O PS, maior partido autárquico, está longe da maioria das capitais de distrito, mas é em Lisboa e no Porto que estão os maiores desafios para as autárquicas, pela dimensão e poder político que trazem.
Se Manuel Pizarro arranca para as autárquicas com parte do “Moreirismo” a dar-lhe força, Alexandra Leitão tem de enfrentar quem já é presidente da câmara e assiste à resistência do PCP a juntar-se a uma frente de esquerda em Lisboa. Nestes candidatos joga-se muito do sucesso do PS nas eleições de 12 de outubro. O coordenador autárquico do PS, numa entrevista ao ECO/Local Online decorrida antes do anúncio de recandidatura do presidente da Câmara de Lisboa, admite que quem já está no poder “parte em vantagem”, um princípio que vale também para Moedas. Contudo, salienta André Rijo, Alexandra Leitão é a melhor personalidade socialista para desfeitear o social-democrata.
“O engenheiro Carlos Moedas tem-se dedicado muito à vitimização e à propaganda. Nisso, há que reconhecer que o engenheiro Carlos Moedas é muito forte”, aponta o responsável pela coordenação do processo autárquico no Largo do Rato. Contudo, “se há figura no partido que tem combatividade, que tem resiliência, capacidade para tornar aquilo que seria menos provável numa coisa que pode acontecer, é a Alexandra Leitão. Não poderíamos ter apostado mais forte”.

O PS é o maior partido autárquico em Portugal, mas o PSD tem mais capitais de distrito e a capital do país. E tem também vários desses autarcas em limite de mandatos. Em Aveiro, Braga, Faro e Santarém, o que vai o PS fazer para conquistar estas câmaras?
Fica-me mal, enquanto coordenador autárquico nacional, dizer que estamos a fazer apostas mais fortes em determinadas câmaras, do que em outras. O Partido Socialista faz uma aposta forte ou procura fazer uma aposta forte em todo o território do país. Não é só para ganhar as eleições autárquicas, é porque acreditamos mesmo que os programas e os protagonistas, candidatos, do Partido Socialista, são melhores para o território, porque fazem melhor a gestão dos recursos públicos alocados aos municípios e às freguesias. Ter presidências de câmara e presidências de junta do Partido Socialista significa um melhor aproveitamento dos recursos públicos, sobretudo na definição de políticas públicas melhores para responder aos problemas das pessoas. Nessa perspetiva, a nossa aposta é sempre máxima em todo o território.
Mas tendo o PS poucas capitais de distrito, e até porque em Vila Real vê o seu autarca nessa situação de limite de mandato, estes concelhos serão particularmente apetecíveis. Não vai haver uma ação política mais musculada?
Ao haver estes ciclos [de limite de mandatos] que se quebram, que também existem nos nossos adversários — somos os que temos mais candidatos nessa circunstância –, esses territórios representam para o PS nestas autárquicas uma maior oportunidade, porque os eleitores vão ser confrontados com a inevitabilidade de o presidente de câmara ser uma pessoa que não era até antes destas eleições. Vai haver uma mudança na liderança do município. Quando assim é, dá-me ideia que a generalidade dos eleitores está mais disponível para equacionar alternativas. Geralmente, os incumbentes têm a vantagem de serem incumbentes, de estarem no exercício de poder, diria, genericamente, que geralmente as pessoas confiam mais no incumbente.
As capitais que citou representam para nós um desafio e oportunidade adicionais, até porque temos poucas capitais de distrito lideradas pelo Partido Socialista. Não nego que uma das ambições que teríamos era ter mais capitais de distrito lideradas pelo Partido Socialista a partir das próximas eleições autárquicas. Fizemos apostas fortes em alguns casos — elas todas são fortes, não quero estar a particularizar –, mas são pessoas que já tiveram encargos governativos de elevada responsabilidade. Os exemplos são conhecidos, no Porto, em Lisboa, em Coimbra, em Bragança. Em Évora, com o [Carlos] Zorrinho. Mesmo em Santarém e em Faro, estamos a apostar em presidentes de câmara muito carismáticos e que tiveram um trabalho feito em territórios vizinhos e são reconhecidos pelas populações. Temos a expectativa que isso se traduza no voto no próximo dia 12 de outubro.
