacto de mais de 12 milhões de euros na economia local. Abrange “desde estabelecimentos de restauração, hotelaria, pequeno comércio, lojas de tecidos, costureiras, retrosarias, entre outras áreas de negócio”.
O mesmo responsável antecipa a afluência, neste município da região do Oeste, de “mais de 500 mil foliões, maioritariamente da Grande Lisboa e região Centro, mas também de todo o país e do estrangeiro, beneficiando [esta localidade] da proximidade a Lisboa e ao aeroporto”.
Já em Estarreja são esperadas “80 mil pessoas durante o período de Carnaval, não só nos dias dos grandes corsos, mas também nas noites de folia”, antecipa o autarca Diamantino Sabina. E este ano há uma novidade: “O Carnaval de Estarreja 2024 é o primeiro em todo o mundo a fazer o caminho da inclusão através da cor, com a implementação do “código de identificação de cores para daltónicos ColorADD, na organização funcional e espacial do recinto dos desfiles”.
O autarca de Estarreja calcula, por isso, que as festividades carnavalescas tenham um impacto superior aos três milhões de euros ao nível do “turismo, comércio local e serviços”.
Mas este impacto económico no território não é específico das festas do Entrudo. Diamantino Sabina diz que “o Carnaval também gera impacto ao longo dos meses da sua preparação e organização, não só em termos económicos, mas também em termos culturais e sociais”.
Até porque, argumenta, “essa dinâmica envolve vários investimentos e recursos, nomeadamente dos grupos que contribuem para a atividade económica antes mesmo da celebração oficial e para ampliar o ciclo económico do Carnaval”. Só nos bastidores do Carnaval trabalham cerca de cinco mil pessoas.
O Carnaval também gera impacto ao longo dos meses da sua preparação e organização, não só em termos económicos, mas também em termos culturais e sociais.
Também o secretário regional de Turismo e Cultura da Madeira antecipa um enorme impacto económico na ilha sem, contudo, avançar valores. “A exemplo dos restantes eventos integrados no calendário de animação turística regional, as Festas de Carnaval têm um retorno que se traduz logo na taxa de ocupação/cama mais elevada — só em 2023 atingiu os 87% –, gerando impacto nas receitas”, calcula Eduardo Jesus.
“Numa análise ao mês de fevereiro, a taxa na hotelaria rondou os 61%, reforçando, desta forma, o retorno deste evento medido através deste indicador turístico”, completa. Aliás, a Região Autónoma da Madeira dispõe de uma capacidade diária para acomodar cerca de 60 mil pessoas na hotelaria tradicional e no Alojamento Local.
Só na organização do Entrudo estão envolvidas cerca de 5.500 pessoas, das quais 5.000 são voluntários que participam nos vários cortejos, nomeadamente o Carnaval das Avenidas, na Placa Central da Avenida Arriaga, entre os dias 12 e 18 de fevereiro.
Loulé também deverá acolher cerca de 80 mil visitantes ao longo dos dias da festividade, sobretudo no Domingo Gordo e na terça-feira de Carnaval, “habitualmente dias com casa praticamente cheia”, sublinha o presidente da câmara deste concelho do Algarve, Vítor Aleixo.
“O Carnaval de Loulé constituiu o maior evento da época baixa do turismo algarvio e, nesse sentido, tem um impacto substancial na economia local, sobretudo pela dinâmica que gera no comércio local, na restauração, na hotelaria, nas pequenas economias de venda ambulante que se estabelecem nestes três dias”, sustenta o autarca de Loulé.
A folia também se faz em Vila Nova de Famalicão, a Norte do país, mas “de forma mais espontânea e comunitária, que tem como ponto alto a noite de Carnaval, de segunda para terça-feira, em que milhares de pessoas se deslocam à cidade para participar numa autêntica festa de rua que tem ganho cada vez mais adeptos nos últimos anos”, descreve a autarquia. Tornou-se um dos eventos mais turísticos, a par das Festas Antoninas, com grande impacto económico para a restauração, bares, cafés e comércio local.
O evento conta com um investimento municipal na ordem dos 173 mil euros, um acréscimo próximo de 16 mil euros em relação a 2023, calcula ao ECO/Local Online a autarquia famalicense.
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
Inflação “mascara” aumento dos gastos das autarquias com Carnaval
{{ noCommentsLabel }}