Empresa de óleos essenciais ajuda a limpar a floresta em Figueiró dos Vinhos

  • Lusa
  • 4 Junho 2024

Scents from Nature iniciou laboração em outubro de 2022, num investimento de 3,7 milhões de euros. Autarcas das zonas afetas por incêndios reclamam melhores acessibilidades e telecomunicações.

Das folhas de eucalipto que povoam terrenos de Figueiró dos Vinhos e de concelhos limítrofes saem óleos essenciais para incorporar em produtos farmacêuticos, alimentares, cosmética ou detergentes, num trabalho que ajuda a manter limpa a floresta.

“Eu diria que não fomos nós que escolhemos, mas foi mais Figueiró dos Vinhos que nos escolheu”, disse à agência Lusa a responsável técnica e de produção da empresa Scents from Nature.

Maria Emília Marques recuou a 2017, ano dos incêndios de Pedrógão Grande, que atingiram também, entre outros concelhos, Figueiró dos Vinhos e Castanheira de Pera, os três municípios onde decorrem as comemorações do Dia de Portugal, para explicar o caminho que a empresa fez.

“Depois de 2017, com os incêndios, verificou-se que talvez pudéssemos ser úteis aqui para limpar um pouco dos restos que ficam nas matas aquando do corte dos eucaliptos”, adiantou Maria Emília Marques, referindo que, dos três municípios que receberam o projeto, a Câmara de Figueiró dos Vinhos, no norte do distrito de Leiria, “respondeu com uma rapidez incrível”. A um domingo.

A região escolhida pela Scents from Nature era esta, “porque era uma zona em que o eucalipto é rei”, pelo que havia facilidade a aceder à matéria-prima. “Por outro lado, queríamos ajudar, de certa forma, na manutenção da floresta, não deixando nada ao abandono e recolhendo tudo o que era sobrantes que, normalmente, ficam e depois são uma fonte de incêndio”, adiantou.

Maria Emília Marques, responsável técnica e de produção da Scents from NatureLusa

E é na floresta que tudo começa, quando os madeireiros cortam os eucaliptos: a madeira vai para as celuloses; os ramos (pontas) que ficam no chão para a empresa. “Aqui, trituramos a folha agarrada ao pequeno ramo. Tudo o resto, a madeira e a folha que depois fica desidratada, vai para parceiros que utilizam para biomassa, pellets ou para produção de energia”, esclareceu Maria Emília Marques. Ou, por outras palavras, a aplicação da Lei de Lavoisier: “Na natureza, nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”.

No processo de extração/destilação, o óleo é extraído da folha através da passagem de vapor de água e separado no decantador. “O óleo tem uma composição química predefinida e, se o quisermos enriquecer, levamos a uma torre de destilação em que se pode destilar” de acordo com a especificação pedida pelo cliente.

A empresa começou a laborar em outubro de 2022, num investimento inicial de 3,7 milhões de euros, e vai avançar com a ampliação.

Em 2023, o ano zero da empresa, foram trabalhadas entre 600 e 700 toneladas de sobrantes de eucalipto, tendo resultado três mil quilogramas de óleo. “Dessas 600 toneladas, cerca de 40%, 30% é que é folha”, declarou, antecipando que este ano a empresa vai “mais do que duplicar a produção” de óleos essenciais.

Com 17 trabalhadores, sete dos quais estrangeiros (os nacionais são todos da região), a Scents from Nature reconheceu dificuldade em contratar mão-de-obra, qualificada ou não, o que é um constrangimento para aumentar a produção.

Produzindo essencialmente para exportação, Maria Emília Marques destacou as vantagens de a empresa estar em Figueiró dos Vinhos, onde “a matéria-prima está à mão”. Mas há coisas que limitam a atividade da empresa, instalada numa zona industrial pequena com casas próximas e com rede de Internet “muito má”.

Aqui, trituramos a folha agarrada ao pequeno ramo. Tudo o resto, a madeira e a folha que depois fica desidratada, vai para parceiros que utilizam para biomassa, pellets ou para produção de energia.

Maria Emília Marques

Responsável de produção da Scents from Nature

A empresa, que ajuda a floresta a manter-se limpa, notou que na região “são terrenos muito inclinados e pequeninos”. “E os custos dos nossos fornecedores de matéria-prima, para tirar de sítios difíceis é grande e lá ninguém vai ver, portanto, ficam lá em baixo. Quando é visível e quando o dono do terreno diz ‘não, ele tem de ser limpo, tem de tirar tudo’, para nós é uma vantagem, porque apesar de pagarmos, é uma forma de eles tirarem. Muitas vezes é fácil deixar lá, não se vê e o custo de tirar dessas zonas cá para cima é grande”, alertou esta responsável.

Nestas contas, há aspetos a considerar: “o gasóleo é caro, as máquinas também, a mão-de-obra não existe”, adiantou a engenheira. Reconhecendo que a empresa é “uma mais-valia” na região, pois “tem tirado, de facto, muitas toneladas de rama” de terrenos, Maria Emília Marques notou, contudo, que fica “lá muito ainda”.

As comemorações do Dia de Portugal centram-se este ano em Castanheira de Pera, Figueiró dos Vinhos e Pedrógão Grande, concelhos fustigados pelos incêndios de junho de 2017, de que resultaram 66 mortos e 253 feridos, além da destruição de casas, empresas e floresta.