O que vemos no Porto? Uma direita um pouco fragmentada. E, por outro lado, vemos também o surgimento de alguns independentes da área mais da direita, habitualmente. Eu diria que com uma candidatura forte do centro esquerda, como é o caso do Manuel Pizarro neste momento, e com uma fragmentação à direita, a disputa eleitoral no Porto vai ser das coisas mais interessantes que vamos ter para acompanhar.
Lisboa e Porto terão as lutas mais relevantes. No Porto, não têm a presidência há 24 anos e nas últimas eleições ficaram quase empatados com o PSD nos 18%. Em Lisboa, o incumbente pode recandidatar-se e a perda da câmara foi mais recente. Seguindo as suas palavras, o incumbente, que em Lisboa é Moedas, tem vantagem. Que estratégia definiram para os dois principais municípios portugueses?
No Porto, temos um candidato que é reincidente numa candidatura. O doutor Manuel Pizarro não é a primeira vez que se candidata à Câmara do Porto, é provavelmente o portuense que eu conheço que mais ama aquela cidade e aquele concelho.
Em 2021, após um diferendo entre ele e José Luís Carneiro, avançou Tiago Barbosa Ribeiro, que ficou abaixo dos 20%.
Como não era coordenador autárquico nessa altura, não posso falar sobre esse tema. Mas, diria que o Manuel Pizarro é um candidato à moda do Porto, como o slogan dele diz. O Manuel Pizarro consegue, para além do PS, juntar algum do “Moreirismo” que ainda existe. Estamos a sentir, e isso vai ser cada vez mais sentido, um movimento de pessoas que foram presidentes de junta no tempo do presidente Rui Moreira, uns que já manifestaram diretamente apoio e outros que mais do que apoio, vão integrar, tanto quanto julgo saber, a candidatura do Partido Socialista.
Para além disso, o que vemos no Porto? Uma direita um pouco fragmentada. E, por outro lado, vemos também o surgimento de alguns independentes da área mais da direita, habitualmente. Eu diria que com uma candidatura forte do centro esquerda, como é o caso do Manuel Pizarro neste momento, e com uma fragmentação à direita, a disputa eleitoral no Porto vai ser das coisas mais interessantes que vamos ter para acompanhar. É uma eleição que está perfeitamente em aberto e é possível o PS disputar. Não estou a pôr nenhuma pressão na candidatura, mas a racionalidade e a leitura dos sinais que vão existindo, leva-nos a estar também com expectativa em relação à Câmara do Porto.
Parece-lhe plausível ter um presidente do Porto com 23, 24, 25%?
Não é descabido esse raciocínio, até porque, como sabe, ao presidente de câmara eleito basta ter um voto a mais do que o segundo concorrente. Pode haver perfeitamente um presidente com uma margem muito reduzida de votos.
E terá força suficiente, num cenário de fragmentação, para gerir uma câmara desta dimensão? A eventual mudança da lei eleitoral, para permitir governar uma câmara sem depender da oposição, tem estado no debate político. O que lhe parece?
Acredito muito na capacidade agregadora do Manuel Pizarro e na capacidade de diálogo, estabelecer pontes e compromissos. Ele fez parte de uma solução no primeiro mandato do presidente Rui Moreira, cumpriu integralmente, e estou convencido que ele é a pessoa certa para conseguir alcançar esse objetivo.
Mais fácil até do que eu consigo antever no espetro político da direita, no Porto. Essa discussão da lei eleitoral para as autarquias locais, e da composição dos executivos, é interessante. Mas se verificarmos, não me parece que, de um ponto de vista prático existam cenários de ingovernabilidade das câmaras municipais pelo país, não obstante não haver maiorias absolutas nas câmaras.
