Nova lei dos solos trava especulação com casas construídas a preços moderados
Lei publicada nesta segunda-feira impõe que limite ao preço de venda seja definitivamente inscrito no registo predial, aplicando-se a futuras transações.
A nova lei dos solos, inserida no plano “Construir Portugal”, foi publicada nesta segunda-feira em Diário da República, definindo os critérios para que terrenos rústicos sejam convertidos em “habitação pública e acessível a custos controlados”. A reclassificação do solo de rústico para urbano fica “limitado aos casos em que a finalidade seja habitacional ou conexa à finalidade habitacional e usos complementares”.
Uma das dúvidas que autarcas deixaram ao ECO/Local Online aquando do anúncio da nova lei, no final de novembro, foi a forma como seria prevenida uma futura especulação das habitações construídas ao abrigo desta medida e que, obrigatoriamente, terão de cumprir critérios de custos controlados – “é importante garantir que haja um bom acompanhamento para evitar abusos ou especulação”, alertava então o autarca de Portimão, Álvaro Bila.
No artigo 72-B, o Governo deixa explícito que o limite do preço de venda terá de ficar inscrito no registo predial – “a afetação a habitação de valor moderado e a sujeição a limite do preço de venda de cada fração autónoma de edifício em propriedade horizontal e de cada prédio urbano destinados a habitação são factos obrigatoriamente sujeitos a registo predial”.
Adicionalmente, fica assegurado que, num contrato de promessa compra e venda e num registo de venda, será inscrito que se trata de habitação de valor controlado e com limite do preço de venda.
Ou seja, em futuras transações aplicam-se sempre os critérios de preço definidos na legislação. Para estabelecer o “valor moderado”, o preço do metro quadrado de área bruta privativa (o que cada um tem no imóvel para seu uso privado) tem por teto máximo 125% da mediana do concelho onde está o imóvel ou 225% da mediana nacional.
Caso esta medida seja desrespeitada, a penalização será a “anulabilidade”, escreve o Governo na lei promulgada pelo Presidente da República no dia 26 e agora publicada.
Tal como já era sabido desde a criação desta medida no Conselho de Ministros do final de novembro, 70% da área acima do solo nestes imóveis têm de se destinar a habitação pública e à venda por valores moderado. O termo “moderado” é realçado na lei, ficando claro que “não se confunde com outros conceitos, como ‘custos controlados’, na medida em que procura abranger o acesso pela classe média, ponderando valores medianos dos mercados local e nacional, e definindo valores máximos para assegurar maior equidade”.
Segundo realça este diploma, a construção de casas novas decaiu acentuadamente do início do século para esta década, com todo o volume de meio ano de 2022 a corresponder a um só mês de 2002, pelo que “o aumento do número de solos destinados à construção de habitação não só contribui para a expansão e concretização do plano «Construir Portugal», como também fortalece a capacidade do Estado em promover políticas habitacionais eficazes, sustentáveis e alinhadas com as necessidades da população”.
Para estabelecer estas novas zonas de construção, deverão ser escolhidos locais que confinem com áreas urbanas existentes, obrigatoriedade que se exclui na habitação para trabalhadores agrícolas, o que abre porta à construção em locais hoje sem qualquer ligação a perímetro urbano.
De fora da reclassificação do uso do solo para urbano ficam “unidades de terra com aptidão elevada para o uso agrícola, nos termos da Reserva Agrícola Nacional”, bem como várias tipologias de terrenos identificadas no Artigo 72-B. Estas incluem, entre outras, áreas integradas no Sistema Nacional de Áreas Classificadas, áreas abrangidas por programas especiais da orla costeira, albufeiras de águas públicas e estuários, zonas de inundação, aproveitamentos hidroagrícolas, terrenos de Reserva Ecológica Nacional (REN), faixa marítima de proteção costeira, praias, dunas, arribas, e zonas ameaçadas pelo mar ou por cheias.
Para levar adiante estas alterações, haverá “deliberação da assembleia municipal, sob proposta da câmara municipal, refletindo, assim, um processo de decisão colegial, transparente e suscetível de integral escrutínio”, explana o Decreto-Lei. Ao município é conferido “direito de preferência após a primeira transmissão de prédios ou de frações autónomas construídas em solos reclassificados”, lê-se ainda, embora não fique esclarecido se este direito acrescenta algo ao que a legislação portuguesa já prevê para as transmissões normais de imóveis realizadas em qualquer parte do país.
Quanto à preocupação de abuso da simplificação da alteração de uso do solo, deixada por autarcas ao ECO/Local Online, esta não fica afastada, ao colocar a decisão apenas dependente do Executivo municipal e da assembleia municipal, que em casos de uma mesma força política maioritária, deixa de ter de cumprir critérios hoje obrigatórios numa alteração de Plano Diretor Municipal.
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