Autarcas reclamam melhores acessibilidades, telecomunicações e serviços de saúde

Das acessibilidades às telecomunicações, da saúde à educação, são variadas as reclamações dos presidentes das Câmaras de Castanheira de Pera, Figueiró dos Vinhos e Pedrógão Grande, concelhos onde este ano estão centradas as comemorações do Dia de Portugal.

“Depois dos acontecimentos de 2017, em que se verificaram falhas graves nas comunicações, surgiu a esperança de que algo seria feito para mitigar esta insuficiência”, afirmou à agência Lusa o presidente da Câmara de Pedrógão Grande, António Lopes.

Segundo António Lopes, passados estes anos, “com a evolução das formas de trabalho para o teletrabalho, incentivando os profissionais a debandar para paragens” com “melhor qualidade de vida e diversificadoras do espetro tradicional das atividades económicas deste concelho”, verifica-se “as contínuas e mais agravadas falhas de comunicações”, prejudicando o município também na vertente da segurança.

Em junho de 2017, os incêndios que deflagraram neste concelho e atingiram outros, nomeadamente Castanheira de Pera e Figueiró dos Vinhos, no norte do distrito de Leiria, provocaram 66 mortos e 253 feridos, além da destruição de casas, empresas e floresta.

Depois dos acontecimentos de 2017, em que se verificaram falhas graves nas comunicações, surgiu a esperança de que algo seria feito para mitigar esta insuficiência.

António Lopes

Presidente da Câmara de Pedrógão Grande

O presidente do Município de Castanheira de Pera, António Henriques, adiantou que o concelho está “cada vez mais abrangido por cobertura de rede”, mas persistem “algumas dificuldades em pontos muito específicos”, defendendo a sua resolução urgente.

Por outro lado, o autarca criticou a incapacidade de resposta por parte dos CTT na entrega de cartas e encomendas dentro do prazo. Em outubro de 2023, a Comunidade Intermunicipal da Região de Leiria, de que fazem parte estes três concelhos, alertou para o mau funcionamento generalizado dos CTT, com consequências graves no recebimento de pensões ou na receção atempada de faturas de serviços essenciais.

Já em matéria de acessibilidades, o presidente da Câmara de Figueiró dos Vinhos, Jorge Abreu, realçou a necessidade de obras no Itinerário Complementar 8. “Ao longo de vários anos temos vindo sempre com alguma intensidade a focar esta preocupação e gostaríamos que isto fosse de uma vez por todas concluído”, declarou Jorge Abreu, referindo-se ao troço entre Pombal e Avelar (Ansião).

No âmbito da saúde, Jorge Abreu preconizou para o concelho, que tem um programa de incentivos à fixação de médicos de família, um reforço do investimento, extensível à educação.

O autarca de Castanheira de Pera, que também lançou benefícios para atrair clínicos, assinalou que a população sente “falta de cuidados médicos em grande parte do tempo”, enquanto o de Pedrógão Grande classificou a delegação de competências do Estado central no âmbito destas duas áreas e da ação social como uma “transferência de encargos”.

António Lopes designou a floresta como a primeira preocupação, recordando que aquela representa 90% do concelho, que tem 123 quilómetros quadrados, e é “essencialmente particular”.

“Vemo-nos a braços com uma tarefa hercúlea”, destacou a propósito da limpeza das faixas de gestão de combustível, explicando que o custo deste trabalho sai do erário municipal quando outras entidades têm financiamento a 100% para o concretizar, o que é um “tratamento desigual”.

Vamos reunindo as condições através de áreas empresariais, condomínios empresariais, reabilitação de edifícios para a instalação de empresas (…) e depois acaba por ser também um bocadinho inglório, porque as empresas continuam a não olhar para estes territórios como uma oportunidade.

António Henriques

Presidente da Câmara de Castanheira de Pera

Jorge Abreu sugeriu a criação de um mecanismo de cofinanciamento na área das florestas e ambiente, que “permita dar seguimento às intervenções” em curso de programas como os Condomínios de Aldeia ou as Áreas Integradas de Gestão da Paisagem.

Nestes três concelhos, que estão nos quatro do distrito de Leiria que mais população perderam em termos percentuais entre os censos de 2011 e 2021 (de 13,41% a 17,11%, segundo dados do Instituto Nacional de Estatística), insiste-se numa “discriminação positiva”. “O que é mais crucial é conseguir fixar os jovens”, sustentou Jorge Abreu, pedindo apoios à habitação, com reforço de política fiscal e de promoção de habitação condigna, mas também, acessível a jovens.

Sustentando que o “país se esqueceu de que havia um Interior”, António Henriques notou que economia e demografia estão diretamente relacionadas, desejando “um Portugal completo com uma estratégia abrangente”, foco que deve ser de autarcas e governantes.

“É um desafio para nós, enquanto autarcas, porque vamos reunindo as condições através de áreas empresariais, condomínios empresariais, reabilitação de edifícios para a instalação de empresas (…) e depois acaba por ser também um bocadinho inglório, porque as empresas continuam a não olhar para estes territórios como uma oportunidade”, lamentou o presidente de Castanheira de Pera.

Para o autarca de Figueiró dos Vinhos, é necessário um “reforço da política fiscal para pessoas e empresas que permita uma efetiva diferenciação de quem reside e labora no Interior, oferecendo vantagens competitivas que amenizem constrangimentos”, enquanto o de Pedrógão Grande rejeita novos obstáculos ao desenvolvimento do concelho, como a eventual instalação de uma central solar flutuante perto da Barragem do Cabril e mais uma linha de muito alta tensão.

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