Grande parte das competências que existem nas câmaras municipais são competências administrativas, muitas são políticas, mas grande parte delas são de natureza administrativa, e, portanto, não há grande divergência política. Por outro lado, o presidente da câmara tem uma série de competências próprias que permite que a ação governativa exista independentemente de não haver maioria para aprovar coisas na câmara municipal. A prova evidente é que, não obstante a constante vitimização do presidente Carlos Moedas na cidade de Lisboa, conseguiu executar grande parte do seu programa e conseguiu governar a câmara sem grandes sobressaltos, a não ser os próprios casos que surgiram com algumas personalidades do seu executivo, com alguns processos que existiram ao longo do tempo, e alguns vícios de forma sobre a questão da legitimidade de algumas deliberações e da legalidade de algumas deliberações.
Não obstante a constante vitimização do presidente Carlos Moedas na cidade de Lisboa, conseguiu executar grande parte do seu programa e conseguiu governar a câmara sem grandes sobressaltos, a não ser os próprios casos que surgiram com algumas personalidades do seu executivo.
O PS também teve processos a envolverem deputados municipais em Lisboa.
Sim, claro, mas estou a falar do executivo, ou seja, da lista do presidente Carlos Moedas, que é ele que tem que garantir as condições de governabilidade da câmara, não é a oposição. Mas isto para dizer que, não obstante a existência de todos esses casos, não se conhece grande problema de governabilidade da câmara. E o Partido Socialista assumiu, como assume sempre, uma postura responsável.
Relativamente a Lisboa, naturalmente que um presidente de Câmara em primeiro mandato — sendo coerente exatamente com aquilo que disse aqui há alguns minutos, reitero – em condições normais parte em vantagem. Portanto, a não ser que haja aqui um facto relevante que surja, eu diria que, não obstante o presidente Carlos Moedas ainda não ter anunciado à data de hoje, que é recandidato [n.d.r. a entrevista foi efetuada antes do anúncio de Carlos Moedas] — esperou pelo dia 18 de maio, mas as coisas correram num certo sentido, e não sei se isso teve influência ou não na sua decisão até essa data –, eu diria que se o presidente Carlos Moedas anunciar a sua recandidatura, como se espera, eu diria que como incumbente parte em vantagem.
O PS aposta, para Lisboa, numa figura de muito relevo no Partido Socialista nos últimos anos, a professora Alexandra Leitão, que para lá de ter sido líder parlamentar na legislatura anterior, desempenhou cargos muito relevantes no Governo do doutor António Costa. Numa primeira fase como secretária de Estado da Educação, reconhecidamente uma mulher de bastante coragem, que enfrentou bastantes lutas e as venceu, e, mais tarde, como ministra numa pasta importante que era a modernização do Estado e das autarquias locais. Ou seja, já nesta área também da gestão autárquica. Em ambas as missões governativas, com um desempenho que é de reconhecimento de todos.
Nos últimos 20 anos, o PS tem dois terços do tempo de governação, e em 2021 foi uma surpresa para a maioria ter perdido a câmara. Alexandra Leitão foi chamada para uma missão difícil por isso?
É, de facto, um dos quadros mais qualificados do Partido Socialista e, portanto, o Partido Socialista faz uma aposta forte na capital do país, como tinha de ser. O Partido Socialista é um partido de vocação autárquica, vê as eleições autárquicas como eleições muito, muito importantes. Todos os secretários-gerais o dizem, e foram consequentes. Neste caso, o secretário-geral Pedro Nuno Santos apostou naquela que era a sua número dois — dito por ele. Não podíamos ter apostado mais alto em Lisboa. No momento em que apostámos e que escolhemos a candidatura, não podíamos ter apostado mais alto. Aliás, só se fosse o próprio secretário-geral, mas isso não era algo que estivesse nas cogitações, até porque ele é um homem do norte, como se sabe.
