A Quinta do Crasto antecipa “um bom ano de vindimas com uva de boa qualidade”, ainda que pese a falta de mão de obra no Douro e os elevados custos.
De tesoura de corte na mão, um grupo de trabalhadores vai apanhando cachos de uvas nos socalcos de vinha na Quinta do Crasto, na Região Demarcada do Douro, enquanto Jorge Roquette recorda como, em 1994, mudou a história da empresa ao produzir os primeiros Vinhos Douro DOC. “Até então só tínhamos Vinho do Porto”, conta ao lado do filho Tomás Roquette, a quarta geração à frente do negócio, que antecipa “um bom ano de vindimas com uva de boa qualidade” e conseguir, este ano, os mesmos 10,5 milhões de euros faturados em 2023.
Com uma paisagem de cortar a respiração refrescada pelo rio Douro a serpentear entre íngremes encostas com vinhas plantadas em socalcos como pano de fundo, Tomás Roquette está otimista de que “este vai ser um bom ano, não muito diferente de 2023 em que se produziu 1 milhão e 400 mil quilogramas de uvas que dá para encher 1,3 milhões de garrafas de vinho”.
Vai ser um bom ano de vindimas com uva de boa qualidade.
O negócio está a crescer e o pai Jorge Roquette, que comprou a quinta em 1986, lembra logo as peripécias das primeiras vindimas que escreveram uma nova página na história na Quinta do Crasto. “Só fazíamos vinho do Porto na altura. Pedi uma cuba emprestada a um amigo e fizemos o primeiro vinho em 1994: o Crasto tinto e depois um tinto reserva”, recorda o então administrador da comissão executiva do BPI, desde 1981.
Para surpresa de todos, não podia comercializar o vinho no mercado nacional: “Tentámos vender em Portugal, mas não pudemos, porque a marca já estava registada pela Caves Monte Crasto”. Não baixou os braços. Exportou de imediato para o mercado britânico, que continua, nos dias hoje, a comprar as várias referências de vinho da empresa. Ainda assim, “o Brasil é o principal mercado da Quinta do Crasto”, situada no coração do Cima Corgo, destaca o filho que agora administra a empresa.
“Depois começámos a vender para várias partes do mundo, até que conseguimos ultrapassar este condicionante e iniciámos a venda em Portugal”, conta Jorge Roquette já com os seus 86 anos. Além dos vinhos Douro DOC, a empresa também comercializa Vinhos do Porto Vintage que já integravam o stock existente.
Trinta anos depois daquele episódio que mudou o rumo da empresa, Jorge Roquette passa em revista os primeiros tempos desta aventura no mundo vinícola. “Quando vim para a Quinta do Crasto não percebia nada disto, mas gostava imenso.” O primeiro contacto que teve com a vinha foi em 1962, quando casou com Leonor Guedes de Almeida, neta de Constantino de Almeida, “um nome muito importante no mundo dos vinhos”, que comprou a quinta em 1918, completa o filho.
“Com a ajuda do então plano de desenvolvimento de Trás-os-Montes fizemos umas vinhas, depois as adegas e todo o resto”, conta Jorge Roquette. O negócio foi crescendo: “Quando comecei, a Quinta do Crasto tinha 20 hectares. Agora tem 130, dos quais 80 são de vinha. Depois comprámos a Quinta da Cabreira, em Foz Côa, na margem direita do rio, com 114 hectares de vinha, e temos aqui ao lado a Quinta do Querindelo com mais nove hectares e temos outra com mais sete”.
Depois começámos a vender para várias partes do mundo, até que conseguimos ultrapassar este condicionante e iniciámos a venda em Portugal.
Estamos em plena época de vindimas, que deverá terminar na primeira semana de outubro, e os trabalhadores vivem a azáfama da apanha das uvas da casta Touriga Nacional já desde as 7h30. A hora do mata-bicho já foi por volta das 9h30.