O Porto tem um cenário novo de nova liderança, aconteça o que acontecer, o presidente da Câmara do Porto será uma figura diferente do doutor Rui Moreira. Em Lisboa, isso pode ou não acontecer. O engenheiro Carlos Moedas tem-se dedicado muito à vitimização e à propaganda. Nisso, há que reconhecer que o engenheiro Carlos Moedas é muito forte. E é muito forte também na inauguração de obra que vinha do passado, até a questão dos canais de drenagem da cidade, são obras lançadas pelo presidente Fernando Medina.
E que se calhar ainda podem vir a ser inauguradas pelo PS.
Se corresse bem, sim… no plano da justiça — se é que há justiça na política, porque a política depende de outros fatores — teria a sua piada. Bom, mas isto é entre parêntesis (sorriso). Em condições normais, a eleição de Lisboa é mais difícil do que a eleição do Porto. Mas se há figura no partido que tem combatividade, que tem resiliência, capacidade para tornar aquilo que seria menos provável numa coisa que pode acontecer, é a Alexandra Leitão, e, portanto, não poderíamos ter apostado mais forte.
Em Lisboa está em aberto uma frente alargada de esquerda, mas segundo sabemos, o candidato do PCP não está interessado em aderir. A presidência em Lisboa pode perder-se aí?
Não me quero imiscuir na matéria que é da competência própria de cada partido, que fará a avaliação que entende mais correta que salvaguardará os seus interesses. O que deve ser muito medido, pesado e até responsabilizado é se, na noite eleitoral, o Partido Socialista, numa coligação progressista que exista para a cidade, não conseguir ganhar as eleições pelo diferencial de votos correspondente aos votos no PCP — isto é, se os votos do PCP, juntando-se aos votos de uma coligação de esquerda progressista, fossem suficientes para retirar a câmara à direita –, os eleitores de esquerda vão ter que saber tirar as consequências e as conclusões dessa matéria.

O PS está na disposição de atribuir pelouros ao PCP para que este adira a essa frente progressista de esquerda que menciona, como fez Carlos Moedas com o CDS nos Novos Tempos?
Sobre essa matéria não consigo mesmo responder, porque não tenho informação. A nossa política de coligações não é imposta de cima para baixo, ela é vista de baixo para cima. Isto é, são as concelhias que identificam os locais onde fará sentido, na opinião deles, haver coligações. Nós, depois, avaliamos o acordo de coligação e damos o acordo, até porque pressupõe um mandato do partido nacional para depois ir ao Tribunal Constitucional, que é um procedimento próprio nos processos de coligação. Nesta fase, não tenho informação que me permita responder à sua questão, com toda a honestidade.
Na mesma coligação em Lisboa apresentam-se ao lado do Livre. O facto de, nas legislativas, ter aparentemente retirado votos ao PS, não pode significar que o Livre pode ganhar dimensão nacional à boleia da união autárquica ao PS?
Percebo a sua pergunta, e é bastante pertinente. É uma discussão que eventualmente podemos vir a ter. Eu diria que, nesta fase da nossa vida política o que temos de fazer é a avaliação, se é mais útil para o território, localmente considerado, e para o país no seu conjunto, ter presidentes de câmara do Partido Socialista ou não ter presidentes de câmara do Partido Socialista. Nos concelhos onde, para conseguirmos garantir essa probabilidade de termos o presidente de Câmara do PS, se para isso for necessário existir acordos de entendimento com uma força como o Livre, não vejo nisso um obstáculo inicial.
E, depois, essa questão que refere a seguir, é uma questão de gestão política, quer das concelhias, quer do próprio presidente da câmara, que tem que saber ocupar o seu espaço e não permitir que o crescimento do Livre à conta do Partido Socialista exista no território. Isso é importante que seja garantido.
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