Agora, de luvas e tesoura de corte na mão, Isabel Pereira vai colhendo e colocando os cachos na caixa de plástico pousada na terra, junto à videira. Há várias semanas que madruga para se juntar aos colegas que, às 5h30, viajam de carrinha a partir de Baião. O trabalho é árduo, expostos ao sol e calor. Mas é preciso ter “ganha-pão” quando o emprego é escasso na zona onde vive. “Acordo às 4h30 da madrugada para começar a apanhar as uvas pelas 7h30 até ao meio da tarde”, conta Isabel que há já quatro anos aproveita todos os trabalhos agrícolas, desde a apanha da uva até à azeitona, para garantir sustento.
Falta de mão-de-obra e elevados custos com a vindima
A falta de de mão-de-obra para fazer a vindima é uma das preocupações dos viticultores face ao êxodo rural, que acaba por ser de alguma forma atenuada pelo cada vez maior número de imigrantes que procuram o trabalho no campo. Tomás Roquette diz que é preciso dar boas condições e salários condignos para agarrar os trabalhadores.
Além da falta de mão-de-obra, o viticultor também aponta os custos elevados com a vindima, por ser difícil mecanizar uma vez que esta é uma região de viticultura de montanha. Ainda assim, atesta, “O Douro, património mundial da Unesco, tem um enorme potencial e um terroir de eleição: microclima, exposição solar, altitudes e tipo de solo. Há aqui uma conjugação que faz com que o resultado final destas uvas seja excecional”, sublinha o empresário que já vai na sua 35.ª vindima.
Para manter a qualidade dos vinhos, a empresa controla todo o processo de produção, com “80% de uva própria”. Mesmo assim, Tomás Roquette assinala que “o Douro está a viver um momento complicado: há muitos viticultores que sentem uma maior dificuldade em encaixar as suas uvas este ano”. Apesar de “ser um ano relativamente difícil”, a faturação deste ano deverá manter os 10,5 milhões de euros em vinho, azeite e no enoturismo atingidos em 2023″, contabiliza.
Os trabalhos da vindima iniciaram com a apanha da uva branca, em meados de agosto, a que se seguiram as uvas para vinho Rosé e agora as uvas tintas. São transportadas para a receção da propriedade, a uns quilómetros de viagem de jipe em terra batida, deixando para trás as videiras verdes nos socalcos do monte. “São descarregadas neste tapete, onde é feita a seleção dos cachos e depois vão para esta máquina que separa o pé da uva dos bagos da uva”, descreve.
“Daqui é reencaminhado para estes três centros de vinificação que temos — os lagares, a adega das vinhas velhas e adega nova — que é onde nós fermentamos e vinificamos o vinho”, completa enquanto aponta, orgulhoso, para as iniciais do bisavô “CDA” (Constantino de Almeida) num dos edifícios.
Os vinhos são depois engarrafados num armazém localizado a uns quilómetros da Quinta do Crasto, em Sabrosa, de onde saem para os quatro cantos do mundo. “Ficam lá a estagiar um bocadinho e depois as garrafas vão sendo rotuladas e expedidas conforme chegam as encomendas”, descreve o empresário que vai investir, na Quinta do Crasto, cerca de cinco milhões de euros na construção de um boutique hotel, algumas villas com piscina, uma sala de provas, uma nova loja e um restaurante panorâmico com vista para o Rio Douro. As obras deverão arrancar no início de 2025 e demorar dois anos a estar concluídas, avançou, em primeira mão, ao ECO/Local Online o administrador da quinta.
Em 2023, a propriedade atraiu mais de 10 mil de visitantes provenientes sobretudo do Brasil e dos EUA, mas também da Ásia, detalha Roquette. Há já alguns anos que a riqueza do património histórico e cultural da quinta, vinhas e adegas, vinho, a excelência da gastronomia local e a “piscina infinita”, com assinatura do arquiteto Souto Moura, andam nas bocas do mundo. A Quinta do Crasto já recebeu visitantes famosos como o ator Harrison Ford, Ronnie Wood (Rolling Stones) ou Simon LeBon, vocalista da banda pop britânica Duran Duran.
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